Estranhamos vivamente que a Agência telegráfica “Reuters” órgão habitual da propaganda Britânica, tenha tido
a original idéia de consagrar algumas palavras comovidas à memória do Sr. Heydrich, tirano da Checoslováquia, recentemente assassinado.
Aquela Agência reconhece que o Sr. Heydrich foi o organizador dos campos de concentração, no
que se mostrou um homem de índole meticulosamente cruel, que não se dispensou um só vez do encargo de sujeitar à dureza das
leis nazistas as pessoas perseguidas pelo III Reich. Isto não obstante, e se
bem que chegue a qualificar o Sr. Heydrich de
“monstro”, aquela agência encontrou meios de adiantar que ele possuía umas
tantas qualidades encantadoras, através de cuja descrição meticulosa se deduz
que se o Sr. Heydrich era um demônio, certamente não
era “um demônio tão feio quanto o pintam”.
* * *
No momento em que é preciso organizar contra o
nazismo um movimento impetuoso e forte, não vem a propósito assinalar certas
particularidades de caráter do Sr. Heydrich, que
podem por em suspenso o espírito dos elementos fracos e vacilantes, e com isto
determinar, na ofensiva anti-nazista, irresoluções lamentáveis. De mais a mais, esta apreciação
do caráter do Sr. Heydrich contraria uma lei de
psicologia fundamental: há entre os defeitos e qualidades de todas as pessoas
uma certa solidariedade moral, pelo que não é possível que em uma mesma pessoa
coexistam defeitos “monstruosos”, com qualidades aprimoradas. Ou são irreais
aqueles, ou são fictícias estas. Não há por onde fugir. E por isto, a
apreciação feita sobre a personalidade do Sr. Heydrich
pela agência “Reuters”, se foi bem traduzida por nossa
impressa, não teve a argúcia nem a precisão psicológica necessária.
* * *
A imprensa continua, como é natural, a se preocupar
com a situação da França, e muitas notícias ou comentários fazem entrever que o
governo nazista deseja obter da França concessões ainda maiores do que as que
presentemente possui, deseja alijar do poder o Sr. Laval, a fim de aí colocar o Sr. Deriot.
Essas notícias pressupõem que o Sr. Pierre Laval esteja firmemente
resolvido a só caminhar no sentido da colaboração até certo limite, além do
qual absolutamente não iria. Em outros termos o Sr. Laval
seria um idealista fervorosamente apegado à grandeza da França, um pouco
ingênuo talvez quanto à colaboração com a Alemanha, mas incapaz de sacrificar a
interesses pessoais os principais elementos de defesa e resistência da França.
Ora, o Sr. Laval não
conhece limites como este. Colaboracionista franco e declarado, ele sempre foi
mero instrumento passivo nas mãos do Sr. Hitler. E irá tão longe quanto o Sr.
Hitler quiser... exceto se perceber que as probabilidades de sucesso do Sr.
Hitler diminuem.
Devemos, pois, estar bem certos de que se o Sr. Laval se recusar a servir o Sr. Hitler, será este um sinal
bastante sintomático da decadência do poderio nazista.
Neste último caso, ainda haveremos de ver certa imprensa
demostrar – ou melhor, procurar demonstrar - que o Sr. Laval
e o Sr. Pétain foram os maiores heróis da França em
nossos dias.
* * *
Continuam, na Europa, os morticínios determinados
pelo domínio nazista em países ocupados.
Isto mostra claramente a repulsa da opinião
européia ao nazismo, e prova à evidência que o Sr. Hitler, além de vencer uma
luta militar que se lhe torna cada vez mais penosa, ainda deverá enfrentar uma
luta psicológica de resultados cada vez mais duvidosos. Assim, as possibilidades
de êxito parecem minguar cada vez mais nas mãos do truculento ditador pagão.