Plinio Corrêa de Oliveira
Divórcio?
Legionário, 1º de novembro de 1942, N. 534 |
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Não desarmam os pertinazes partidários do divórcio. Não contentes com a faculdade que a legislação civil, concorde nisto com a da Igreja, já concede aos cônjuges de se separarem em determinados casos, pleiteiam para os cônjuges separados o direito a novas núpcias. Em outros termos, não se contentam com o desquite e pleiteiam o divórcio absoluto, e a vínculo. Evidentemente, entre esta corrente e a doutrina da Igreja há uma insanável oposição. A Igreja afirma a absoluta indissolubilidade do vínculo conjugal, e nisto jamais poderá variar. E, como nesta afirmação está empenhada a infalibilidade da Igreja, a nenhum católico é lícito dela discrepar. Católico e divorcista são termos que se repelem. Entre os partidários do divórcio e a Santa Igreja não há, pois, transação, composição, meio termo possível. Os campos estão nitidamente demarcados. Como católicos, não podemos deixar de deplorar, pois, e muito vivamente, que se comece a agitar, um pouco por toda a parte, a questão do divórcio. Em primeiro lugar, cumpre acentuar a extemporaneidade do debate. O recente Congresso Eucarístico mostrou claramente até que ponto são vivazes e profundas as convicções religiosas de nosso povo. Toda aquela multidão que desfilou pelas ruas de São Paulo durante o Congresso, como católica que é, está irremediavelmente incompatibilizada com o divórcio, e sabe que não pode esperar que jamais a Igreja mude sua doutrina a este respeito. Por que encher de fundas apreensões essa multidão, e criar em nosso ambiente dissensões inevitáveis, precisamente no momento em que o país deve empenhar seus melhores esforços no sentido de se unir para lutar contra nossos adversários externos? Em segundo lugar, parece curioso que tanta azafama se levante sobre o assunto, pouco depois de dois grandes fatos que exprimem iniludivelmente o pensamento católico e sua força entre nós. Em primeiro lugar, o Congresso Eucarístico a que já nos referimos e, em segundo lugar, os funerais do Eminentíssimo Cardeal-Arcebispo do Rio de Janeiro, que, pelas centenas de milhares de pessoas que a eles afluíram, mostraram claramente que o povo brasileiro é católico, essencialmente católico, fundamentalmente católico e, por isto mesmo, incompatível com reformas sociais opostas ao pensamento da Igreja. No entanto, a agitação aí está. “A Noite”, desta Capital, abriu um inquérito sobre o divórcio, ouvindo toda a sorte de escritores, jornalistas, técnicos, etc., etc. Um vespertino de Porto Alegre também abriu inquérito neste sentido. O Sr. Alberto Pasqualini, membro do Departamento Administrativo do Estado, opinou a favor do divórcio. O Instituto dos Advogados do Rio está discutindo o problema. O cronista social da “Noite” escreveu uma nota em favor dessa medida. Também a “Folha da Noite” deu a este respeito uma nota que concluía afirmando que “não resta a menor dúvida” de que o povo brasileiro deseja o divórcio. A “Gazeta Judiciária” do Rio de Janeiro também abriu uma campanha neste sentido. E, no Instituto dos Advogados do Rio de Janeiro, um orador parece haver insinuado que mediante uma concordata a Santa Sé pudesse conformar-se com a implantação do divórcio no Brasil! * * * A este propósito, é importante acentuar que o método de se apurar a opinião nacional mediante um certo número de entrevistas dadas aos jornais por alguns intelectuais, de fato nada representa. Qualquer jornalista medianamente inteligente saberá entrevistar exclusivamente pessoas favoráveis ao divórcio, exceção feita de um ou outro antidivorcista irredutível, que terá sido introduzido na galeria dos personagens ouvidos, a fim de dar ao jornal ares de imparcialidade. Para o grande público, a impressão pode ser de que os repórteres saíram à rua sem maiores preocupações, e, ouvindo os intelectuais na ordem hierárquica de sua projeção no mundo intelectual, colheram imparcialmente as opiniões de cada qual. E, como a maioria seria divorcista, daí se concluiria que a fina flor da intelectualidade brasileira é pelo divórcio. Mas para quem sabe como se “arranjam” estas coisas, tais reportagens em série não tem o menor valor persuasivo. Não é, pois, por aí que se há de chegar à convicção de que nosso povo deseja o divórcio. Aliás, a própria argumentação com que alguns entrevistados defendem sua opinião é prova da superficialidade de espírito com que se formaram juízo a respeito de um problema tão delicado. Assim uma escritora procurada por certo jornal para se manifestar sobre o divórcio deu como razão de sua simpatia por essa medida o argumento de que ser contrário ao divórcio é ser fascista! Por que? Por que na Itália não existe o divórcio? Neste caso, ser divorcista é ser ao mesmo tempo bolchevista e nazista, porque na Alemanha e na Rússia o “amor” é livre. Este pano de amostra indica a leviandade com que se discorre sobre o assunto. E quem pensa com tal leviandade poderá de fato ser expressão da mentalidade brasileira? Afinal, não estão tão remotos os grandes pronunciamentos coletivos do Brasil a respeito do divórcio. Todos estão lembrados de que, a partir do momento em que a Liga Eleitoral Católica começou a arregimentar os católicos brasileiros no terreno do cumprimento de seus deveres cívicos, todos os políticos tinham uma tal persuasão de que não lograriam as ambicionadas cadeiras no Congresso Federal ou Estadual sem um compromisso sério de não aprovar o divórcio a vínculo que até candidatos pessoalmente contrários ao divórcio se julgavam na obrigação de garantir a seus mandantes, por documento público, que não abusariam do mandato contra as intenções deles neste sentido. E se há poucos anos, apesar de ser o Brasil trabalhado por intensa campanha comunista, o divórcio era uma espécie de espantalho que matava no conceito público os mais ousados chefes eleitorais, por que se há de presumir que hoje em dia a opinião brasileira mudou? Qual o fato que indica que o Brasil tenha afrouxado suas convicções religiosas? Nenhum! E quantos fatos poderíamos mencionar a fim de demonstrar que, pelo contrário, o Brasil se torna cada vez mais autenticamente a terra da Santa Cruz! Cessem, assim, as manobras ardilosas dos partidários do divórcio. E conserve-se a paz da indissolubilidade, neste momento de tanta luta patriótica, às famílias brasileiras! |