Plinio Corrêa de Oliveira
Santo
Agostinho
Legionário, 28 de agosto de 1938, N. 312, pag. 5 |
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Consagração de Santo Agostinho (354-430). Quadro de Jaime Huguet (séc. XV), Museu de Arte da Catalunha, Barcelona Fruto da reforma (protestante), o livre exame campeia, hoje em dia, mesmo entre os católicos. Esquecidos de que a Igreja de Cristo é a única depositária da verdade, eles querem conhecer tudo por suas próprias luzes, ainda mesmo que lhes falte para tanto o conhecimento indispensável das verdades mais elementares. Daí a insubordinação quando o Romano pontífice, por meio de encíclicas, cartas e de todos os meios possíveis, procura resguardar os fiéis das ilusões do erro. Mas qual! Considera-se uma vergonha submeter a razão à Igreja, considerando-se um ato irracional a submissão fiel à palavra de Deus representada na terra pelo Sumo Pontífice. O castigo a esses orgulhosos, porém, não se faz esperar: submeteu-se logo à razão de um homem, abdicando por completo todas as suas faculdades. É o que acontece comumente com a leitura. Previdente, a Igreja condena os maus livros, procurando evitar que se forme viciosamente a inteligência, pois se o livro é mau, a formação tem necessariamente de ser má. No entanto, orgulhosos da razão, e principalmente da sua razão, aceitam a autoridade divina da Igreja, e querem examinar com sua inteligência, malformada e incipiente, se a Igreja de Cristo foi justa em sua crítica. Se somente homens de uma certa cultura assim procedessem, já isso seria mau porque seria sobrepor a razão divina à humana. Mas não são apenas eles que assim procedem. Hoje em dia, até as crianças, ao saberem que um livro é condenado pela Igreja, procuram lê-lo, para depois perguntar: Mas o que é que tem? E os pais, inconscientes, acham que essa pergunta é uma manifestação de inteligência do filho, tomando por independência de raciocínio precoce, o que não é senão precoce insubordinação, e indício seguro, mesmo falando naturalmente, de mau início de formação intelectual. A eles sirva de exemplo o que fez a Santo Agostinho as más leituras. Segundo ele mesmo confessa, seu pai não poupou esforços para lhe dar uma boa educação, segundo o mundo, pouco lhe importando a formação moral do filho. E como consequência de más leituras, que o pai não lhe proibia, já aos 16 anos Santo Agostinho, pouco a pouco, foi se salientando por sua inteligência, enquanto que a mãe, Santa Monica, dia e noite pedia a Deus a conversão do filho. Índice de sua vida dissoluta foram um filho fruto do pecado e sua fuga da casa materna para ir à Roma, onde sua ambição desmedida imaginava glórias que poderia alcançar. De fato, dentro em pouco conseguia ser nomeado lente de retórica em Milão. Ao chegar a essa cidade, conheceu o bispo Santo Ambrósio, que pacientemente lhe demonstrava a inconsistência dos argumentos que usava para combater o Catolicismo, a favor dos maniqueus. A vida que levava, no entanto, impedia a Santo Agostinho de entregar-se completamente ao Catolicismo, até que um dia, quando se achava à sombra de uma figueira, ouve distintamente essas palavras “Toma e lê”. Instintivamente, abriu o livro que até então não reparava. Eram as Epístolas de São Paulo, e abrindo-o acaso, encontrou estas palavras: “Caminhemos como de dia, honestamente, não em glutonerias e borracheiras, não em desonestidades e dissoluções, mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e não façais uso da carne em seus apetites”. Foi o golpe final da graça em Santo Agostinho. Converteu-se e ajudado por seu amigo Alípio, preparou-se para receber o Batismo. Daí por diante, Santo Agostinho empolgava os fiéis pela firmeza de doutrina e pela vida santa que levava. Ainda hoje, extasiamo-nos ante esse vulto grandioso da Igreja Católica, que mais de 150 Ordens religiosas veneram como Fundador e Pai, que enriqueceu a teologia com inúmeros livros, e que foi apóstolo inflamado da Igreja de Deus. Santo Agostinho, inteligência acima do comum, quase se perde pela leitura de maus livros. E nós, em nosso orgulho desmedido, queremos ser insensíveis a eles. Santo Agostinho converte-se, embora miraculosamente, pela leitura de um bom livro. E nós, desprezamo-los, como se eles não contivessem a fonte da sabedoria, que é o amor de Deus. Sejamos fiéis à voz da Igreja. Ponhamos a razão debaixo de sua autoridade, pois sabemos racionalmente que quanto mais o homem conhece, tanto mais desconhece. E se não queremos ser vítimas de erros, escutemos a Igreja, pois fora dEla não há salvação. |