Legionário,
N° 360, 6 de agosto de 1939
7 Dias em Revista
Insistimos, em nosso último número, sobre uma verdade
que o visceral liberalismo de nossa época nos leva, freqüentemente, a esquecer.
Como disse o Santo Padre Pio XI na sua magistral encíclica “Mortalium
Animos” é um erro crasso supor-se que existe o
Cristianismo autêntico fora da Igreja Católica, e que é possível uma cooperação
entre católicos e protestantes para fins de interesse comum, com base no
Cristianismo.
Efetivamente, o Cristianismo existente no
protestantismo não é, como diz Pio XI, quase sempre senão “o perfume de uma
coisa que já morreu”.
Por isto é que vemos dia a dia o protestantismo
assumir um feitio mais diverso do Catolicismo, isto é, mais nitidamente
anti-cristão.
Exemplo bem vivo disto é o caso relatado por um
recente telegrama de Londres. Quatrocentos e sessenta moços ingleses se
recusaram a servir no Exército, sob a alegação de que a doutrina de Jesus
Cristo proíbe a um homem de tomar armas ainda para defender sua Pátria. Os jovens
afirmaram que é a seita dos “Christ Adelphians”, uma igreja protestante que os levou a ter esta
atitude. (...)
* * *
Nessa resolução dos tribunais ingleses há, sem dúvida,
um grave erro. Mas esse erro é o exagero de uma coisa boa em si.
Realmente, revelam os tribunais ingleses com esse
gesto um sumo respeito pela consciência religiosa. E ninguém poderia deixar de
louvar esse respeito se ele não tivesse sido viciado por um liberalismo
religioso que o levou a admitir como digno de reverência um grupo de crentes de
uma igreja manifestamente divorciada do bom senso o mais elementar.
Entretanto, lembremos, a este propósito, que esta
atitude dos tribunais ingleses mostra até que ponto a magistratura inglesa, uma
das mais famosas do mundo, está longe de admitir como possível que Sacerdotes
sejam privados de seu direito de cidadania por não prestarem serviço militar.
É este, no entanto, o caso em que se encontra o
Brasil. E note-se que os Sacerdotes brasileiros como, aliás, todos os
Sacerdotes católicos do mundo, não se recusam ao serviço militar especializado
para Sacerdotes, que consiste em lhes dar treinamento necessário para exercerem
em pleno campo de batalha seu sublime ofício de capelães. Não querem, pois, os
Sacerdotes católicos deixar de cooperar na defesa da pátria. O que eles desejam
é simplesmente o direito de cooperar dentro de seu sagrado ministério,
expondo-se com insuperável risco de suas vidas sob a metralha e o canhão, mas
sempre na qualidade de Ministros de Deus.
Esta consideração faz reavivar-se em nós a esperança
que os dispositivos da Constituição de 34, que admitiam o serviço militar
especializado para os Sacerdotes e Religiosos, ainda seja revigorado pelo atual
Governo.
* * *
Resolvemos abordar este assunto, porquanto o “Diário
de São Paulo” de 14 de junho trouxe um telegrama que não podemos deixar de
tomar em consideração.
Segundo tal notícia, os Sacerdotes que não prestarem
serviço militar especializado não poderão ser funcionários públicos, nem
lecionar em colégios oficializados ou reconhecidos, e não poderão, também,
receber qualquer favor dos governos federal, estadual ou municipal de qualquer
recanto de nosso território.
Consideramos tal notícia como mal intencionada.
* * *
O “Estado de S. Paulo” publicou na semana p.p. um
artigo de seu cronista internacional sobre a “situação política na Espanha”.
Sem entrar na parte propriamente política do artigo,
não podemos deixar de formular nosso desacordo com aquele artigo, no que se
refere a certos aspectos da personalidade do povo espanhol.
Diz ele que o “povo espanhol é religioso, de uma
religiosidade cega e fanática, que pode arrastá-lo aos mais sanguinários
excessos”. E explica que isto se deve “a sete séculos longos de domínio árabe.
Como o árabe, o espanhol é fatalista de um fatalismo essencialmente muçulmano”.
Mais adiante acrescenta que o “espanhol é de uma
crueldade implacável, ao mesmo tempo frio e passional. Tem-se como grande
superior aos demais homens e povos, e acha nos próprios defeitos razões para se
orgulhar. É rebelde a qualquer coação ou influência material ou moral graças a
seu fatalismo. É enfim, e acima de tudo, incapaz de conceber o mais leve
compromisso: quem está deste lado da paliçada é amigo e quem está além dela é
um inimigo que urge suprimir”.
Atrás desta crítica, como não discernir diversos
ataques à Igreja? Como não ver que se insinua aí que o Catolicismo não é senão
um verniz através do qual o islamismo domina a
Espanha? Como não sentir que é a famosa acusação referente à Inquisição, que
está latente em tudo isto?
A História é clara demais para que os brios católicos
e espanhóis, ao mesmo tempo ofendidos por este artigo, se sintam na necessidade
de argumentar.
Na recente revolução, a Espanha conseguiu dar provas
ao mundo de que a raça dos cruzados não morreu e de que, sobretudo, não se
apagou nela a Fé Católica.
Quem quiser ver, em tantos feitos do mais puro
heroísmo católico, influências muçulmanas, não precisa de refutação.