Legionário, Nš 714, 14 de abril de 1946
7 Dias em Revista
O LEGIONÁRIO tem acentuado com insistência que o católico não pode ser socialista. Há para isto uma razão de ordem doutrinaria. É que nenhuma divisa doutrinária séria e nítida existe entre o socialismo e o comunismo. E uma razão disciplinar: na Encíclica "Quadragésimo Anno", o Sumo Pontífice Pio XI declarou que socialismo e Catolicismo são coisas incompatíveis; e condenou não somente a doutrina socialista, mas a própria palavra "socialismo".
Agora, o Congresso do Partido Socialista, reunido na Itália, vem provar claramente até que ponto foi acertada a atitude do grande Pio XI.
O Partido Socialista italiano - um dos três grandes partidos que compõem a coligação governamental na Itália - está dividido em duas correntes uma das quais deseja uma aproximação com os comunistas, e a outra pelo contrário um alheamento.
Na primeira sessão do Congresso, presentes os delegados socialistas de toda Itália, alguns milhares ao todo, e representantes dos Partidos Socialistas de quase todas as nações européias, sobe a tribuna o Sr. Pietro Nenni, que por seu alto cargo no governo italiano - ele é vice presidente do Conselho de Ministros - e por sua imensa influência no Partido, é autenticamente uma das figuras mais representativas do socialismo na península.
O orador se propõe abordar o tema das relações entre socialistas e comunistas, e opta claramente pela colaboração com os sovietes. E que razão dá? O que é o socialismo, na palavra deste porta-voz sem dúvida autorizado? Que "socialistas e comunistas visam os mesmos fins, pelos mesmos métodos". Que "socialismo deve continuar a ser um partido de classe marxista, repelindo todo reformismo, todo emburguesamento". Foi o que nos informou o telégrafo.
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Não sabemos o que decidirá o Congresso sobre a colaboração entre socialistas e comunistas. A questão não é só doutrinária. Entre grupos de pensamentos muito afim, razões de ordem tática podem por vezes desaconselhar qualquer colaboração ao menos... pública.
Uma coisa, porém, é positiva. Qualquer que seja [o] resultado da votação, o Sr. Pietro Nenni, o porta-voz mais autorizado do Partido, o seu mais alto representante nas funções governamentais, pensa como ficou dito. E o Partido não desautorará seu pensamento. Qualquer que seja a moção votada, o Sr. Pietro Nenni continuará dentro do partido, e seu pensamento continuará a ter um lugar ao sol, ao lado quiçá de outras tendências, dentro das fileiras socialistas.
É possível que um rótulo contenha um mais terrível equívoco, e que seja racional e inteligente confiar em um partido assim?
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Não foi o único ensinamento que nos deu o Congresso do Partido Socialista.
Também no discurso do Sr. Harold Laski, se encontra uma afirmação preciosa. O famoso político e professor britânico, ou antes semi-britânico, depois de externar seus amores idílicos a URSS teve esta tirada: "Reconhecemos que a Revolução Russa de 1917 é o maior e mais belo de todos os acontecimentos registrados na Europa depois da Revolução Francesa".
Deixemos de lado o que pode ter de surpreendente o elogio de um movimento cheio de crueldades monstruosas, como a Revolução de 1917; o massacre de Nicolau II e sua família em Ekaterinburg, o fuzilamento de numerosos grão-duques cujos corpos foram depois incinerados em uma floresta, tudo isto é para o Sr. Laski coisa sem peso, e que não impede que a Revolução de 1917 tenha sido o mais belo acontecimento da história européia.
Com certeza o Sr. Laski, tão indiferente ao sangue Romanov [e] dos monarquistas russos, se eriça todo e sente suas entranhas se derreterem de horror e compaixão, quando pensa nas vítimas da Inquisição. Deixemos de lado esta contradição e volvamos os olhos ao aspecto doutrinário da questão.
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Por que motivo o Sr. Laski vê tanta beleza nas duas Revoluções, a Francesa e a de 1917? O que há de comum entre elas, para que possam ser postas nesta mesma linha, quase como etapas de um mesmo caminho, como luzes de uma mesma girândola?
Não é preciso ser gênio para perceber. Ambas destronaram reis, subverteram governos, destruíram tradições, arruinaram elites. Ambas perseguiram a Igreja e nesta perseguição foram ambas igualmente ferozes. O princípio fundamental de ambas foi este mesmo ódio a qualquer desigualdade, a qualquer autoridade, cujo grito de guerra bem poderia ser "non serviam" de Lúcifer. A Revolução de 1917 fez contra a burguesia no terreno econômico, o que a Revolução Francesa fez contra a nobreza no terreno político. A Revolução de 1917 é o extravasamento da Revolução Francesa no terreno político para o econômico social.
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Para nós, católicos, nada disto deveria ser novo. Leão XIII na famosa Encíclica "Parvenu à la Vingt-Cinquiéme Année", já estabeleceu, com uma segurança de vista sem par, o nexo profundo entre estas três explosões diabólicas onde cada uma gerou a outra: a pseudo Reforma Protestante, a Revolução Francesa e o Comunismo.
Disto tudo deveríamos ter conhecimento. Mas infelizmente não é raro ver compêndios de História Geral, escrito por católicos ou adotados em colégios dirigidos por católicos em que a Revolução Francesa faz o papel de uma espécie de segunda Redenção do gênero humano, sem nexo nenhum com o protestantismo nem com o comunismo.