Plinio Corrêa de Oliveira

 

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À moda nazista

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 8 de dezembro de 1940, N. 430, pag. 2

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Vem-nos a notícia de que o nazismo se apronta para substituir a França na direção da moda universal. Berlim, e não Paris, seria a capital da elegância. Porém, esta elegância seguiria novas concepções, de acordo com a mentalidade do nacional-socialismo. Assim, a própria noção de moda seria profundamente alterada, de tal forma que já não se poderia chamar “moda”, mas, simplesmente “desenho”. E o mundo inteiro passaria a vestir-se segundo o “desenho” oficial de Berlim, provavelmente aprovado por decreto, utilizando-se, também, dos tecidos sintéticos do III Reich, conforme padrões hitleristas.

Ora, pesa-nos dizer, esta estonteante novidade, que nem ao menos pode ser denominada por uma expressão velha, como é “moda”, não passa de uma coisa surradíssima, estafadíssima, conhecidíssima. Este “desenho”, que se apresenta como uma conquista inédita do gênio humano, é, em linguagem modesta, o uniforme. Os órfãos de nossos asilos já punham em prática, sem o saber, e de há muito, as idéias mais avançadas e originais do nacional-socialismo. E assim se compreende como aquele bom Monsieur Jourdain podia falar em prosa, sem o saber.

A pessoa encarregada de operar tão grande prodígio, que deverá substituir a capital da inteligência, num mundo em que ainda havia espírito, pela capital da máquina, num mundo que já não terá nenhuma graça, não é marquês, nem rei, nem imperador. É muito mais do que isso. É o sr. Otto Jung, Diretor Têxtil do Nacional Socialismo. Pelo nome, deve ser um profundo entendedor de parafusos, engrenagens e cremalheiras. Suas notáveis idéias a respeito do “desenho” foram expendidas numa revista, que, também pelo nome, deve ser uma refinada revista de elegância: a “Textil Zeitung”.

Assim, de acordo com os planos do sr. Hitler, toda a humanidade, dentro em breve, deverá vestir-se pelo mesmo “desenho”, cobrindo-se com as mesmas qualidades de panos. Não podemos dizer porque imaginamos que a tonalidade de tais panos deverão variar em torno da cor parda. As multidões humanas serão massas pardacentas, a se agitar confusa e melancolicamente. Os indivíduos serão dificilmente reconhecíveis entre si. Quer se chamem Joana, Maria ou Pulquéria, as mulheres serão todas semelhantes na indistinção da mesma feiura. Não mais haverá lugar para as originalidades pessoais, para o “cachet” individual, para tudo enfim que caracterize o homem entre os demais homens. Só o coletivo terá valor. E, então, a vida humana será um imenso bocejo, mesmo porque, se se chegar a tal extremo, o nazismo já não terá o que combater, desaparecendo, assim, o motivo das exaltações entusiásticas e do misticismo nacionalista. Todo o gênero humano estará reunido numa só república universal, igualitária e socialista, tal como o imaginavam o comunismo (...).

E a gente se lembra, sem querer, daquele Élisée Reclus (1830-1905), eminente geógrafo, que passou a vida a curtir prisões e aborrecimentos, por causa de suas idéias anarquistas. Sua fórmula era “Nem Deus, nem senhor”. Evidentemente, Élisée Reclus era um bobo. Seu ideal não dependia de conspiratas nem de bombas; era uma simples questão de indumentária. Vistam-se todos os homens pelo mesmo desenho, com os mesmos tecidos, e não haverá senhor. Só que os homens, quando se livram de Deus e dos senhores, caem nas garras de uma potência impassível, cega, inatingível e impessoal: o Estado.

 

“Ni Dieu, ni maître” (nem Deus, nem senhor – um dos lemas da revolução da Sorbonne, maio 1968)


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