Plinio Corrêa de Oliveira

 

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Ainda Renan

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 3 de agosto de 1941, N. 464, pag. 2

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Dir-se-ia que o velho Renan (1823-1892) passou definitivamente de moda, e foi relegado para os cantos poeirentos, a mofar por toda a eternidade, debaixo de camadas cada vez mais espessas de telas de aranha. Entretanto, não é o que acontece. Se o ímpio blasfemador, que negava a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, foi combatido, ridicularizado, e, mesmo, esquecido, como se combatem, ridicularizam e se esquecem as pessoas inconvenientes, um outro aspecto da obra de Renan persiste, todavia, como um veneno sutil e letal, insinuante e traiçoeiro, que se tornou mais virulento ainda pelo olvido que desceu sobre o Renan blasfemador: é o Renan do “meigo rabi da Galileia”. É verdade que o nome mesmo de Renan já não aparece em cena, e nem este rótulo de “meigo rabi da Galileia”.

Mas a mentalidade do “meigo rabi da Galileia” está viva e palpitante. As gerações modernas, trabalhadas a fundo pelo liberalismo religioso, que lhes tirou a fibra, a virilidade, a rigidez do caráter, não podem suportar a personalidade augusta e íntegra de Nosso Senhor Jesus Cristo. Por isso, agarraram-se instintivamente a este Cristo diminuído de Renan, a esta caricatura blasfema do Salvador, que é o “meigo rabi da Galileia”, adocicado e afeminado. Para meios homens, meias verdades.

Isto aparece nitidamente nuns certos “Poemas bíblicos em prosa”, que o sr. Renato Soares de Toledo está publicando no Suplemento dominical da Folha da Manhã. Veja-se por exemplo, o assunto do “poema” publicado no domingo passado. Na ficção literária dos “poemas em prosa”, a tentação de Jesus pelo demônio teria sido assim: Satanás, tendo levado Nosso Senhor para o alto de um elevado monte, mostrou-lhe uma grande cidade, cheia de riquezas, de prazeres e de pecados e prometeu-lhe a posse absoluta de tudo isto, se prostrado o adorasse. Nosso Senhor, porém, desdenha da tentação, mas se dirige a pé àquela cidade; e, em três dias apenas, converte-a toda à sua doutrina, pelo poder de sua pregação e de seus milagres. E assim, aquela cidade se transforma no próprio reino do bem e da virtude. Voltando, encontra-se de novo com Satanás, e o anjo das trevas lhe diz: - Venceste, mas a tua vitória é aparente; aquela cidade é hoje o reino da virtude, mas não poderá subsistir por muito tempo. Ela está cercada de vizinhos poderosos, velhos inimigos, que a irão atacar, ávidos de suas riquezas; mas ela não se defenderá, nem lutará, porque a doutrina da bondade, que incutistes a seus habitantes, tornou-os todos adversários do sangue e da discórdia. E, assim, aquela opulenta cidade será em breve uma imensa ruína. Mas eu, anjo do mal, vou salvá-la, porque irei já semear novamente os germens do mal; e ela combaterá, e não perecerá”.

Aí está. A bondade tornou-se sinônimo de idiotice, neste século depravado e desfibrado. O conceito que se faz de um homem bom, é, apenas, o de um bobo. Isto não é a doutrina católica, pregada por Nosso Senhor Jesus Cristo. Não é isto que se encontra no Evangelho. Isto é apenas uma deformação deles, que só poderá ser admitida por espíritos desolados. Mas não é isto aquele fantasma, criado por Renan, aquele “meigo rabi da Galileia”, cretino e fraco?


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