O LEGIONÁRIO
sempre timbrou em se manter inteiramente à margem das dissidências e
rivalidades políticas de caráter meramente temporal. Não podemos, entretanto,
considerar o afundamento dos navios brasileiros, em nossas próprias águas
territoriais como acontecimento a respeito do qual devamos manter silêncio. Com
efeito, a reação que o fato ocasionou entre nós transcende de muito os limites
das dissidências temporais, para indicar claramente que estamos em presença de
uma situação fundamente relacionada com a própria integridade e soberania do
País. E, como o patriotismo é uma virtude, como, por outro lado, o católico tem
para a prática de todas as virtudes recursos sobrenaturais que lhe permite esmerar-se
nelas até à perfeição, é bem este o momento dos católicos mostrarem que
maravilhoso viço tem a flor do patriotismo quando brota das raízes
sobrenaturais da fé. Em segundo lugar é preciso tomar em conta que o adversário
que bate a nossas portas é um adversário não só do Brasil, mas também da
Igreja. E que, portanto, não é só o amor à Pátria, mas ainda o que devemos à
Igreja que nos deve levar a uma atitude de franca repulsa à agressão nazista.
É chegado o
momento de dizermos duas palavras a alguns leitores que entendiam que
preocupando-se sobretudo com os progressos que fazia no mundo a devastação
totalitária desertávamos do campo dos problemas religiosos estritamente
nacionais para considerarmos os interesses da Igreja fora do Brasil. Combatemos
sempre com todas as nossas forças os hereges que presentemente desenvolvem no
Brasil ação mais pública e decidida e os demais fatores de corrupção social.
Tudo isso não obstante, timbramos sempre em afirmar que esses adversários
tinham importância secundária à vista da iminência do problema nazista. Hoje,
que bate às nossas portas esse perigo ameaçando superar em gravidade todos os
problemas religiosos do País pelo risco eminentíssimo em que põe a fé, é o caso
de perguntarmos a muitos míopes, que nos chamavam visionários simplesmente
porque víamos mais longe do que eles, se não tínhamos razão.
Sustentamos
sempre que o nazismo é um adversário que tem,
além de processos de proselitismo incomparavelmente mais perfeitos do que
qualquer outra heresia contemporânea, canhões, submarinos, aviões, etc. De
sorte que, ainda que consideradas as coisas apenas deste ponto de vista, o
problema nazista se delineava mais grave do que qualquer outro.
Será que a
evidência dessas razões só persuadirá alguns leitores quando orquestrada com o
sibilar de uma fuzilaria cerrada? Precisarão levar um tiro para compreender?
Oh, a eterna mania dos
problemas “exclusivamente nacionais”! Até quando se compreenderá que não temos,
no momento, problema nacional mais grave do que este que está de fora de nossas
fronteiras?
Agora, porém,
cabe mais uma palavra.
Os que
combatemos com todas as veras da alma o nazismo, devemos combater também,
energicamente, intransigentemente, inflexivelmente, o comunismo.
O comunismo não poderia prestar ao
nazismo melhor serviço do que iniciar novamente entre nós uma fermentação
ideológica sobretudo se ela se fizer sob a forma de cavilosa infiltração em
nossas manifestações cívicas. Com efeito, só há um motivo, ou antes, um
pretexto para amortecer a vigilância de nosso patriotismo contra o perigo
nazista: é o perigo comunista. Assim, favorecer direta ou indiretamente o
comunismo, fechar os olhos a sua infiltração, pactuar com ela na enganosa
esperança de se desembaraçar dele no momento da vitória, tudo isto é erro, erro
grave, erro crasso.
Entre o
comunismo e o nazismo não se trata, para nós católicos, de escolher. O católico
que discute qual deles é menos mau desserve sua Fé, e injúria o Brasil. Essa
discussão deve ser proscrita de nossos debates como crime de alta traição a Fé.
Nosso dever consiste em combater a ambos indistintamente, promiscuamente, e
energicamente.
* * *
Efetivamente,
injuria o Brasil quem supõe que a opinião brasileira chegou a um tal estado de
desarticulação e de corrupção que para nós se abrem estes dois tenebrosos
caminhos. Que raça de desfibrados seria essa nossa, se depois de manifestações
empolgantes como a de domingo passado, em que 300.000 paulistas proclamaram a
devoção ardentíssima do Brasil a Nossa Senhora Aparecida, devêssemos deliberar
fleumaticamente sobre qual dos dois verdugos - o vermelho ou o pardo - deveria
se incumbir da demolição de nossas tradições e instituições católicas!
Que piedade,
que fibra, que virilidade seria essa nossa? Será que se deve admitir que essa
imensa multidão mentiu aos homens e a Deus, proclamando diante de Deus e dos
homens que é apaixonadamente católica?
Longe de nós
tal injúria a nosso povo!
* * *
Para nós a
opção é só esta: Cristo-Rei ou o anticristo.
E para nós, anticristo tanto é o nazismo quanto o
comunismo.
Assim, nossa
luta contra o nazismo nunca se separará de uma atenção ferozmente vigilante
contra o comunismo. E nossa luta contra o comunismo nunca se dissociará de
vigilância feroz contra o nazismo. Admitir simplesmente que qualquer dessas
duas monstruosidades deva ser abraçada pelo Brasil católico como meio de evitar
a outra, já é capitular, já é fugir, já é entregar-se, e isto precisamente
quando todas as cerimônias preparatórias do Congresso fazem prever que este
será uma afirmação meridianamente radiosa de que o
Brasil só quer trilhar as estradas que conduzem a Cristo-Rei,
e que no coração de seus filhos há bastante amor, em suas inteligências
bastante Fé, e em seus braços bastante músculo, para não seguir outro caminho
senão o que livremente querem trilhar.
* * *
Cumpre
acrescentar que, em matéria de anti-nazismo e
anticomunismo, devemos distinguir claramente duas posições extremas, ambas
erradas. Evitemos um otimismo imbecil que abre praticamente nossa terra a estes
terríveis adversários gerando em nós a convicção de que eles não apresentam
perigo, e dotando-os assim de uma invejável impunidade. E evitemos também o
pânico que desarticula qualquer resistência e torna ineficaz qualquer luta.
Tanto o nazismo
quanto o comunismo constituem perigo sobretudo interno. Ora o golpe de 10 de
Novembro foi feito precisamente para dotar as autoridades de todos os meios não
só para reprimir como ainda para evitar qualquer propaganda em sentido
contrário a nossas instituições e tradições cristãs. Não há quem negue em todos
os quadrantes da opinião pública ao Presidente Getúlio Vargas uma grande habilidade
política. Não é, pois, possível que as coisas tenham tomado entre nós um
aspecto que justifique qualquer espécie de pânico. Vigilância, sim. Pânico
nunca!