Legionário, N.º 455, 1º de junho de 1941

7 DIAS EM REVISTA

No último número do “Legionário”, mostramos a extensão do apoio que o governo de Vichy vem prestando ao III Reich, e demos como prova deste fato a licença para pousar em território sírio, dada pelas autoridades francesas, a aviões de guerra alemães. A esse propósito, acentuamos que a inofensiva “licença para pousar” deveria envolver, provavelmente, o fornecimento de gasolina, etc., às aeronaves nazistas.

Infelizmente - pois que preferiríamos ter errado - nossas asserções receberam uma claríssima confirmação da parte do bravo Cel. Collet. Esse brioso militar, a cujo comando estavam confiadas importantes unidades de combate, transpôs as fronteiras sírias, integrando-se no movimento da Gal. de Gaulle, por se sentir ludibriado por Vichy. Nas declarações que a esse propósito fez à imprensa, o Cel. Collet asseverou que, de fato, “os aviões alemães pousaram nos aeródromos franceses e se reabasteceram de essence e munições. Nos dias seguintes trens franceses conduziram a Tellkotchek armamentos dos depósitos franceses os quais foram entregues pelos alemães ao governo de Bagdá para sustentar a luta dos rebeldes iraquianos contra a dominação inglesa.”

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Assim, o depoimento de um distinto oficial francês, que com sua altiva atitude sacrificou sua carreira e as mais preciosas vantagens pessoais, assevera que o governo de Vichy, não contente de fornecer gasolina a aviões militares nazistas, ainda enviou trens inteiros cheios de armas aos rebeldes iraquianos que sustentavam contra a Inglaterra uma luta na qual não percebemos os interesses que a França pode ter.

Comentando o fato, lembrou o Cel. Collet que Pétain declarara a 3 de maio: “a honra nos obriga a nada empreender contra nossos antigos aliados”, não obstante o que “dias depois esqueceu tão facilmente este ponto de honra”.

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O que é bem certo é que a França ocupada se encontra em uma situação muito crítica. E que o público francês absolutamente não adota a política do governo de Vichy.

O que se deve pensar da vida que leva os parisienses de hoje? Como se conduz, sob a dominação nazista, a Cidade Luz?

A este propósito prestou um precioso depoimento o Tenente Coronel Afonso de Carvalho. Este oficial que é um escritor de mérito, fazendo uma crônica muito viva acerca de sua estada em Paris, assim escreveu suas impressões em recente edição do “Est. S. Paulo”: “Paris está abandonada. Cidade morta, abro a janela do meu apartamento e lá no alto da coluna no meio da praça está a figura de Napoleão. Um Napoleão olímpico, de cabeça coroada, e cuja majestade se torna terrivelmente soturna e trágica, na praça vazia, completamente vazia e silenciosa”. E linhas depois acrescenta que “a solidão da praça Vandome tem algo de melodramático. Fico a olhar cismadoramente esse lugar histórico de tanto movimento, de tanta elegância, de tanta alacridade[1]. E ninguém nas ruas, ninguém! Sou sem querer espectador solitário dessa grandeza silenciosa que esmaga pela sua tristeza e solidão. O Rei da Baviera não se sentiria mais solitário em um teatro vazio”.

O hotel em que se alojara o distinto militar, isto é o grande Hotel Ritz tem suas mesas “quase todas tomadas por oficiais alemães”, à hora em que vai almoçar. Onde estão os turistas?

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Impressões de momento? Não. Nosso informante passeou por Paris. Diz ele que “logo depois de jantar, saímos pela cidade. Sempre a mesma impressão tudo deserto”. Na Rue de la Paix “não se encontra nenhuma pessoa”. Pela manhã do dia seguinte, novo passeio por Paris, onde se nota “o mesmo espetáculo de desolação. Apenas alguns populares nas avenidas e praças imensas. E soldados aos grupos, passeando pelas calçadas.”

Brutalidade dos ocupantes? Receio de incidentes desagradáveis? Parece que nada disto explica tanta solidão e tanto abandono, já que o Tenente Coronel Afonso de Carvalho timbra em mostrar a delicadeza com que se conduzem as forças teutônicas para com a grande metrópole e seus habitantes.

Então o que? Brio de vencidos!

 



[1] Alegria, vivacidade