Plinio Corrêa de Oliveira

 

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Humanização ou animalização

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 18 de agosto de 1940, N. 414, pag. 2

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Processa-se hoje em dia, um certo movimento nos círculos jurídicos, a que se convencionou chamar de humanização do direito. A este respeito, o “Diário Popular” desta Capital, em artigo publicado na semana passada, traz várias amostras desta “humanização”, que coincide com uma socialização do direito, e que vem sendo lançada no Brasil desde 1931 a passos acelerados. Assim, “tivemos a adoção de várias medidas de grande alcance, todas elas ferindo de morte o princípio de autonomia da vontade e do individualismo da Constituição de 1891”. E, ao que parece, o Poder Judiciário também compreendeu o alcance do movimento, posto que “os juízes procuram realizar uma verdadeira humanização do direito, amenizando as asperezas de princípios jurídicos ou normas legislativas hoje incompatíveis com os sentimentos de solidariedade e coletivismo que domina a sociedade.”

E, então, vêm os exemplos da aplicação destas idéias. Em primeiro lugar, as nossas leis trabalhistas dispensam proteção à concubina e aos filhos espúrios. Além disso, o Conselho Nacional do Trabalho, em recente decisão, declarou que já não estamos na “época ateniense, em que o filho natural não tinha direto nem a alimentos, e sua mãe era considerada infame, procedimento este incompatível com os modernos conceitos jurídico-sociais” (sic).  E tudo isto se estriba na alegação de que a lei tem de reconhecer as situações de fato, para regular-lhe as consequências. O que não foi dito, mas daí se infere, é que tais “situações de fato” consistem na decadência e dissolução progressiva da sociedade familiar, coisa que a lei deve reconhecer, regular e amparar.

Como se vê, em matéria de raciocínio dificilmente se poderá encontrar mais perfeita idiotice. Daqui a pouco os ladrões e similares, reunidos em sindicato, ainda hão de pleitear que, como o desrespeito à propriedade alheia é uma situação de fato, pois que relativamente poucos são os que não a violam quando têm oportunidade, deve a lei reconhecer e regular este fato, humanizando-se também, neste ponto.

Estranho paradoxo de nosso tempo! Nunca houve tanto sentimentalismo, nunca se falou tanto em humanização, em compreender as dores e os desfalecimento humanos e nunca houve tanta crueldade, tanta desgraça e tanto sofrimento!

Em outros tempos, procurava-se melhorar a sorte dos filhos das paixões desregradas, porque eles não tinham culpa; mas não se procurava confundi-los com os filhos legítimos, para preservar o corpo social de uma contaminação perigosa, porque a natureza humana é defectível. Se nem todos podem ter a felicidade de um lar legitimamente organizado, que ao menos a maior parte a tenha, que a infelicidade de alguns não seja a infelicidade de todos. Este igualitarismo por baixo, em que se equipara os filhos legítimos aos espúrios, a mulher honesta à desonesta, acabará por dissolver as famílias e a transformar a sociedade num grande rebanho, em que as paixões grosseiras fermentarão. E então se verá a grande legião dos filhos do Estado, como na Rússia, filhos que não conhecem o carinho das pais, que morrem de fome e que se perdem na corrupção dos costumes.

E sobre isso um pedante qualquer exclamará satisfeito: humanização do Direito!


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