Legionário, N.º 768, 27 de abril de 191947

7 DIAS EM REVISTA

Na semana passada chegaram ao Brasil duas notícias dignas de registro: foi executado na Tchecoslováquia Mons. Tiso, antigo "quisling" da Slovania e foi condenado à pena de prisão perpétua, perda da dignidade nacional e confisco de bens o Pe. Vexilaire, acusado de ter denunciado aos nazistas numerosos patriotas e membros da resistência francesa.

A traição infame de Judas nada prova contra a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo ou a santidade dos Apóstolos. Do mesmo modo a defecção moral deste ou daquele sacerdote nada prova contra a divindade da Igreja, é evidente que deste ponto de vista, as notícias em questão nem sequer merecem comentário. Mas há no assunto outro aspecto menos evidente, se não intrinsecamente, ao menos para os olhos profanos naturalistas e de visão curta, do homem do século XX. É sobre este último aspecto que queremos aduzir alguns comentários.

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O Pe. Vexilaire é, para nós, um desconhecido. Gostaríamos de igualmente jamais ter ouvido falar de Mons. Tiso. Durante todo o tempo em que ele atuou na política causou-nos penosíssima impressão, que calamos apenas por respeito à dignidade sacerdotal de que se achava revestido. Rompemos hoje nosso silêncio, e declaramos de público este sentimento apenas para mostrar até que ponto somos imparciais ao fazer comentário sobre o assunto. Este comentário, contudo, não poderá deixar de ser desassombrado e claro.

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O princípio  que convém lembrar a este propósito consiste em que os clérigos são pessoas sagradas, revestidas de uma dignidade imensamente mais alta do que a de qualquer leigo, por mais virtuoso ou eminente que este seja. Não se trata de uma preeminência de virtude, mas da dignidade da função e do Sacramento da Ordem. De outro lado, o clérigo está ligado ao culto divino, e é, portanto, inteiramente dependente da Igreja. Por todos estes títulos, nenhuma autoridade secular, qualquer que ela seja, pode julgar e punir um clérigo. Em caso de crime praticado por algum clérigo, deve o Estado entregar o criminoso ao julgamento da Igreja.

Não foi o que se fez, nem em um nem em outro caso. Por mais culpados que tenham sido esses sacerdotes, a pena assim aplicada a ambos – máxima a pena de morte de Mons. Tiso, que significa violência física no corpo sagrado de um Ministro de Deus – não pode deixar de impressionar dolorosamente os católicos.

Compreende-se, pois, perfeitamente o protesto lavrado pelo “Osservatore Romano” sobre o assunto.

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Segundo telegramas veiculados pela imprensa diária, o Sr. Winston Churchill, comentando a atitude do Sr. Wallace, declarou, em discurso pronunciado perante a associação "Primorose", no "Albert Hall", que o Sr. Wallace é um comunista disfarçado que foi à Inglaterra trabalhar por que esse pais abandonasse a aliança norte-americana e se atirasse nos braços de Moscou. Acrescentou o ex-premier britânico que o gabinete trabalhista tem sido beneficiado largamente por empréstimos nos Estados Unidos, e se mostra contudo amigo dos maiores adversários da nação americana.

Dias depois, o Sr. Churchill desmentiu que tivesse chamado o Sr. Wallace de comunista disfarçado. Acrescentou que se limitara a dizer que o Sr. Wallace tivera um encontro com comunistas disfarçados da Inglaterra. Mas não desmentiu nada mais do que declarara.

Assim, pois, o quadro fica em essência o mesmo. Há comunistas disfarçados na Inglaterra. O Sr. Wallace de comunista disfarçado obra tal como nenhum comunista disfarçado o poderia ter feito melhor, confabulou com esses comunistas disfarçados amistosamente. E o governo trabalhista fez o mesmo jogo do Sr. Wallace e dos comunistas disfarçados, abusando da liberalidade norte-americana.

Como se vê, é bem este o quadro pintado pelo "Legionário", e nosso jornal recebe uma confirmação brilhante, com as palavras do "leader de guerra" do Império Britânico.

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Um homem contra o qual muito temos escrito é o Sr. Beveridge. Este intelectual socialista acaba de escrever um artigo, pondo de sobreaviso a opinião britânica contra a hipertrofia do sindicalismo. Beveridge denunciou a tendência dos sindicatos ingleses de se agruparem e fundirem em associações poderosas, que absorvem todos os grupos menores, e monopolizam o movimento operário. No dia em que tal obra tiver chegado ao seu termo, os dirigentes desses sindicatos terão adquirido uma influência tão despótica, disse Beveridge, que, oficialmente ou não, a estrutura política da Inglaterra terá deixado de ser autenticamente democrática.

É esta uma das acusações que mais insistentemente temos feito contra o trabalhismo britânico: seu sistema de ditadura financeira e sindical conduzirá por força à ditadura política. Aliás, este mal é próprio do socialismo de todos os matizes qualquer que ele seja. Não sabemos como o Sr. Beveridge, tão aguçadamente socialista, não percebe isto. Mas, de qualquer forma é incontestável que neste caso concreto a crítica do Sr. Beveridge é bem procedente.

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Uma das conseqüências salutares da política do Sr. De Gaulle consiste em estar destruindo a linha de conduta ambígua do MRP perante o comunismo. Um telegrama procedente de Paris informa que o MRP já está dividido em duas correntes, uma que “colabora” e outra que combate o comunismo, e que esta última corrente se aproxima de De Gaulle. Se este, por sua vez, não descambar para o totalitarismo, pode-se augurar o melhor resultado de tais acontecimentos.