À medida que se desenrolam na Itália as operações
militares, vai criando vulto o perigo em que se encontra a Capital da
Cristandade, residência do Vigário de Nosso Senhor Jesus Cristo. E, ao mesmo tempo,
a consciência católica, justamente alarmada, não pode deixar de manifestar toda
a sua inquietação, ao antever as conseqüências catastróficas que o sítio de
Roma, cada vez mais iminente, pode acarretar.
Em uma de suas últimas alocuções o Santo Padre lembrou
muito bem que, por motivos religiosos e culturais, houve meios de poupar Cairo e Atenas, metrópoles muçulmana uma e cismática outra, uma e outra
famosas pelo valor dos monumentos culturais que contêm, e pelo papel que representaram
em toda a História da humanidade. O que se conseguiu para o Cairo, para Atenas,
"a fortiori"
se deveria conseguir para Roma que, do ponto de vista essencial, que é o
religioso, excede infinitamente a qualquer daquelas cidades, ou antes é a única
que vale, porque só ela é sede do Vigário de Jesus Cristo, e do ponto de vista
artístico e cultural não tem outra que se lhe avantaje na terra.
* * *
Causa pasmo a atitude que as potências neutras vêm
mantendo neste assunto. Por que não tomam a iniciativa de se reunirem em
conferência internacional, a fim de estudar um alvitre prático, a ser proposto
a ambos os beligerantes? Sua primeira obrigação consistiria em protestar
perante Deus e os homens contra a injusta e criminosa ocupação de Roma pelas
tropas nazistas. Baldo este protesto que dignificaria a própria humanidade,
nesta hora de trevas e de confusão, e verificada perante o mundo inteiro a
ignominiosa recusa germânica de se exclausurar dos
tesouros onde covardemente se refugiaram os soldados do Reich,
seria preciso iniciar "pourparlers" [conversações] para obter uma solução
qualquer que poupasse Roma. Em artigo anterior, sugerimos a idéia de se
converter a Cidade Eterna em território neutro, sob a administração do Soberano
Pontífice no que dissesse
respeito à vida civil, e sob a salvaguarda de tropas internacionais, suíças de
preferência. Os embaixadores das potências beligerantes e neutras, acreditados
junto ao Vaticano e residentes em Roma, poderiam certificar a plena execução
das cláusulas da convenção que neste sentido se fizesse. Cogitou-se disto nos
países neutros? Sim? E por que não vingou o alvitre? Não? E por que não? Qual a
inviabilidade, a priori,
desse plano? E que meios haveria de substituir esse plano por outro? A opinião
católica deveria estar inteirada do que fazem nessa hora os neutros, e gostaria
de saber se, pelo menos, fazem ou pensam em fazer qualquer coisa. Mas todos
parecem dormir o sono pesado dos Apóstolos no Horto das Oliveiras. Alguns deles
- Franco, por exemplo, para não
citar outros - ainda há pouco procuravam enfeitar-se com os louros de cruzados.
Cruzados apenas "intra muros"? Pouco se lhes dá da
segurança do Vigário de Jesus Cristo? Sempre consideramos suspeita e equívoca a
"neutralidade" do general Franco, de fato, um germanófilo
evidente. Pelo menos agora, de tão inglória neutralidade poderia ele tirar um
fruto glorioso: seria a mediação espanhola em favor do Papado. Conhecemos a
nação espanhola, sua Fé, sua dedicação, o calor com que sempre acorreu em
defesa da Igreja. Se a Espanha não se move, a
culpa não é, não pode ser do povo espanhol. E a Suíça, onde há tantos católicos? E Portugal, a nação fidelíssima? E a Suécia? Por que não se movem?
* * *
Ademais, não é apenas a eminência do sítio de Roma
que nos preocupa. Ocupada a cidade pelos aliados, a situação do Sumo Pontífice
seria de toda a segurança, uma vez que certamente seria tratado com o maior
respeito. Mas, durante as últimas horas da ocupação germânica, por entre os
horrores de um cerco que talvez seja prolongado, quantos crimes horríveis pode
tentar algum aventureiro, ou algum nazista sob o vil disfarce de aventureiro!
Não nos iludamos, pois. A situação do Soberano Pontífice seria das mais
trágicas, com sua cidade episcopal bombardeada por de fora, e com toda a vida
civil abandonada à maior desordem. A essa altura, o quadro já se torna por
demais negro, e preferimos não prosseguir.
Entretanto, deve haver, por força, alguma solução
possível. As palavras sumamente fidedignas do Santo Padre o dizem de modo
bastante claro. O empenho com que, dos Estados Unidos, do Canadá, do Brasil, da Irlanda, de outros lugares ainda, partem brados de alarme pela
situação de Roma, prova bem que algo se pode fazer, se deve fazer, há de ser
feito por força, já que o Santo Padre é, depois do Santíssimo Sacramento, o que
de mais sagrado há sobre a terra, e nós não podemos conformar com a idéia de
que algo lhe possa suceder.
É preciso orar, orar em união com a oração oficial
da Santa Igreja, nas preces litúrgicas, orar
ininterruptamente em particular, manter longos colóquios de ardente súplica aos
pés de Nosso Senhor Sacramentado, recorrer com fervor a invencível arma do
Santo Rosário, é preciso que nossa oração chegue ao trono de Deus, juntamente
com nossas mortificações, é preciso que uma imensa
cruzada de orações de Norte a Sul do País sacuda o Brasil católico, para que
como um só homem ele peça e acabe por obter de Deus, Nosso Senhor, a graça da incolumidade do Soberano Pontífice.
Mas, advertiu Dante Alighieri
querer rezar e ser atendido sem recorrer à intercessão de Nossa Senhora é voar
sem asas. Não podemos esperar qualquer graça sem que Nossa Senhora rogue por
nós. Só Ela pode tudo. Sem Ela, o Céu inteiro nada conseguiria.
Temos a dois passos de nós o Santuário Nacional de
Nossa Senhora Aparecida. Agora, mais do que nunca, é para Aparecida que se devem
voltar os olhos de todos os brasileiros, e nós paulistas, que temos a fortuna
de ter junto de nós a Rainha do Céu, devemos ir em peregrinação aos pés de seu
Trono, para lhe pedir pelo Santo Padre. É este o grande dever do momento.