Plinio Corrêa de Oliveira
Comentando...
Legionário, 25 de junho de 1939, N. 354, pag. 2 |
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Já veio a público, oficialmente, a estatística dos processos concluídos durante o ano de 1938, no tribunal da Santa Rota Romana. Em geral, pensa-se que este tribunal tem apenas competência sobre os feitos matrimoniais. Esta opinião, embora espalhada, é errada. A Santa Rota é o tribunal de Apelação da Igreja, quer dizer, é um juízo de segunda instância. Assim, na estatística já referida, figuram numerosas causas civis e criminais, provenientes de todas as partes do mundo, para receberem última e definitiva sentença. Entretanto, é preciso notar que a maior parte destas causas foi constituída por questões matrimoniais. Aquele venerando colégio judicial apreciou 70 casos desta espécie, sobre os quais proferiu sentença. Apenas 27 casamentos, porém, foram reconhecidos nulos. É preciso lembrar, como já ficou dito, que a Santa Rota é um tribunal de segunda instância, que torna a julgar processos já apreciados nos tribunais episcopais. Portanto, é apenas uma pequena parte de todos os processos que sobe até Roma, pois muitos deles, morrem na primeira instância; e, desta pequena parte, apenas uma insignificância teve sentença favorável. Vê-se, pois, o cuidado com que a Igreja cerca o pronunciamento da nulidade matrimonial, dada a delicadeza e a gravidade do assunto, que exige as provas mais cabais da irregularidade que se ergue como fundamento da dissolução da sociedade conjugal. Nesta matéria, a Igreja prefere a possibilidade de manter um casamento nulo ao risco de dissolver um legítimo. Corre, infelizmente, um certo equívoco a respeito dos contratos matrimoniais que a Igreja autoriza a dissolver. Há quem pense que isto constitui uma certa modalidade de divórcio, admitido, embora em pequeníssima escala, pelo Catolicismo. Para desfazermos esse equívoco é necessário apelar para algumas noções de direito comum. Os contratos defeituosos dividem-se em duas classes, os nulos e os anuláveis. Os contratos anuláveis são os que tem um defeito qualquer que lhes autoriza a dissolução; enquanto isso não se faz, porém, o contrato vale e pode mesmo acontecer que, se não for desfeito dentro de um tempo determinado, venha a tornar-se perfeito e inteiramente válido. O contrato nulo é completamente diferente: tem apenas uma aparência de contrato, mas no fundo, é inexistente; a sua irregularidade não é sanada em tempo algum. Estes contratos não se dissolvem, por isso que não existem. Apenas se verifica e se declara esta radical ausência de vínculo entre as partes que pensaram ter contratado. É o que faz a Igreja em relação aos casamentos nulos. O matrimonio é um Sacramento que exige, para a sua validez, esta condição essencial: que haja um perfeito consenso de vontades em que os nubentes conhecem e aceitam livremente as vantagens e os ônus que vão assumir no estado de casamento. Quando se verifica que tal não se deu, não há também vínculo sacramental. Este fato é que os tribunais eclesiásticos simplesmente reconhecem, para os devidos efeitos. |