Plinio Corrêa de Oliveira
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Legionário, 22 de junho de 1941, N. 458, pag. 2 |
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Já assinalamos mais de uma vez um fato interessante, que nos deve pôr de sobreaviso, a nós, católicos. A tática dos inimigos da Igreja não consiste mais no ataque direto e frontal. O anticlericalismo nunca esteve tão fora de moda. Quem, hoje em dia, saísse à rua gritando que deseja “enforcar o último rei nas tripas do último Papa”, seria vaiado, corrido, apedrejado. Todos os lobos vestiram a pele de ovelha, e o que se vê não é mais a agressão brutal, mas o veneno instilado com sabedoria e bajulação, a intriga bem urdida e adocicada. Nunca fomos alvos de elogios tão rasgados e barulhentos, enquanto vão sendo solapados no segredo, e com sorrisos, os nossos pontos de apoio substanciais. Além disso, já notamos também que nem todos os inimigos da Igreja souberam evoluir airosamente do anticlericalismo declarado para a conspiração sorrateira. Assim, vemos algumas vezes certas personagens fazerem profissões de Fé insólitas e desajeitadas, esquerdas e ridículas, e que lembram uma pessoa vestida com roupas emprestadas. Entretanto, é preciso ver que nem sempre esta falta de jeito é fruto da inabilidade, da inadaptação ao novo papel. Em certas ocasiões ela é mesmo intencional, e tem por finalidade dar à Fé Católica uma nuance heterodoxa, nuance que passará desapercebida aos olhos incautos, e irá viciar a pureza da doutrina nas almas desprevenidas. E aí está o fim da manobra. O que mais se opõe à espiritualidade católica não é o materialismo, mas as falsas espiritualidades; o que mais se opõe à vida sobrenatural da Igreja não é o mundanismo rasteiro, mas as falsas místicas. E é para as falsas espiritualidades e as falsas místicas que se orientam os esforços dos modernos inimigos da Igreja, enquanto vão embalando a massa dos fiéis com suas declamações liricamente religiosas. Está neste caso, por exemplo, a crônica de J. S. sobre Santo Antônio, publicada na seção “Notícias do Rio”, do “Estado de São Paulo” de 14 do corrente. Este jornalista começa por lamentar a onda de materialismo brutal que avassala o mundo, com suas confusões, seu culto da força, e sua negação do espírito cristão; e, neste sentido, lamenta também o desaparecimento de tradições espiritualizantes, como as festas de Santo Antônio. Chegado a esta altura, envereda por um panegírico ao grande Santo; mas aqui começam a surgir certos equívocos suspeitos. O Santo Antônio que o sr. J. S. quer exaltar não é o Santo Antônio real, canonizado pela Igreja, mas o Santo Antônio das lendas que é objeto de cultos supersticiosos; um Santo Antônio da vida moralmente duvidosa, e protetor de certas coisas que a honestidade manda calar, mas que J. S. não calou na sua crônica. Por aí, o panegírico degenera em pura blasfêmia, e, a continuar assim, o “Estado de São Paulo” já não poderá entrar nos lares católicos, por se ter tornado um jornal ofensivo à Moral e à Religião. À primeira vista, parceria que J. S. foi apenas infeliz e desajeitado em sua ostentação de sentimentos cristãos, deixando trair a sua verdadeira índole, por trás da máscara espiritualista. Porém, não foi o que sucedeu. Tudo o que está escrito naquela crônica foi medido e pensado. J. S. distingue nitidamente o Santo Antônio da Igreja do Santo Antônio das alusões populares; este é o que o interessa, e que ele chama o “Santo Antônio da Raça”. Tudo se esclarece com este “Santo da Raça”. O que J. S. pretende estabelecer é o culto de um mito racial, não o culto de um santo da Igreja. E é este o falso espiritualismo que se quer confundir com o Catolicismo, e parasitar a sua seiva, é isto que denunciamos como perigoso e nefasto, pior do que o materialismo declarado. |