Legionário, Nº 705, 10 de fevereiro de 1946
7 Dias em Revista
O caso grego parece resolvido. O "camarada" Vishinsky denunciara à ONU e ao mundo, por meio da ONU, a opressão exercida pela Grã-Bretanha na Grécia e pedira contra a atitude britânica a sanção das Nações Unidas. Acrescentou que o assunto era da alçada da ONU, porquanto a atuação inglesa punha em risco a segurança mundial. Em outros termos o que se passava na Grécia era de tal maneira grave, que a URSS previa a eventualidade de lançar o mundo inteiro em uma nova catástrofe para fazer cessar os insuportáveis abusos dos britânicos.
Acontece que o representante da Grécia na Organização das Nações Unidas se levantou e protestou. A Grécia - no caso a grande vítima - não sentia sobre a própria pele a pressão do guante britânico. Pelo contrário, achava que as tropas inglesas estabelecidas em território helênico procediam de modo admirável. A Grécia dispensava, pois a "defesa" que a Rússia se dispunha a fazer de seus interesses. E declarava ao mundo que, se era por ela que nova guerra se declararia, a guerra seria sem qualquer motivo plausível ou verossímil.
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Isso equivalia, evidentemente, a chamar os russos de mentirosos e hipócritas. Com efeito, se era verdade o que dizia o representante grego, como qualificar a atitude soviética?
O "camarada" Vishinsky, cuja língua é solerte, retrucou. Disse que o governo grego é de fancaria e não representa a opinião. Pelo contrário, era imposto pelos ingleses. O que equivale a chamar o representante grego de tartufo. E condecorar com semelhante epíteto o governo inglês.
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Percebeu-o o Sr. Bevin que respondeu com igual presteza: os sovietes mentiam (sic) em sua alegações, (sic) caluniavam a Inglaterra, adulteravam os fatos, etc., etc. O Sr. Bevin terminou por pedir que, sobre a pendência, se pronunciassem os membros do Conselho da Organização das Nações Unidas.
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Fez-se a votação. E a maioria dos países se manifestou a favor dos britânicos. Então a URSS ameaçou de se retirar da Organização das Nações Unidas. Estavam as coisas neste pé, e as Nações Unidas mais do que nunca se sentiam desunidas, quando intervém Stettinius, com uma fórmula. Já que a URSS não aceitava o pronunciamento da Assembléia; já que do outro lado a Inglaterra exigia esse pronunciamento, resolvia-se a questão suspendendo a votação.
Pelos votos já apurados, via-se que a Inglaterra venceria. Mas como nem todos os votos estavam apurados, não havia julgamento. E se atendia simultaneamente à Inglaterra e à Rússia.
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Evidentemente o "arranjinho", pelo que tem de precário e de forçado, lembra brincadeiras de crianças. Lembra comédia. E, para acentuar bem a teatralidade de quanto ocorrera, a coisa terminou assim:
"Bevin e Vishinsky então trocaram um cordial aperto de mãos. Em seguida, Bevin apertou as mãos de Stettinius, e os três estadistas, ainda de mãos dadas, levantaram para receber grandes aplausos de todo o Conselho e foram cordialmente cumprimentados pelo ministro do Exterior da Grécia, pela maneira feliz com que foi encerrado o assunto". Terminam assim os espetáculos, com aplausos da platéia, e os atores de mãos dadas na cena.
Pouco antes, voavam de lado a lado as injúrias.
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Do ponto de vista moral, a que chegamos? Inglaterra, Rússia, Grécia, disseram-se mutuamente as maiores injúrias. Até o delegado do Brasil teve sua parte na distribuição de grosserias do camarada Vishinsky. Ora, ou todos mentiam, e neste caso o tribunal não tem idoneidade, ou todos diziam a verdade, e nesta caso as injúrias eram merecidas, e ainda continuamos em que o tribunal não tem autoridade. Ou só mentiam alguns. Estes, ou seriam os sovietes, ou os britânicos. E verdadeiramente aí está um caso em que não se pode dizer "entre les deux mon coeur balance". Com efeito, os sovietes mentiram evidentissimamente.
Isto posto, prossigamos em nossos raciocínios. Se uma potência, evidentemente mentirosa, tem o direito de suster qualquer julgamento que contra ela se pronuncie com que direito amanhã se há de querer levar até o fim algum julgamento sobre pendência ocorrida entre Mônaco e Andorra, ou entre São Domingos e Haiti?
Por outro lado, se um dos juizes é tão francamente, tão desabaladamente iníquo; se por outro lado ele é tão forte que contra ele nenhum julgamento pode prevalecer, do que vale então a ONU?
O maior agressor de nossos dias, na Ásia como na Europa e até na Indonésia e África, é sem dúvida a URSS. Ficou provado que contra esse agressor a ONU é impotente. O que equivale a dizer que a ONU também não vale nada.
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E com isto, se confirma nossa tese, de que só mediante a presidência suprema do Santo Padre, e na atmosfera da civilização cristã, os povos católicos podem encontrar a possibilidade de constituir um organismo internacional que seja justo, imparcial e espiritualmente forte.
Mas há um plano mais inviável do que este, no mundo contemporâneo?
