Plinio Corrêa de Oliveira

 

Comentando...

Pio XII e a paz

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 28 de maio de 1939, N. 350, pag. 2

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Nesta última semana o “Estado de S. Paulo” publicou um artigo em que se transmitem as apreciações de certo crítico político francês sobre o apelo de Pio XII pela paz. O artigo tem caráter oficial, pois que não é assinado; deve refletir, portanto, o pensamento da redação daquele jornal. É verdade que se tomaram algumas precauções: afirmou-se, por exemplo, que não se queria admitir como provadas certas insinuações do jornalista francês, que eram apresentadas apenas a título documental. É assim como quem diz: Eu não garanto que tal coisa seja verdadeira; é, porém, digna de registro.

Ora, o que o “Estado de S. Paulo” achou conveniente registrar é, em suma, o seguinte:

Segundo a interpretação do crítico francês, a Santa Sé não esperava nenhum resultado prático de seu apelo a favor da paz. Fê-lo, entretanto, atendendo a injunções do governo italiano, que teria duas finalidades em vista: a primeira seria contrabalançar o efeito da proposta de Roosevelt, que embaraçara as nações totalitárias. O apelo de Pio XII seria inaceitável para as nações democráticas, porque uma nova conferência internacional de caráter pacifista poderia facilmente transformar-se num segundo Munique. Não foi, por isso, aceito. Entretanto, esta não aceitação teria colocado mal as nações democráticas, que poderiam ser eventualmente responsabilizadas, em caso de guerra, de haver recusado uma oportunidade de salvar a paz.

A segunda finalidade seria alarmar a opinião pública italiana, alarmando com a possiblidade de uma ação armada contra a Polônia, o que teria como consequência o funcionamento do “eixo”, perspectiva pouco agradável, máxime em se tratando da questão de Dantzig, que não interessa aos italianos. Assim, a intervenção prestigiosa da Santa Sé viria trazer augúrios de melhores dias.

Conclusão: o Papado teria colocado o seu poder espiritual como instrumento nas mãos da política italiana. Esta conclusão não figura assim, crua, nas colunas do “Estado de S. Paulo”. O artigo a que nos estamos referindo, bem pelo contrário, não prima pela clareza. Não que àquele matutino faltem bons redatores, que saibam explicar corretamente o que pensam. A névoa que reveste as expressões foi espalhada, consciente e conscienciosamente, por um hábil jornalista, segundo a moderna técnica das cortinas de fumaça. A conclusão, porém, está latente e necessária, pronta para encrustar-se, sub-repticiamente, no primeiro espírito incauto.

Entretanto nada mais falso. A Santa Sé nunca se colocou, nem nunca se colocará ao serviço de nenhuma potência. É fato que a Secretaria de Estado do Vaticano jamais esperara consequências concretas de um apelo pró paz. Se o fez, foi em cumprimento de uma obrigação moral.

No artigo em questão se quis dizer que, pelo Tratado de Latrão, a Santa Sé ficou tolhida, nos assuntos internacionais, pelo governo italiano. Não é verdade. O Vaticano é um estado soberano, em virtude do próprio Tratado de Latrão, em que não há nenhuma cláusula de que, direta ou indiretamente, resulte alguma obrigação para com a Itália, em assuntos quer internos, quer externos.

Além do mais, se o fito da Santa Sé, ao formular o apelo, foi embaraçar as nações democráticas, esse objetivo ficou longe de ser atingido. De fato, respondendo a uma interpelação, Chamberlain declarou não haver recebido nenhuma proposta oficial da Santa Sé relativa à paz da Europa; acrescentou, porém, que teria grande prazer em recebê-la. Como poderia ser assim, se tal proposta fosse colocar a Inglaterra em maus lençóis?

Mas suponhamos que seja este o verdadeiro desejo do “premier”, o que parece ser mais provável. Neste caso, Pio XII teria formulado a proposta que Chamberlain afirmou não ter recebido, se verdadeiramente se tinha em vista favorecer as nações do “eixo”.

Quanto à França, basta dizer que, quanto se veem perturbando, lamentavelmente, suas relações com a Itália, mais amistosas se tornam para com a Santa Sé.

Constitui, portanto, uma injúria inqualificável querer insinuar, ainda que de leve, qualquer manobra escusa por parte do Vaticano.


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