Legionário, N.º 484, 21 de dezembro de 1941

“A Pastoral e o Rádio

Um dos trechos que certamente merecem atenção na última Pastoral se refere às rádio emissoras. Nosso Episcopado tem timbrado em abordar exclusivamente temas de uma importância atual e relevante. Assim, não poderia deixar de voltar as suas vistas para a rádio difusão, cuja ação, de um e outro ponto de vista, supera a todos os demais. Proclama-o a Pastoral em termos que, frisando fortemente o extraordinário alcance, para o bem ou para o mal, da atuação desenvolvidas pelas rádio emissoras, deixa transparecer claramente o fervor de entusiasmo que a todos os assuntos radiofônicos, a todos os progressos da radiofonia e implicitamente a todos os que colaboram para o desenvolvimento do rádio vota o atual Arcebispo de São Paulo.

Vale a pena ler os primeiros períodos pela Pastoral consagrados à rádio difusão: “Invento dos mais recentes trouxe a rádio aos costumes dos povos, modificações tão rápidas que longos anos de vida normal não lograria. Assenhoreou-se dos ares ou mais propriamente das ondas hertzianas. Moralizado, concorreria para efetivar a mais bela obra de harmonia universal, difundindo a verdade, exortando os povos à virtude, elevando o nível cultural das populações e pacificando os espíritos.”

Que valor preciso deve atribuir-se ao modo condicional em que se encontra o verbo “concorreria”? Deve-se por aí entender que nosso Episcopado sustenta não existirem estações de rádio moralizadas? De nenhum modo afirmando-o, lavraria o primeiro dos signatários da Pastoral, que é o próprio Metropolita, o decreto de condenação a Rádio Excelsior, emissora a cujo testa se encontra um ilustre Sacerdote desta Arquidiocese, e que goza de toda.... [problema tipográfico] tal interpretação, da leitura do trecho citado só se pode inferir que sua redação obedece ao intuito de, não louvando e mencionando diretamente certas organizações dignas de encomio, cortar também de lançar uma pesada censura às que disto fossem merecedoras. Daí esse gesto verdadeiramente fidalgo e cavalheiresco de nossos Bispos de omitir na lista dos louvores a própria emissora católica, certamente de um precioso fator de progresso, e ao mesmo tempo esquivasse de lançar um estigma direto contra as emissoras acatólicas ou anti-católicas. Dificilmente um tão grande empenho em não confundir nem ferir a quem quer que seja poderia encontrar mais nobre e discreta expressão. A mesma preocupação se nota na redação desta frase: “sem embargo, não é que ouvimos em alguns programas de certas emissoras”. Seria possível empregar maior cuidado? “Alguns” programas, não quer dizer todos os programas. “Certas” emissoras não quer dizer todas nem quase todas elas. É isto tão óbvio que qualquer pessoa de espírito sereno o reconhecerá. Mas no intuito extremo de ressalvar o quanto possível a situação de alguns diretores de rádio emissoras, ainda acentua a Pastoral que se há abusos a registrar, se deve isto ao fato de “talvez premidas pela impossibilidade de tudo examinar”.

 Confiarem muitos delas demasiadamente em funcionários sem escrúpulos. Assim, ainda mesmo quando aponta os desvarios, o Episcopado ainda menciona pormenorizadamente as atenuantes. Ao pé da letra chama-se isto amar os que erram, ainda mesmo que se caustique o erro.

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E poderiam estes erros deixar de ser condenados? Está na consciência pública a devastação que a todas as horas de todos os dias certas rádio emissoras praticam fazendo revezar umas com as outras os assaltos que desferem contra a fé e a moral. Veiculadas pelas ondas hertezianas, as heresias e os fermentos de concupiscência atravessam distâncias até aqui invencíveis, transpõem muralhas cujos batentes jamais se haviam aberto ante a investida dos princípios de destruição, penetram nas cidadelas de lares até aqui inexpugnavelmente fiéis a Jesus Cristo e corrompem simultaneamente, com a chacota escabrosa e fácil, a canção lasciva ou a doutrinação subversiva, tanto os senhores dos mais opulentos palácios quanto os habitantes dos mais miseráveis cortiços. Ridicularizam-se criminosamente as mães de numerosa prole, a Igreja não estaria ao lado delas a fim de as amparar! Enxovalha-se o vínculo sagrado do Matrimônio e o Episcopado não se deveria erguer em liça, contra esta ignomínia! Vilipendia-se a pureza, ataca-se a Fé, e os Bispos deveriam continuar calados! Quem pode não compreender que esperar deles tão reprovável silêncio seria o mesmo que os supor capaz de violar seus mais santos juramentos e seus mais altos deveres?

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solidariedades que são nobres. São as que tendem a defender o direito, a verdade e o bem.

Assim, só uma atitude merece apoio. É a que visa congregar em torno do apelo paternal e afetuoso de nossos Bispos a boa vontade, a energia e o prestigio de todos os que trabalhando na rádio emissora lamentam sinceramente estes males, e já trabalham para os limitar.