Plinio Corrêa de Oliveira

 

Até o impossível

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 7 de junho de 1936, N. 199

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Há, na sala de visitas de uma Casa de Religiosos de São Paulo, um quadro que apresenta o Salvador sentado sobre uma pedra, no alto de uma colina, com os braços levemente apoiados sobre as pernas, e o olhar, carregado de tristeza, perdido ao longe. A seus pés, algo distante, e iluminada por um esplêndido luar, a cidade de Jerusalém, com suas choupanas, seus monumentos, seus palácios e seu Templo.

Esse quadro convida à reflexão.

Era noite. Tudo dormia. Só Jesus velava. O que o mantinha acordado? Era o amor à que fora outrora sua Cidade Santa. Como um fruto que só tem mais alguns dias diante de si para acabar de apodrecer inteiramente, Jerusalém, a gloriosa e pérfida Jerusalém, ainda viveria alguns breves dias, o tempo bastante para que a iniqüidade crescesse a tal ponto no coração de seus filhos, que eles se tornassem capazes do deicídio final.

Se eles tivessem querido conhecer o dom de Deus! Se, ainda naqueles dias extremos, o Salvador pudesse mais uma vez bater de casa em casa, de coração em coração, para exortar, para aconselhar, para implorar! Quem sabe se uma última súplica seria mais eficiente para comover certos corações? Mas em vão. As portas estavam fechadas. Os corações também. O crime inicial de Jerusalém foi o de se ter fechado ao Salvador. Se tantos corações e tantos ouvidos se não tivessem cerrado quando Ele "passava fazendo o bem", certamente o fruto monstruoso do deicídio não teria germinado na antiga Cidade Santa. Jesus ganha quase sempre a partida, quando fala a corações abertos. E corações abertos, Ele não os encontrou senão raramente, na sua passagem pelos caminhos da Judéia ou pelas ruas de Jerusalém...

Tudo isto me veio à mente quando nos três dias do último carnaval, fazia um retiro fechado, na Casa dos Padres do Verbo Divino, em Santo Amaro. Ali também, encerrado em uma capelinha no meio da natureza agreste, Jesus velava. Ao longe, eu via a cidade bandeirante, com a multidão de suas luzes, a cintilar na escuridão da noite. O que pensava Jesus, dentro do sacrário, sobre a Cidade de Anchieta?

Como outrora Ele se debruçara sobre Jerusalém, Jesus agora se debruçava em espírito, sobre São Paulo. Quantas almas! Como estavam elas? Muitas estavam de coração aberto para receber Sua graça. Nos retiros espirituais, uma legião de moços ouvia a palavra de Deus.

Mas, mesmo fora dos retiros, quantas almas tinham fome e sede de Justiça, e estavam retidas por deveres múltiplos, no turbilhão da cidade carnavalesca! Como era vivo o seu desejo, de não ofender a Deus! Como estas almas suspiravam por uma palavra de conforto, no meio de tantas tentações. Muitas eram fracas. A sedução das coisas efêmeras ameaçava arrastá-las para o abismo. Uma palavra as teria retido antes do momento imprudente em que se entregaram ao mal. Mas esta palavra não lhes veio... e o Coração de Jesus sangrava.

Outras estavam inteiramente sepultadas na iniqüidade. Mas a saciedade do mundo as assaltava, nos momentos amargos de reflexão solitária. Instintivamente, seu coração se abria para uma felicidade mais completa, que o mundo não lhes poderia dar. Uma palavra oportuna, caída nesse momento, teria sido a salvação dessas almas sofredoras. Como Jesus desejaria que essas almas O ouvissem. Mas o respeito humano as retinha distantes do Templo do Senhor. O momento oportuno passava... e a alma recaía novamente nas garras do vício. Quantas e quantas vezes, sob formas variadas, esses dramas de alma se repetiam! E Jesus, silencioso no fundo do Sacrário, sofria amargamente.

Mas a situação hoje mudou. Jesus não velará mais, tristemente, tolhido de meios humanos de ação, no fundo do Tabernáculo. Sua Providência onipotente encontrou o meio salvador de se dirigir às almas tímidas, aos Nicodemos que desejariam ouvi-lo e não ousam procurá-lo; aos fracos que se sentem em tentação; aos sofredores, que se sentem torturados pela dor, mas que não têm junto de si quem os console. Será em vão, doravante, que as portas se fecharão para Ele nos lares. Será inútil que o respeito humano agrilhoe os pés dos que desejariam ir à Sua procura. Será inútil, ainda, que mil circunstâncias afastem dele, que é a fonte de todas as consolações, as almas sofredoras. Jesus venceu tudo isto. Ele entrará nos corações que O procuram de longe, pelas antenas do rádio.

O Rádio Católico é um inestimável presente de Jesus a São Paulo, e de São Paulo a Jesus. Superior a este presente, só a Adoração Noturna. Igual a ele, só as Congregações Marianas.

Saberá São Paulo compreender o dom de Deus? Saberá ele secundar essa iniciativa para a qual o Coração de Jesus reclama ardentemente todos os apoios e todo o entusiasmo?

Confiamos que sim. A causa do Rádio Católico é de tal relevância, que não há um único congregado, um único vicentino, um único terciário, um único zelador de apostolado, que seja digno desse nome, se não fizer todo o possível pelo triunfo da Voz de Anchieta, e se, depois de ter feito todo o possível, ainda não faça mais alguma coisa.


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