Entrando na guerra ao lado da Alemanha, a Itália confirmou todas as
previsões desta folha. Se há um ano atrás, a França e a Inglaterra constituíam com a
Rússia uma tríplice aliança, entente contra a qual se erguiam
as forças coligadas do eixo Roma-Berlim, e a
propaganda fascista denunciava ao mundo inteiro as democracias como bolchevisantes por sua escandalosa ligação com os sovietes.
Nessa ocasião, o “Legionário” já sustentava a plena inconstância da luta entre
o totalitarismo da direita e o da esquerda. Segundo as previsões desta folha,
dia viria em que os fatos demonstrariam esta tese, e o mundo ainda assistiria a
aliança de uma e outra ideologia. Veio, finalmente, o pacto Ribbentrop-Stalin, e de lá para cá nosso ponto de vista tem recebido da
realidade a mais plena confirmação.
Se disséssemos há um ano atrás que, firmado um
pacto como o que atualmente existe entre a Rússia e a Alemanha, nenhuma trinca
se observaria no eixo Roma-Berlim, teríamos recebidos de certos elementos críticas
furiosas, segundo as quais estaríamos caluniando o fascismo. Hoje, que o fato
se deu, alguns elementos que nos chamavam caluniadores, justificam a atitude do
governo fascista...
* * *
Nesta época
de nacionalismos exacerbados, o “Legionário”
timbra em se conservar católico, isto é universal no mais amplo sentido desta
palavra. Exatamente por isto, timbra em mostrar que nenhum preconceito racista,
isto é pró ou contra certa nação, ou certa raça, anima seus comentários.
Indiferente às questões políticas de interesse meramente temporal, preocupado
exclusivamente com a exaltação da Santa Madre Igreja, que é seu anseio de todos os momentos, o “Legionário”
jamais consentiria em ser contrário a qualquer povo considerado como tal.
Lamentando os erros em que certos elementos de certo povo possam incidir, e
qual o povo hoje em dia que não tenha “certos elementos” imersos em erros
profundos, o “Legionário” não pode deixar de se lembrar de que Deus é o Pai das
misericórdias que, castigando embora os povos, chama-os entretanto para o
caminho da penitência que os levará ao céu. Não há povos intrinsecamente bons
ou intrinsecamente maus. Desagradar-se de uma raça por ser ela especialmente,
irremediavelmente má, é entrar em colisão com a doutrina católica e pactuar com
o ultra-nacionalismo moderno.
* * *
Por aí se compreende como andam errados os que
pensam que o “Legionário” é inimigo deste ou daquele povo. Acusados de anti-germânicos porque somos inimigos do nazismo, de anti-italianos porque denunciamos a solidariedade doutrinária
entre o fascismo e o nazismo, de anti-russos porque
nos colocamos contra a expansão comunista, do lado da Polônia e da Finlândia;
também fomos tidos em outros arraiais por anti-franceses,
e isto em duas ocasiões: quando esta folha moveu, há anos atrás, vigorosa
campanha contra o então chefe do governo, Leon Blum e quando demonstrou os erros (...) inomináveis
praticados pelos “homens de Munich”.
Nossa atitude de imparcialidade não poderia ser
compreendida pelos que se deixaram elucidar por um mal compreendido
nacionalismo. Mas a própria diversidade destas críticas reciprocamente as destroi, e estabelece uma flagrante analogia entre nossa
situação e a do Santo Padre Bento XV, acusado pelos alemães de francófilo,
e pelos franceses de germanófilo. Só muito mais tarde
é que a humanidade lhe prestou o tributo de sua justa veneração.
* * *
Honra seja feita, porém, aos católicos estrangeiros
aqui residentes, pois que essas incompreensões foram sempre parciais, e nunca
nos faltaram amigos franceses, alemães ou italianos que tenham sabido
compreender que nunca fomos contrários a seus respectivos países.
