Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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O LEGIONÁRIO e a política

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 2 de fevereiro de 1936, N. 190, pag. 3

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Em nossa crítica, procuramos manter sempre a mais rigorosa imparcialidade política. Mais de uma vez, temos reivindicado a autenticidade de nossos sentimentos apolíticos, para dirigir contra atos governamentais as censuras que, eventualmente, tenham merecido. No número de hoje, felizmente, não se trata de censurar, mas de elogiar. E, no encômio como na censura, queremos proceder com aquela inteira liberdade de opinar, que nossa situação, à margem das disputas partidárias, nos proporciona.

Perderá, pois, o tempo algum político com “p” pequeno e alma ainda menor, que queira discernir em nossos comentários qualquer simpatia ou aversão pelo partido dominante. Nas vésperas da batalha de Abukir, Napoleão dirigiu aos seus soldados a famosa proclamação: “Soldados, do alto destas pirâmides, 40 séculos vos contemplam”. Na luta entre franceses e muçulmanos, o passado egípcio, do alto dos monumentos que deixou, contemplava imparcial o combate que se ia ferir. Não lhe interessava a vitória destes ou daqueles. Mas seu juízo desceria, sereno e realista, sobre os heroísmos e as defecções, a ousadia e a traição, a habilidade ou a incúria dos exércitos em luta.

O jornalista católico, que o seja no sentido autêntico da palavra, deve necessariamente colocar-se em face dos acontecimentos que pontilham com luzes ou com trevas a vida política de cada povo, em situação análoga. Do alto dos vinte séculos que conta a Igreja de Deus, encastelados na rigidez de seus sublimes princípios, iluminado pelo esplendor de suas milenárias tradições, ele deve olhar com imparcialidade as lutas que os homens travam em torno de interesses temporais. Pouco se lhe dá que vença este ou aquele grupo. Mas seu juízo deve descer, imparcial e sereno, sobre os móveis de ação e os instrumentos de combate utilizados pelos exércitos em luta, apontando ao respeito e à admiração os que desposam a causa da Fé, da dignidade e do patriotismo, e à execração os que servem à incredulidade, com as armas da felonia e da mentira.

Catedral de Burgos (Espanha)

Uma diferença, apenas, mas uma diferença capital, medeia entre o vértice das pirâmides e o mais alto da torre de uma Igreja católica, como ponto de observação. É que as pirâmides representam um passado morto, recordação gloriosa de uma civilização cujos últimos vestígios o deserto está tragando, depois de se terem perdido na voragem do tempo todos os homens que a conheceram. A Igreja, pelo contrário, é uma realidade palpitante, que zomba do tempo e que crava as suas raízes frondosas em pleno coração do homem do século XX, com o mesmo vigor e a mesma pujança com que se radicava e florescia em santidade, no peito de um mártir romano ou de um cruzado medieval.

Assim, pois, como católico, não nos interessa que, no turbilhão da política nacional, a palma da vitória seja obtida pelo P.C., pelo P.R.P., ou por qualquer outro partido análogo. Como também nos desinteressamos totalmente da democracia, que alguns quereriam confundir absurdamente com o catolicismo. O que nos interessa é que os princípios da civilização católica sejam defendidos ou reivindicados de acordo com as exigências imperiosas da opinião católica. E, sempre que, nas fileiras de uns ou de outros, alguém se prontificar a cooperar conosco nesta cruzada, resolvendo abrir fogo ao nosso lado, contra alguns ou algum dos inimigos que temos em nossa frente, estamos dispostos a aceitar a cooperação. Estabelecida nessa base, sem compensações de ordem material ou compromissos políticos incompatíveis com a natureza da ação católica, só benefícios pode acarretar para a causa da Igreja tal atitude.


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