Plinio Corrêa de Oliveira

 

Rumos futuros

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 16 de junho de 1940, N. 405

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Escrevo na sexta-feira, ainda sob a impressão da queda de Paris, de que há pouco me chegou notícia.

É cedo ainda para prognosticar o futuro da grande luta que continua a ser travada por detrás da capital. Mas o espírito se volta insensivelmente para este problema que está no âmago de todas as questões do momento. É, pois, sobre ele que preciso escrever. Talvez, no domingo, quando estiver em circulação o “Legionário”, a realidade já tenha dado respostas a minhas conjecturas. Pouco importa. Publicá-las-ei do mesmo modo.

* * *

Evidentemente, o ambiente é trágico. Três notas agudas dão aspectos de catástrofe ao quadro que contemplamos. Em primeiro lugar, o segundo apelo de Reynaud aos Estados Unidos. Talvez fosse melhor para a França que este apelo não fosse dado à publicidade antes de vir a resposta da Casa Branca. Esta resposta veio, dizendo que, no momento, os Estados Unidos não podem fazer mais do que já estão fazendo, e como foi publicado o apelo, também foi necessário publicar a declaração yankee. A decepção nos arraiais é fácil de se imaginar.

Em segundo lugar, Paris caiu. Preferiu se entregar sem combate a fim de não sacrificar a cidade maravilhosa.

Todos terão sentido um verdadeiro alívio ao pensar que as inestimáveis obras de arte ali localizadas não serão destruídas, e que foi poupada a existência de inumeráveis criaturas residentes na imensa metrópole. Mas para que este sacrifício produza tal resultado é preciso que os aliados renunciassem a contra-atacar as tropas alemãs ali aquarteladas.

Militarmente será isto possível? Caso, de futuro, fosse possível pensar em expulsar dali os alemães, entregariam eles também a cidade sem combater? E se resistissem dentro de Paris, como poupar a capital francesa?

Finalmente, o General Franco declarou a não-beligerância da Espanha. Não se confunda não-beligerância com neutralidade. A este respeito um jornal espanhol - nota-se que na Espanha toda a imprensa é oficiosa - já deu esclarecimentos, iniludivelmente precisos: a não-beligerância foi decretada em favor da Itália para que a Espanha pague o auxílio por esta prestado na debelação do comunismo; não-beligerância é uma neutralidade apenas militar, que significa que todos os recursos econômicos e diplomáticos do país serão mobilizados em favor da Itália fascista e implicitamente da Alemanha nazista. E caso a guerra se aproxime de Gibraltar, acrescenta o jornal, a Espanha poderá entrar na guerra do lado da Itália. Assim, pois, o horizonte dificilmente poderia ser mais sombrio.

A isto acresce que os “homens de Munich” não desanimaram. Um pequeno telegrama publicado pela “Folha da Noite” de ontem anuncia que Daladier se está esforçando por uma “paz em separado”, que venha colocar a França em estado de neutralidade, enquanto a ofensiva alemã prosseguiria contra a Inglaterra. Nada vi nos jornais desta manhã que confirme a notícia. Mas estou muito longe de considerar improvável que o Sr. Hitler ofereça logo uma nova paz que venha a abranger somente a França. Se tal se der, será necessariamente uma paz muito vantajosa aos franceses sob o ponto de vista imediato. O futuro dirá então que o Sr. Hitler realiza implacavelmente seus planos, e que o seu projeto de separar a França da Inglaterra, anunciado em “Mein Kampf”, não terá sido em vão. Mas o Sr. Hitler acrescenta, em seu livro, que seu real inimigo é a França e não Albion...

* * *

No entanto seria uma loucura esquecer que a França ainda resiste, neste momento, e que é grande a  confiança em sua vitória. Com uma coragem digna das melhores tradições francesas, o exército luta palmo a palmo, manifestando tanto desprendimento da vida, tanto amor à Pátria, um tal vigor de ânimo, que o mundo inteiro está pasmo e que se pode afirmar que a França está se excedendo a si própria.

À testa deste exército, em que cada homem tem sido um herói, estão dois chefes que sintetizam todo o espírito francês: Pétain e Weygand. Difícil será que qualquer destes dê ao mundo uma surpresa de gênero “quisllinguiano”. Resistir é a palavra de ordem. E impossível não é que, enquanto haja um só oficial e um só soldado, a ordem continue a ser dada por um e obedecida pelo outro.

Assim, pois, neste quadro, que seria suficiente para fazer desanimar os mais fortes e para desarmar os mais corajosos, a França continua até os dias de hoje. Resistir atrás de Paris, resistir na província, resistir nas colônias, resistir até nas pequenas nesgas de território francês existentes na América, mas incontestavelmente resistir é a palavra de ordem dada ontem por Reynaud.

Diante deste quadro tremendo, qual será o desfecho?

Para nós católicos brasileiros, a palavra de ordem é simplesmente rezar. Rezar, rezar humildemente, confiantemente, insistentemente, para que Deus Nosso Senhor faça prosseguir de tal modo os acontecimentos que daí resulte a exaltação da Santa Igreja triunfante sobre a heresia pagã, a integridade do território brasileiro e o bem do mundo inteiro.


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