A possível vinda do Santo Padre ao Brasil, noticiada por um telegrama concernente à viagem de Mons.
Spellman, Arcebispo de New York, a Roma,
já foi desmentida de modo categórico. Assim, ao que parece, não teríamos mais
que fazer reflexões sobre este fato.
Tal, entretanto, não se dá. A magnitude do assunto,
bem como a natureza de alguns dos comentários que ele provocou, nos forçam a
consagrar a tão relevante tema alguns tópicos desta secção.
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Antes de tudo, é preciso dizer que a notícia, que
desde o início se apresentou como um simples "consta", impreciso e
revestido de quase todas as características de um boato, causou não obstante
uma sensação enorme, e encontrou muitos espíritos crédulos que lhe deram
guarida. É que a idéia de termos entre nós o Vigário de Nosso Senhor Jesus
Cristo, a personificação daquela Santa Igreja Católica que é a alma do Brasil,
de tal maneira fez vibrar nossos corações filiais, que constituía uma
verdadeira luta interior o desprender-se o espírito dessa hipótese fascinante.
Se algum dia, em horas de provação ou de glória, pouco importa, o Santo Padre
viesse ter ao Brasil, o mundo veria o que é o fervor de nossa entusiástica e
incondicional adesão à Cátedra infalível de São Pedro. A maior das cidades do
Brasil, o Rio de Janeiro, seria pequeno como uma aldeia, para conter os fiéis que
ali fossem acolher o Santo Padre. O Brasil inteiro ali figuraria.
Ao lado de São Paulo, que para lá iria em
massa, encontraríamos multidões gaúchas e amazonenses, mineiros, goianos ou
catarinenses, de todos os quadrantes enfim, não faltando os nossos cablocos vindos a pé não sabemos de que rincões perdidos,
todos para se ajoelharem ante o Santo Padre e receber humildes e respeitosos
sua benção.
O brasileiro não é católico de um jeito qualquer,
mas católico como se deve ser. E ele demonstraria ao mundo inteiro que, para
ele, Cristo só está onde está a Igreja, e a Igreja só está onde está o Papa,
fora da obediência ao qual não há salvação.
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É, pois, interpretando o sentimento unânime do
Brasil, que o “Legionário” protesta contra meia dúzia de articulistas, se
tanto, que, em linguagem velada na qual alguns termos almiscarados deixavam
claramente transparecer a ironia, se permitiram comentários menos respeitosos
sobre o assunto.
Um, por exemplo, depois de comentários pretensamente espirituosos sobre a vinda de D. João VI ao Brasil, dizia
que o Santo Padre estava no mesmo caso. Não nos interessa discutir aqui se D.
João VI fez bem, ou não, de vir ao Brasil. Seria antes o caso de perguntar se o
articulista, posto na situação de D. João VI, teria ido, de canivete em punho,
enfrentar as forças de Junot. Uma coisa, porém, é indiscutível. É que Pio XI e Pio XII, vivendo em território encravado em plena zona dominada
pelo "eixo" mantiveram uma independência política tão corajosa, que
se tornaram ambos alvos da admiração entusiástica do mundo inteiro. O risinho chasqueado de nosso jornalista não lograria rasgar
essa página da História da Igreja.
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Outro, aventou que o Brasil auferia com isto uma
grande vantagem: maior número de chapéus no Sacro Colégio.
Amando e venerando filialmente
a Santa Sé, o Brasil presa certamente no mais alto grau todas as honras que ela
nos queira conferir. Mas somos filhos confiantes, não queremos estas honras,
senão quando a Santa Sé espontaneamente no-las quiser dar, atendendo à
conveniência geral do governo da Igreja. Foi para vantagem da Igreja Universal
que se criou o Sacro Colégio, e não para a vantagem exclusiva do Brasil. O Santo Padre seria aqui recebido de modo insuperavelmente
afetuoso e filial sem que pela mente nos passasse nem de leve qualquer idéia de
outra compensação que não a sua benção de Vigário de Cristo. Recebe-lo entre
nós não seria favor que exigisse recompensa; seria recompensa que nos obrigaria
a um devotamento ainda maior.
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Outro jornalista lembrou os Papas de Avignon. Saberá o articulista que a existência de um
refúgio para os Papas de Avignon representava, não um
meio de escravização, mas uma vantagem para a independência da Santa Sé? Saberá
ele que os Papas de Avignon prestaram à Igreja
grandes serviços e um deles até é venerado pela Igreja como bem-aventurado?
Os Papas se demoraram demais em Avignon, dir-se-á. É fato. Mas o mal não estava em que eles ali
tivessem um território e para que lá tivessem ido, o mal esteve em que lá se
deixassem ficar. Um pai vai visitar um filho, e lá se demora mais do que seria
necessário. Qual o remédio? Arrasar a casa do filho?