Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

7 Dias em Revista

 

 

 

Legionário, N° 774,  8 de junho de 1947

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Publicamos hoje o texto telegráfico do notável discurso pronunciado pelo Santo Padre Pio XII ao agradecer os cumprimentos que lhe foram apresentados pelo Sacro Colégio Cardinalício, por ocasião do dia de Santo Eugênio, onomástico do Sumo Pontífice.

Como tal discurso contém vários ensinamentos preciosos, registramo-los nestas notas.

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Antes de tudo, note-se a objetividade e fortaleza da atitude assumida pelo Sumo Pontífice. A descrição que ele nos faz do panorama contemporâneo está longe de ser rósea, e constitui um desmentido frontal aos católicos que se comprazem em ver no mundo de hoje um mar de rosas. Quando o LEGIONÁRIO diz sobre a época em que vivemos algumas verdades amargas, há rostos que se fecham, simpatias que se retraem, aplausos que murcham. Somos pessimistas, vemos tudo através de óculos negros, etc., etc. Leia-se entretanto o balanço da situação presente, feito com clareza no discurso de Pio XII. O resultado é precisamente o déficit moral, político e espiritual formidável, que costumamos denunciar.

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Ver as coisas como elas são, e dizer que são péssimas quando de fato são péssimas, está longe de ser pessimismo. É realismo.

Mas o verdadeiro católico, ainda quando vê negro o quadro, não desanima, e precisamente nisto ele se diferencia dos pessimistas. Por maiores que sejam as dificuldades, a Providência vela sobre nós. É desta virtude de confiança que, nos dá um exemplo Pio XII, quando concluída a lúgubre descrição dos dias em que vivemos, afirma que tudo ainda pode ser salvo pela virtude da Igreja, e incita os católicos à luta. Vistas as coisas sob esta luz, bem podemos dizer que não somos pessimistas porque, graças a Deus, se há coisa que jamais faltou é o ânimo de lutar.

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Também é digna de nota a observação do Sumo Pontífice sobre a identidade de métodos e de conduta entre o comunismo e o nazismo. Diz ele: conhecemos quão extensa é a gravidade dos horrores sem nome, pelos quais o regime vencido cobriu de desolação a Europa e não queremos diminuir o vulto de suas faltas, nem tolerar os métodos de ódio e violência em que esse regime viveu: por que empregar armas cujo uso em outras mãos suscitou justa indignação? E que homem sensato quereria procurar na ruína e na miséria de um vizinho a garantia para a sua própria segurança e estabilidade?

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Há hoje os medrosos que tem medo de tudo, e até das sombras. Para eles, todo o gesto de coragem é temeridade, toda a franqueza é loucura, toda a resistência ao mal é imprudência.

Estigmatiza-os muito bem o Santo Padre:se existe hoje alguma coisa que possa causar medo é o medo em si mesmo. Não existe pior conselheiro sobretudo nas circunstâncias atuais. O medo apenas causa cegueira e faz com que os homens se afastem do caminho reto da Verdade e da Justiça”.

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Há pessoas para quem as condenações fulminadas pela Santa Sé contra o comunismo prescreveram. Dir-se-ia que entre católicos e comunistas existe um grande equívoco, e nada mais.

Evidentemente, as condenações pontifícias não prescrevem. Por isto mesmo Pio XII reafirmou todos os ensinamentos com que seu venerando antecessor estigmatizou a doutrina comunista: “falsos profetas sem escrúpulos propagam pela força e pela violência concepções contrárias à ordem natural e cristã, anti-cristãs e ateístas, condenadas pela Igreja sobretudo na Encíclica Quadragesimo Anno de Nosso Predecessor Pio XI”.

Esta Encíclica não só condenou o comunismo, mas o socialismo, proibindo formalmente a expressão detestável “socialismo cristão” ou “socialismo católico”.

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Leiamos agora mais este trecho de ouro, a respeito do medo e dos medrosos: “o medo receoso de si mesmo surge muitas vezes disfarçado. Esconde-se sob as vestes mentirosas do falso amor cristão para com os oprimidos, como se os povos sofredores pudessem ser beneficiados pelos erros e injustiças da tática demagógica e das promessas que jamais poderão ser cumpridas. Outras vezes esconde-se sob as aparências da prudência cristã e, com esse pretexto, faz com que os homens permaneçam mudos, quando o seu dever seria proclamar que não é permitido, para satisfazer a paixão do lucro ou do domínio, fugir a linha inflexível dos princípios cristãos”.

Em suma, na questão social há os que tem medo da massa, e os que tem medo do ouro. Erram uns e outros: o verdadeiro católico confia inteiramente em Deus e luta com desassombro, quer contra a multidão infrene, quer contra a tirania do ouro.

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Mas a Igreja pode tornar-se detestada por todos, alegam os medrosos. Pio XII os esmaga com estas palavras: “...esta observação deveria bastar para fazer com que vós, católicos, sentísseis orgulho, pois o rancor alimentado contra a Igreja põe em evidência  sua grandeza espiritual e moral e sua atividade em prol do bem estar da humanidade”.

E mais adiante acrescenta: “A tarefa que vos está confiada pela Providência Divina nessa hora crucial não é a de concluir uma paz pusilânime com o mundo, mas a de construir uma paz verdadeiramente digna diante de Deus e dos homens”.

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Nesta semana tão cheia de acontecimentos importantes, poucos têm a gravidade da evasão ou soltura de Abd-El-Krim, episódio talvez não muito considerável em si mesmo, mas no qual se patenteia claramente o arrojo e energia da Liga Árabe, a indolência e a fraqueza do mundo cristão.

Sabemos quem é Abd-El-Krim, caudilho maometano que pôs a ferro e fogo a África Setentrional e diante do qual tiveram de se coligar duas potências ocidentais, a França e a Espanha, para conseguir resultados duráveis. Hoje em dia, esse velho dissoluto, que mantém um harém com vinte “esposas”, possivelmente já terá chegado a um estado próximo da decrepitude. Mas seu nome é uma bandeira de insurreição. E essa bandeira foi desfraldada pelo Rei Faruk do Egito sobre todo o litoral maometano do Mediterrâneo, com o “golpe” que acaba de dar ao oferecer asilo a Abd-El-Krim.

A França e a Espanha de hoje sofrem os efeitos terríveis da guerra, e estão menos aptas a lutar do que em 1921, ao menos do ponto de vista econômico, que na guerra moderna é muito importante. Uma ação conjunta de ambas seria difícil de estabelecer, vista a profunda dissensão política que as separa. Tudo indica, pois, que começaremos a presenciar um regime de exigências e ameaças veladas, dirigidas primeiramente contra a França, e que a levarão a sucessivas concessões. Depois, virá possivelmente a vez da Espanha. Poucos fatos poderiam ter gravidade econômica e política maior. A Europa perde com isto o domínio exclusivo do Mediterrâneo.


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