Plinio Corrêa de Oliveira

 

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E a crise continua...

 

 

 

 

 

 

Legionário, 18 de fevereiro de 1940, N. 388, pag. 2

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O “Diário Oficial” tem publicado os balanços das sociedades agrícolas cafeeiras do Estado, referentes ao movimento financeiro do ano de 1939. Só vimos até agora uma sociedade que conseguiu auferir lucros durante aquele período, sendo que estes mesmos não representariam mais que 1% do capital. Todas as outras ou mal atingiram o equilíbrio entre a receita e a despesa, com o que ainda se tiveram por muito felizes ou, o que foi a regra, manifestaram prejuízos por vezes vultuosos. Ora, o que aconteceu às sociedades terá certamente sucedido aos particulares, porque todos sofrem as mesmas injunções econômicas, e é o que se verifica pelos movimentos da classe em prol da melhoria de sua situação.

Não se pode fechar os olhos à gravidade deste fato, que contribui poderosamente para desorganizar a vida de nossas populações do interior adstritas à cultura do café, e que constituem uma parte assaz ponderável da nação.

Sobretudo para nós católicos é de se lamentar a desorganização das sociedades rurais, resultante do regime de caxexa econômica, que força a uma constante substituição de culturas resultando tudo isso num estado de instabilidade aguda, que vai derruindo inapreciáveis conquistas no campo de uma edificação social robusta e viva.

A consequência é o predomínio cada vez mais acentuado de um tipo de civilização industrial, com eixo nas cidades e de cunho nitidamente cosmopolita.

Em tese, tanto a economia industrial como a agrícola são igualmente legítimas e aceitáveis. A verdade, porém, é que o industrialismo moderno, com os seus métodos de trabalho e, principalmente, com a sua mentalidade, é quase que uma preparação ao socialismo e ao totalitarismo, quando desenvolvido em massa, sem o contrapeso de formações sociais mais delicadas e orgânicas.

Assistimos, hoje em dia, ao desmoronar de uma civilização que assentava sobre a cafeicultura. Não queremos dizer que esta civilização fosse perfeita; pelo contrário, estava bem longe disso. Entretanto esta civilização caracterizava-se por uma sociedade orgânica e inteiramente diferenciada, em que entre o indivíduo e o Estado existiam, senão de direito pelo menos de fato, uma série de grupos intermédios absolutamente espontâneos, vitais e pujantes, de tal forma que o próprio Estado não era mais do que a última expressão da mesma atividade natural e auto-construtora que estratificara aqueles grupos.

É assim que se explica o exuberante surto da iniciativa privada de São Paulo, nos tempos em que aquela civilização ainda se mantinha iniciativa que supria, frequentemente e sem nenhuma desvantagem, a ação do Estado, de tal forma que o próprio Estado contava com ela e com ela se harmonizava.

É assim que se explica também que, embora vivêssemos numa época de notável progresso material, a vida em São Paulo possuía um quê de íntimo e patriarcal em que se ressalvavam os valores humanos e tradicionais. É verdade, como já dissemos, que havia muitas coisas lamentáveis e, sem dúvida nenhuma, paganizantes. Mas é inegável, por outro lado, que muitas outras coisas ótimas se estão perdendo, sem que as péssimas desapareçam.


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