Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

7 Dias em Revista

 

 

 

 

 

Legionário, Nº 737, 22 de setembro de 1946

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Graças a Deus está promulgada a Constituição, na qual foram inscritas as reivindicações mais urgentes e essenciais da consciência católica.Voltamos ao regime legal, das responsabilidades e direitos definidos. E uma era de tranqüilidade relativa parece abrir-se para nós. Há dois modos de aproveitar as vantagens da tranqüilidade. Os frívolos a apreciam por causa da despreocupação que traz. Os sensatos, pelo contrário, são sôfregos de tranqüilidade precisamente porque ela permite que o espírito se entregue, sem tropeços, a suas grandes e essenciais preocupações. Não aplaudimos a tranqüilidade constitucional como meio de criar no país a era do otimismo falso, de moleza e de dissolução para a qual tendem os frívolos com todas as forças. Dentro da normalidade dos próximos dias que talvez sejam sem tropeços, devemos entrar em nós mesmos, pesar com calma e gravidade os acontecimentos passados e presentes, e pensar sobre o futuro. Devemos auscultar em todos os seus sintomas, desde os mais evidentes até os mais sutis, as grandes transformações por que vai passando a alma do Brasil, seus costumes, sua estrutura social. Devemos auferir o valor de todas estas transformações atuais e potenciais à luz da doutrina católica. Devemos pressentir, no futuro que se prepara nas próprias entranhas do presente, o que conduz para Cristo, e o que tende a nos separar de Cristo. E devemos tomar, em conseqüência disto, nossas providências.

É neste espírito, sem pessimismos injustos, nem otimismos tolos e sabendo algum tanto a evolucionismo pagão, que entramos hoje na era nova, fazendo um primeiro comentário sobre a constituição.

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O "Osservatore Romano" publicou hoje um belo artigo sobre a atitude moral e afetiva da América Latina perante a Itália. Mostrou o órgão pontifício que, mesmo nos dias mais amargos, toda a América Latina não deixou de olhar com simpatia a nação italiana, na qual viu sempre "uma irmã ou uma nação-mãe, porque a Itália é para os países latinos o berço de nossa civilização". É dentro desta atmosfera que se explica inteiramente a nobre atitude assumida pelo Brasil em favor da Itália, na Conferência de Paris.

Isto posto, dediquemos aos assuntos italianos nossos primeiros comentários de hoje.

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Parece que o Sr. De Gasperi sentiu finalmente os graves inconvenientes que sua atitude nitidamente tendente para a esquerda, expunha seu próprio partido. Assim pela primeira vez, desde que está no governo, pareceu distanciar-se nitidamente dos comunistas e socialistas, aproximando-se do centro-direita, e da direita. É fato que isto se deu em uma questão secundária. Mas esta questão, por ser secundária, nem por isso deixa de ser interessante, pois que revela as tendências mais íntimas da política do primeiro ministro perante as várias forças políticas de seu país. Logo depois da proclamação da República, houve um expurgo de monarquistas no Exército e em outras esferas do país. Os socialistas e os comunistas estimularam o expurgo, que pelo contrário contristou vivamente os elementos anticomunistas. Estes percebiam, com efeito, que os cargos que os monarquistas deixassem vago corriam grave risco de ser preenchidos por socialistas e comunistas, ao menos em boa parte: não é de coligação o governo, e não fica ele, pois, obrigado a escolher para as funções públicas gente de todos os partidos? Feito o expurgo só contra os monarquistas e providas as vagas dentro de um critério eclético, era toda a máquina militar, diplomática e administrativa do Estado italiano que tendia para a esquerda.

Ora, discorrendo sobre a eventualidade de novas medidas contra os monarquistas, o Sr. De Gasperi afirmou que já não seria mais levado avante. A direita e o centro acolheram com aplausos as palavras do chefe de gabinete. A esquerda socialista e comunista se manteve em pesado silencio.

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Por que tal silêncio? Pois os socialistas e comunistas não se inculcam como os mais ardentes partidários da liberdade de pensamento? Qual o motivo por que negam esta liberdade aos monarquistas? Se, sob o regime monárquico, se expulsassem de cargos públicos os adeptos da segunda ou da terceira internacional, os socialistas e comunistas não diriam que isso é contra a verdadeira liberdade? Por que motivo, invertida a situação, não pensam eles no mesmo modo?

Esta pergunta não tem um interesse circunscrito ao campo da política italiana. Seu alcance é universal, e exprime a verdadeira mentalidade socialista e comunista no mundo inteiro.

É absolutamente óbvio que dizemos isso com vistas de modo todo particular, ao Partido Comunista do Brasil.

