Plinio Corrêa de Oliveira
Instituto de Serviço Social
Legionário, 23 de março de 1941, N. 445 |
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Teve a Juventude Universitária Católica (JUC) uma feliz iniciativa ao fundar um instituto especialmente destinado a formar assistentes sociais autenticamente católicos. Infelizmente ainda são muito numerosos entre nós os elementos que, embora com excelente intenção, colocam em artificial antítese a cabeça e o coração, quando se trata de obras de assistência e caridade. Para muitas pessoas, é realmente um problema saber o que deve preponderar, se a inteligência ou se o coração, na execução das obras destinadas a aliviar a miséria do próximo. E consoante o feitio brasileiro, em geral a partida é ganha pelo coração em detrimento da cabeça. Na realidade, o simples fato de se propor uma questão destas já é um perigo. O problema não existe. A inteligência bem esclarecida não pode entrar em choque com a sensibilidade realmente equilibrada. Quando os choques entre a razão e o coração se pronunciam, ou a razão ou a sensibilidade se extraviou. E o problema não consiste, aí, nem em dar o predomínio a um, nem a outro, mas em conservar um e outro dentro da ordem a que os destinou a Providência do Criador. Na ordem concreta dos fatos, estes choques são frequentes, não o negamos. E a razão é óbvia. O pecado original estabeleceu no homem um desregramento da sensibilidade e da inteligência, em consequência do que muitas vezes a sensibilidade vibra de modo contrário aos ditames da razão, e nesse caso deve ser corrigida; ou finalmente a razão se extravia tão a fundo no erro, que uma sensibilidade equilibrada não se resolve a segui-la sem protesto, e neste caso é a razão que precisa ser corrigida. Mas, perguntar-se-á, dado o fato de uma colisão psicológica profunda entre a inteligência e a sensibilidade, como saber qual delas está errada? Como perceber a qual delas deve ser conferido o cetro da vitória? Como decidir qual delas deve ser reduzida ao silêncio? Esta pergunta nem sequer deveria aflorar no cérebro de um católico. O método é muito fácil. É a inteligência que está em colisão com a doutrina da Igreja? Então é ela que precisa ser corrigida. É a sensibilidade que se revolta contra o que a Igreja manda? Então é esta que precisa ser quanto antes reduzida ao papel que lhe cabe. E nem se diga que pode haver casos em que a Igreja nada tenha de ver. Pelo contrário, a moral católica rege todos os atos humanos, e assim, este processo de uma infalível segurança, tão infalível quanto o são a Igreja e o próprio Deus, tem uma aplicação segura, constante e universal. * * * Assim, pois, as pessoas que se alarmam por demais com os modernos métodos de racionalização das obras de beneficência, aqueles que não gostam que a caridade seja exercida com inteligência, segundo os ditames da ciência, da investigação serena e objetiva, da execução tecnicamente perfeita, nenhuma razão tem para se alarmar, desde que fique bem entendido que, vivificando essas técnicas, guiando essa ciência, iluminando essa execução, esteja o influxo inspirador da Igreja Católica, dentro da qual não há nem pode haver erro, nem mal, e a cuja sombra a ciência ilumina sem pôr em delírio, a técnica serve, sem ensoberbecer, e a investigação, com ser imparcial e serena, nem por isto perde sua perspicácia e seu valor. A questão, no fundo, está em que a utilização de todos estes meios atuais de se acrescer o valor das obras de assistência e caridade não se desviem de seu verdadeiro sentido, que o fichário, que o método, que a burocracia, não matem o amor, que é insubstituível, transcenda em eficácia e pujança a todos os métodos e a todas as técnicas, e sem cujo concurso, quer a técnica, quer o método, lenta mas seguramente, se transformam, não em instrumento de auxílio, mas meio de opressão cruel. O mal não está na técnica. Está na ausência do influxo da Igreja. * * * Já se vê, por aí, que o grande problema consiste na formação do assistente social. Se ele for um católico autêntico, não apenas daqueles que, ávidos de erros, se debruçam curiosamente por sobre os muros da ortodoxia contemplando afetuosamente todos os disparates que a razão humana engendra longe da Igreja, mas daqueles que tem um senso católico vivo, eficaz, diligente, zeloso, sua ação poderá ser de um incalculável valor. Se, pelo contrário, ele for um católico de convicções bruxuleantes, difícil lhe será impedir que o contrabando de idéias espúrias se insinue em sua inteligência, e vicie toda a sua ação, transformando, de ótima que era em péssima, a atividade que, pela natureza de sua profissão, deve exercer. Assim, pois, a ninguém pode passar desapercebida a oportunidade da iniciativa que tomou a JUC de fundar um Instituto de Serviço Social, em que, sob a inspiração da doutrina católica, se temperem as inteligências e se fortaleçam as vontades, para o cumprimento de tão alto e tão nobre mister. Publicando hoje o edital do Rev.mo Assistente Geral da Ação Católica sobre o referido Instituto, o “Legionário” não poderia deixar de dizer, em obediência ao disposto naquele regulamento, também uma palavra de incitamento e de apoio, que aqui fica consignada. |