Já temos dito mil vezes que não somos anti-alemäes nem anti-franceses.
Hoje queremos repetir que não somos anti-italianos.
Raciocinemos. Ser anti-italiano
é odiar o povo italiano como tal. Odiá-lo como tal é odiá-lo por ser tal, e
isto por ser italiano. Logo, este ódio deveria atingir indistintamente todos os
italianos. Ora, o Santo Padre é italiano, a maioria dos membros do Sacro
Colégio Cardinalício é de italianos, quase toda a Cúria Romana recruta nas fileiras
do Clero italiano seus elementos. Os Núncios de Sua Santidade são quase sempre
italianos, etc., etc. Logo, ser anti-italiano por tal
e como tal seria odiar os elementos que na Hierarquia Católica se encontram
colocados pela Divina Providência nos lugares de maior responsabilidade e
autoridade, e por isto mesmo merecem dos fiéis mais veneração e mais amor.
Como, pois, poderia um católico ser anti-italiano?
* * *
O “Legionário” não é ultra-nacionalista.
Isto não impede, porém, que não consinta que ninguém o exceda em patriotismo. O
ultra-nacionalismo não se deve confundir com o
patriotismo do qual é apenas a caricatura. Ora, se um católico não pode ser anti-italiano e a
fortiori
não o pode ser um católico brasileiro. De fato, são tão visíveis os benefícios
que nossa Pátria auferiu com a imigração italiana e tão íntimos os laços
culturais que, ligando-nos à latinidade, nos ligam
também à Itália, que seria uma aberração um brasileiro anti-italiano.
A verdade é a verdade, e deve ser dita como ela é:
a Alemanha nazista está aliada à
Rússia soviética, e a Itália fascista está aliada à
Alemanha nazista. Deste fato, surpreendente para muitos, tirem todas as
conseqüências competentes. Isto, entretanto, não importa em que consintamos que
nos chamem de inimigo de um povo em cujo território quis a Providência engastar
a jóia mais preciosa que existe neste mundo: a Santa Sé.
* * *
A este propósito, seja-nos lícito acentuar que nossa
oposição ao ultra-nacionalismo vai mais longe.
Aproveitamos aqui a oportunidade para, em nome dessa hostilidade que é santa,
repudiar os ataques injustos que certos ultra-nacionalistas
brasileiros - que felizmente são poucos - tem dirigido ao Clero estrangeiro
aqui residente. Este Clero - no qual figuram, aliás, de modo quantitativo e
qualitativamente tão apreciável, elementos italianos - tem prestado a nosso
país os mais inestimáveis benefícios espirituais e até temporais, e somente uma
ingratidão criminosa poderia apontar nele um instrumento de desagregação de
nossa Pátria.
O ultra-nacionalismo gera
toda espécie de desequilíbrios. E, enquanto leva certos elementos a identificar
sua pátria de origem com os homens ou regimes ali existentes, leva certos
brasileiros a um chauvinismo que seria estúpido se não fosse pior do que isto:
criminoso.
* * *
Este ultra-nacionalismo é, aliás, fonte de outros erros também.
Entre eles, se aponta a irritação que sentem certos elementos por ser recrutada
entre italianos a maioria dos membros do Sacro Colégio, e terem sido sempre
italianos os últimos Papas.
Só mesmo os desvarios do ultra-nacionalismo
poderiam levar pessoas bem intencionadas a formular considerações desta ordem.
Basta olhar para a atual situação da Santa Sé na
Itália para se compreender de modo inexcedivelmente claro a alta sabedoria com
que anda a Igreja ao proceder por esta forma. E basta isto, também, para fazer
compreender claramente os perigos de um ultra-nacionalismo
que, apresentando-se a princípio com a roupagem sedutora de um patriotismo
ardente, acaba por se transformar em um câncer que corroe
nas suas mais íntimas fibras os laços sagrados que vinculam todos os povos da
terra ao indefectível trono do Pontífice Romano.