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Acolhemos com vivo pesar a notícia de que as autoridades iugoslavas prenderam monsenhor Stepinac, arcebispo católico romano de Zagreb.

É outra manifestação da "liberdade de pensamento" que os comunistas põem em vigor quando estão no governo.

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Registramos com satisfação os resultados da eleição na zona livre da Alemanha, isto é, da zona ocupada pelas potências ocidentais, na qual o povo pode votar sem constrangimento de espécie alguma.

Como se sabe, os cristãos tiveram uma maioria de mais ou menos três milhões de votos sobre os social-democratas. Todos os outros partidos obtiveram votação menor, sendo estrondoso o fracasso do partido comunista.

Mais significativo ainda é, talvez, que a votação cristã, na zona russa, haja registrado, se não maioria (a parte protestante é forte na população da zona russa, e os protestantes muito divididos, pouco contam como fator eleitoral), ao menos resultados bem apreciáveis. Com efeito, é em pleno regime de opressão, quiçá de fraude eleitoral, que a opinião católica afirma assim sua pujança.

Nesta semana, os comunistas perderam as eleições também na Suécia. O quadro que eles têm diante de si não é, pois, muito risonho.

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Não podemos deixar de registrar os índices mais significativos do crescimento do nacionalismo anti-europeu e anti-americano das nações pagãs da Ásia. Dia virá que se compreenderá que não exageramos a gravidade deste fato.

Cogita-se, no momento, de reunir uma Conferência das Relações Inter-asiáticas para decidir, sem intervenção das potências ocidentais cristãs ("vagamente semi- cristãs", melhor se diria) os problemas da Ásia. A comissão organizadora da Conferência já escolheu sua presidente... uma mulher, a Sra. Seriolini, natural da Índia.

Considerada a coisa do ponto de vista meramente natural, é razoável se realizamos aqui conferências inter-americanas, nas quais não gostaríamos de atribuir lugares às potências extra-americanas, é compreensível que os asiáticos queiram fazer o mesmo quanto a seu próprio continente.

Mas a questão é que o movimento de opinião que se afirma no próprio fato da realização da conferência visa muito mais do que isto, e quer organizar uma Ásia inteiramente regionalista, em cuja mentalidade, costumes, vida, nada tenha que ver com o Cristianismo, reputado algo de alienígena. É um pouco a mentalidade da Ku-Klux-Klan americana transposta para os problemas asiáticos.

Ora, é claro que, na medida em que a realização dessa conferência exprime a pujança de tal movimento de opinião, deve incutir receios muito graves. É o que queremos salientar.

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Passemos de um para outro extremo do mundo pagão, isto é, da Índia para o Marrocos. Agita-se ali intensamente o movimento pan-árabe, que melhor se chamaria pan-mussulmano. E põe em risco o domínio espanhol. Outro índice de que todo o mundo pagão está sendo sacudido por movimentos convulsivos que o percorrem de ponta a ponta, que tendem a se tornar cada vez mais extensos e intensos, e que tem por tendência comum, a aversão a tudo quanto é europeu, inclusive o Catolicismo ou as seitas heréticas e cismáticas.

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E deixamos para o fim, como a nota que mais deve impressionar, a inércia do governo trabalhista diante da ofensiva comunista dos squatters. Como havíamos previsto, o governo retarda o mais possível sua intervenção. Resolver-se-á ele a intervir algum dia? Quando será esse dia? Talvez amanhã, talvez hoje. E... talvez nunca.

Isto nos leva a uma reflexão.

Quando suspeitamos os trabalhistas britânicos, de tendências socialistas e até comunistas, mais de um leitor poderia facilmente opor-nos declarações formais dos leaders laboristas, contra o comunismo. O argumento é embaraçoso: não é convincente. Por vezes, declarações destas são tanto mais suspeitas, quanto mais enfáticas. É precisamente quando a mentira cresce de gravidade, que o mentiroso afirma com mais ênfase. Está aí o caso. Se trabalhistas e comunistas tivessem combinado esse formidável golpe na instituição da propriedade privada, não teriam agido de outro modo. Os trabalhistas, negligenciando de ocupar os prédios já sem utilização oficial, criaram o problema e nada fizeram para o evitar. Os comunistas completam o que os trabalhistas não poderiam fazer sem se incompatibilizar por demais com a opinião pública.

Mas esta, na Inglaterra, pregou surpresas. É possível que o Sr. Attlee se veja obrigado a mudar bruscamente de tática diante da pressão da opinião pública, o que ele será suficientemente solerte para fazer diante dos primeiros sintomas, e antes mesmo que os ingênuos possam perceber que ele está agindo por pressão política. Porque uma coisa é certa: a Inglaterra inglesa, real, não apoia os squatters.


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