Plinio Corrêa de Oliveira

 

Na Montanha Russa

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O Legionário, 6 de janeiro de 1935, N. 162

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De um amigo vindo dos Estados Unidos, ouvi, certa vez, uma pormenorizada descrição de um passeio empreendido em uma terrificante montanha russa de um Luna Park novaiorquino qualquer. E seu coração de provinciano paulista perdido na grande City ainda pulsava apressadamente, com a simples narrativa dos perigos corridos na diabólica montanha russa. Ora o carro se embrenhava por um túnel inquietante cheio de ecos infernais, ora era vertiginosamente atirado para uma grande altura, de onde caía de cheio em abismos devoradores, graças a um alçapão sorrateiro que o passageiro só notava ao ser deglutido pelo vácuo.

Finalmente atingia-se um parque maravilhoso e, quando o viajante já se julgava chegado ao termo, o carro que o conduzia sofria um forte solavanco, caindo em novos precipícios e sendo arrastado para as novas torturas em que se desdobrava o infindável suplício.

A leitura das últimas notícias dos jornais me tem feito lembrar a descrição ingênua do meu amigo provinciano. Que significam estas greves que eternizam, estes conflitos gênero Bauru ou Itajubá que se multiplicam, estas conspirações que se derramam pelo país inteiro?

É tal o número de notícias alarmantes, tantas são as oportunidades que temos de discernir,  através e apesar da incoerência dos boatos, realidades pouco promissoras, que quando se fala em revolução, nos vem logo aos lábios a pergunta: qual delas? A do General Rabelo, a do General Goes, a do General Leite de Castro? Falam-nos em futuras greves, e logo indagamos se é a da Central, se é a do Lloyd, e assim por diante. E, na realidade, são tantas as revoluções anunciadas, tantas as greves prometidas, que não se sabe por que não será desferido o primeiro golpe, desde já ficamos a olhar com desconfiança para este 1935 que nos seus primeiros dias já se mostra tão barulhento e tão carregado de ameaças.

Ainda seria tranqüilizadora a situação, se só conspirassem... os conspiradores, mas parece que o próprio governo conspira para fazer contra-conspiração - é isto ao menos o que se pode depreender dos conciliábulos de Interventores, da misteriosa “démarche” a que está procedendo o Sr. Getúlio Vargas e, principalmente, a insistência com que amigos declarados de S. Exa., como os irmãos Chateaubriand, aconselham a dissolução da atual Câmara dos Deputados, o futuro conselho municipal do Rio e de outras “coisas miúdas”, que teriam por resultado concreto o imediato restabelecimento da ditadura entre nós.

Para onde vamos, Senhor? Ainda perdurará para o Brasil a dolorosa obrigação de recomeçar a trilhar a montanha russa de suas sucessivas esperanças e desilusões políticas quando a 16 de julho já parecíamos ter atingido o porto tranqüilo da legalidade?

* * *

Enquanto nas altas esferas da política, a incerteza das conspiratas e dos conciliábulos nos avizinha do abismo, nossa simples atitude de espectadores nos reduz à impotência.

Esta impotência provém do fato de não se preocupar ninguém em ouvir os católicos. E os maiores culpados por este exílio a que nos atiram somos nós mesmos, soldados rasos da Igreja, que não soubemos cumprir nosso dever.

Em um momento em que se jogam os destinos da Nação em confabulações sucessivas e numerosas, os católicos são atirados à margem. Por quê? Por que os católicos são minoria? Por que os católicos nada têm a ver com isto? Não. Ninguém se recusaria a ouvi-los, se eles estivessem organizados e ninguém nega que eles sejam a grande maioria.

O mal vem de mais longe.

Por respeitáveis motivos, certamente inspirados nos superiores interesses da Igreja, a Liga Eleitoral Católica entendeu de dar liberdade a seus eleitores para votarem nas legendas peceistas, perrepista e da Federação dos Voluntários.

Esta atitude, aconselhada pela extrema delicadeza de nossa situação, não proibia os católicos de fazerem uma seleção entre bons e maus elementos das três correntes.

Ela significava apenas que o católico PODIA sufragar três legendas, sem trair suas crenças.

Mas, para aqueles que desejam um pouco mais do que a modestíssima honra de não serem incluídos entre os traidores, outras questões deveriam inevitavelmente surgir. Das três chapas autorizadas, qual a melhor? Havia maus elementos a serem cancelados em uma ou outra chapa?

Em outros termos: para um católico que fosse inteiramente de Nosso Senhor, a grande questão em matéria eleitoral era esta: como votar de modo a acautelar o mais possível os interesses da Igreja? E nunca esta outra: dentro de que medida posso satisfazer minha paixão política sem trair a Igreja?

E, no entanto, o que foi que vimos? O frenesi da paixão partidária invadir a seara católica, e a amizade pessoal pelos chefes políticos reivindicar para si direitos “eleitorais” sobre o voto católico que deveria ser, nas mãos dos nossos, uma arma ao exclusivo serviço da Igreja.

Qual o resultado deste olvido de nossos deveres? Mostraremos claramente a dura realidade, que é esta: uma legenda protestante organizou-se e obteve a vitória de quase todos os candidatos anticatólicos, em um Estado essencialmente católico como o nosso, dotado de um dos mais pujantes eleitorados católicos do País.

* * *

Convirá desanimar?

Nunca.

Seria esta a última das defecções e o pior dos recuos.

Abandonar a Igreja porque Ela não foi devidamente defendida por seus filhos, seria absolutamente igual a abandonar Nosso Senhor no Calvário porque todos O haviam abandonado.

É preciso reagir, e reagir com a veemência de um tufão. A palavra de ordem no momento é esta: não desanimar.


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