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Tudo isto significa, não que devamos encarar com má vontade a ONU, mas que devemos reconhecer com melancolia sua visceral impotência. É precisamente o ponto de vista do Cardeal Griffin, na entrevista que concedeu aos representante católicos acreditados na ONU.
Disse ele que "há uma grande esperança de que, com o auxílio de Deus, as Nações Unidas conseguirão restaurar a ordem no mundo". Preveniu, entretanto, que "quaisquer acordos, conferências ou cartas não beneficiariam a causa da paz se não forem baseados na vontade de Deus".
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Uma notícia informa que "no recinto da Assembléia Geral da Organização da Nações Unidas, mais de 250 delegados pronunciam, em discursos ou declarações, cerca de 12.000 palavras por dia. Treze taquígrafos anglo-norte-americanos e seis franceses, revezando-se, apanham cerca de 260 palavras por minuto. Oitenta quilômetros de linhas telefônicas, com 250 aparelhos estão instalados no Central Hall, por intermédio dos quais os delegados poderão falar facilmente para seus respectivos países. Em quatro dias de trabalho, mais de 400.000 documentos já foram publicados. Mesmo antes da reunião da Assembléia já haviam sido publicados 2.360.000 documentos".
Ora, sem Deus, tudo isto será um palavrório inútil, e tanto mais desacreditado quanto mais copioso, torrencialmente copioso!
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Disse com muito espírito o Sr. Bevin que sempre que a URSS toma uma atitude, as pequenas seções do partido comunista no mundo inteiro a acompanham. O "camarada" Luiz Carlos Prestes, com aquela inabilidade maciça que o caracteriza, apressou-se em confirmar as palavras do ministro inglês. Em nossa Constituinte, exigiu a retirada das tropas inglesas da Indonésia e da Grécia. Não confere?
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Enquanto tudo isto se passa, a URSS vai se expandindo tranqüilamente. Notícias de Washington informam que ela impôs ao cristianíssimo Reino da Hungria um tratado comercial absolutamente iníquo. E ao mesmo tempo, fora da ribalda da ONU, "negocia" com a pobre Pérsia que parece deixar-se deglutir lentamente. E que remédio?
Na Áustria, os comunistas continuam sua propaganda com todas as franquias da lei. É que todas as opiniões são livres. Todas? Nem tanto. Assim, enquanto os comunistas têm o direito de pregar livremente o assassínio, os incêndios, o roubo, o saque, o governo austríaco publicou uma declaração em que se proíbe ao arquiduque Otto de Habsburg e às pessoas de sua família o regresso à Pátria.
Por que? Se todos têm o direito de propagar tudo, só não é justo que volte à Áustria o rebento de uma dinastia a qual aquele país deve toda a sua grandeza? Por que se considera "democrático" o direito de propagar o comunismo, e antidemocrático o direito de propagar aquilo que é precisamente o contrário do comunismo?
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Registramos com satisfação as palavras do Presidente Truman a 14ª Convenção Anual da Conferência Nacional Católica reunida em New York. Disse o ilustre estadista que outrora se fez a Declaração dos Direitos do Homem. Seria tempo de fazer a Declaração dos Direitos da Família.
Palavras como esta, rompendo claramente com o individualismo excessivo da Revolução, dignificam o conceito de democracia, enquanto o degradam injustiças e incongruências como a que apontamos acima acerca da Áustria e, em nosso artigo de fundo, acerca da lei eleitoral brasileira.
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E voltemos ao "camarada" Prestes. Os mesmos dedos que deram corda à sua língua para protestar contra a atitude inglesa na Indonésia deram corda aos elementos do Partido Comunista Malaio, que também eles, confirmando exatamente as palavras de Bevin, atacaram rudemente a política britânica naquela região.
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Chamamos a atenção da polícia para a propaganda divorcista que se realiza entre nós. Nossas leis permitem - infelizmente - que alguém seja divorcista. Não permitem, porém, que se instalem escritórios para anular fraudulentamente casamentos. Um leitor do Rio de Janeiro nos enviou entretanto um anúncio em que se oferece "novo casamento no México e no Uruguai", prometendo "amplas informações gratuitas" e "referências de pessoas que já terminaram seus assuntos satisfatoriamente", a que telefonasse para o aparelho xxxx. As legações do Uruguai e México deveriam pedir providência para cada caso concreto que aparecesse assim.
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Do Rio de Janeiro nos enviou um leitor anônimo, mas inteligente e prestativo, o seguinte recorte publicado pela imprensa local:
"Comunica-nos a Secretaria de Viação da Prefeitura que a limpeza de cartazes e letreiros a tinta, feitos nos lugares proibidos por lei, tais como monumentos, edifícios, árvores etc. exigiu o trabalho de l.500 homens por dia.
Só em ingrediente para tirar as tintas foram gastos mais de l0.000 cruzeiros.
A lei não impede a propaganda por cartazes e letreiros; apenas proíbe a sua colocação em determinados lugares, com o intuito de preservar a boa aparência da cidade e evitar, como agora, dispêndios inúteis.
Os candidatos às futuras eleições muito se recomendarão, conquistando a simpatia e a gratidão do povo, se derem instruções aos seus propagandistas para só colocarem cartazes e letreiros nos lugares permitidos por lei".