Legionário, n.o 770,  11 de maio de 1947

7 DIAS EM REVISTA

antes da guerra, o panorama da política interna de todos os povos ocidentais se podia resumir em traços gerais muito simples, e iguais para todos. De um lado, um partido comunista, e do outro os partidos não comunistas. O partido comunista representava o elemento claro do quadro. Sabiam todos o que era e o que queria o comunismo. A incógnita eram os partidos não comunistas. De que maneira queriam fazer face ao comunismo? Uns, os liberal-democratas, confiavam nos meios suasórios e repudiavam a repressão violenta. Outros, os socialistas, procuravam desarmar o comunismo, não apenas pela política do laisser faire liberal, mas por uma série de concessões sociais destinadas a amansar a fera vermelha. Os nazistas e seus consectários usavam uma e outra coisa: violentos na repressão policial, concediam tudo ou quase tudo em matéria de legislação social. Por fim, os monarquistas radicais e completos, do tipo dos legitimistas austríacos, requetés espanhóis, etc., adotavam a bandeira da contra-revolução. Não bastava reprimir a expansão do partido comunista pela força – o que aliás já seria ótimo – mas era preciso impedir que o partido subsistisse e encontrasse simpatias ocultas e para isto dever-se-iam restaurar as antigas instituições monárquicas e aristocráticas, que a Revolução de 1789 derrubara, e com cuja queda o mundo entrou na era catastrófica das dissenções sociais.

* * *

Assim, pois, ao lado do problema central comunismo contra anticomunismo, havia outro problema quase tão importante: qual a forma de anticomunismo que deveria preponderar? Dos vários modos possíveis, de reação anticomunista, qual adotar?

Se esta pergunta a todos interessava, especialmente deveria interessar aos católicos. Com efeito, sendo a Igreja a alma da civilização cristã, por definição todos os seus filhos são contra o comunismo, que é a realização arquetípica da civilização anti-cristã. Daí, para o Catolicismo, um empenho fundamental em debelar o comunismo e, consequentemente, um interesse muito vivaz na escolha do melhor método de ação anticomunista.

* * *

Entre tantas tendências diferentes no campo anticomunista, os católicos coletivamente, e como tais, não optaram por nenhuma. Pelo contrário, eles se distribuíram pelas várias correntes, adotando até, uma ou outra vez, posições excessivas de tolerância que iam desde o liberalismo ingênuo, até o colaboracionismo imprudente, ou a repressão racista.

* * *

Depois da última guerra, derrotado o nazismo, o grande problema passou a ser o seguinte: quem dirigiria e orientaria a luta contra o comunismo, o esquerdismo trabalhista, ou algum movimento neo-direitista?

Durante muito tempo, a solução do problema pareceu estar em suspenso, havendo mesmo indícios de que o anticomunismo (aliás imensamente suspeito) dos trabalhistas britânicos, do MRP francês, do PDC italiano etc., iria ser a única fórmula de reação anticomunista a sobreviver no mundo.

Ultimamente, porém, os trabalhistas sofreram uma grave derrota na Inglaterra, o MRP francês está em grave risco graças à crise ministerial e ao discurso de De Gaulle, e o PDC italiano está às portas da desagregação interna e da queda do gabinete.

Tudo indica, pois, que não é pelo lado do moderantismo (?) esquerdista que se canalizará a reação anticomunista.

* * *

Será para uma neo-direita? E, em primeiro lugar, o que é uma neo-direita? Se o direitismo já é coisa difícil de definir (tão afim e conivente com a esquerda se apresenta ele às vezes) como dizer então o que é o neo-direitismo?

Nos Estados Unidos, a luta contra o comunismo está sendo travada em nome da democracia. De Gaulle combate o comunismo em nome da autoridade. Churchill o combate em nome da liberdade e da tradição. É patente que uns e outros estão ganhando terreno. De que modo evoluirão as forças políticas que representam? Quererão conservar a democracia? Ou chegarão até a ditadura?

* * *

Este problema também é doméstico, para nós brasileiros. Fechado o partido comunista por uma sentença merecidíssima do Tribunal Eleitoral, o anticomunismo ganha pé. Até onde irá ele? Abolirá num futuro mais ou menos remoto as instituições vigentes? Chegará até a restauração do poder pessoal do ditador?

É extremamente difícil responder a isto. Mas uma coisa é certa: se os democratas querem salvar a democracia, tratem de a dignificar pela elevação do programa e das atitudes. Do contrário, estarão eles mesmos fazendo mais mal para o País, do que todos os agentes de dissolução vindos do estrangeiro.

* * *

Quanto a De Gaulle, nossa posição não mudou. Por enquanto, o grande chefe francês está desfazendo os equívocos semeados pela política inominável do MRP. Ele está separando claramente o joio do trigo e criando contra o bloco esquerdista um bloco anticomunista arrojado e vigoroso. Sua política vai desagregando o MRP e desmoralizando a famosa tática da politique de la main tendue.

Tudo isto é excelente, merece aplausos sem reserva. Chegará De Gaulle até a ditadura? Suprimirá a democracia na França? Não o sabemos. Mas, postas as atuais circunstâncias, será um erro e um crime que ele chegue a abolir a ordem legal para instituir o puro poder pessoal.

Sem nos comprometermos com De Gaulle numa solidariedade imprudente, aplaudimos contudo o que ele faz até agora. Quanto ao futuro, veremos depois.

* * *

Todas estas considerações de ordem geral definem e justificam por si sós, nosso aplauso ao fechamento do Partido Comunista no Brasil. Um fenômeno sadio de reação se esboça em todo o País. Para se afirmar e vencer, precisa este fenômeno levar à falência o regime constitucional? Não o cremos.

Vamos ver se a habilidade de nossos políticos corresponde à expectativa do povo neste sentido.