Legionário,  N°. 348, 14 de maio de 1939

 

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Aprovamos sem restrições a resolução do Conselho de Imigração e Colonização, que eliminou, a 22 p.p., qualquer exigência de limite numérico para a entrada de portugueses no Brasil.

Essa medida veio completar a deliberação anterior de nossas autoridades, de permitir aos portugueses - à diferença do que acontece com estrangeiros de outras procedências - que constituam núcleos coloniais em nosso país.

São tão evidentes as vantagens dessa orientação, para a conservação e revigoramento das tradições brasileiras, que dispensam explicação.

Por outro lado, os católicos devem estar tão empenhados na conservação de nossas tradições, que não podem deixar de encarar com simpatia essa resolução.

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A nota mais curiosa do noticiário político da semana passada foi fornecida, sem dúvida, pelos rumores insistentes sobre uma aproximação teuto-russa.

À primeira vista, essa versão tem contra si fortes probabilidades. Dada a campanha espetacular que o nazismo e o comunismo dirigem um contra o outro, seria deveras surpreendente que ambos se reconciliassem um com o outro...

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Os observadores menos superficiais, entretanto, não consideram tão inverossímil essa hipótese.

Em primeiro lugar, nenhuma pessoa medianamente culta poderá negar a íntima afinidade ideológica existente entre o totalitarismo e o comunismo.

Ambos se distinguem  por seus princípios estritamente igualitários. Se, na Rússia, o bolchevismo procurou nivelar todas as classes sociais pela força, Hitler procura fazê-lo pela astúcia. Depois de ter afastado peremptoriamente qualquer possibilidade de restauração monárquica, Hitler prossegue na sua política niveladora, chegando a proibir os funcionários públicos a freqüentarem os círculos aristocráticos por ser o espírito nazista avesso às diferenças de classe. Pequeno indício, entre mil outros, da proletarização da vida social na Alemanha, que é a grande característica da ação social do nazismo.

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Quanto às concepções políticas, são comuns a ambos os regimes, e consistem no surradíssimo mito da soberania popular de Rousseau.

Hitler afirma que, se exerce o governo, deve-o única e exclusivamente à delegação do verdadeiro soberano, que é o povo. Eleito pelo povo, é só do povo que lhe vem todo o poder. E a tal ponto não é ele senão um preposto do povo, que, periodicamente, ele convoca plebiscitos para pedir a aprovação popular. Se a aprovação não lhe for dada, deixará ele o poder...

O regime nazista, se é antiliberal, não é antidemocrático. Pelo contrário, Hitler sustentou em recente discurso que a democracia alemã é muito mais autêntica que a inglesa. (...)

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Restaria a questão religiosa, que parece separar ambos os regimes. O nazismo tem deuses, e o comunismo é ateu.

Entre o ateísmo e o panteísmo, a distância será tão grande? Não demonstra a História que as épocas de maior incredulidade são ao mesmo tempo as de maior superstição?

Aliás, do que vale, como barreira ao ateísmo comunista (que tem tonalidades fortemente panteísta) o panteísmo nazista?

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Quanto à colaboração efetiva de direitas e esquerdas no cenário da política internacional, colaboração que é muito mais do que uma convergência doutrinária, uma verdadeira “entente”, o “Legionário” se tem estendido tanto a este respeito que não deve senão relembrar alguns fatos.

Quando Hitler entrou na Áustria, os comunistas franceses paralisaram as reações, provocando a queda do gabinete por questiúnculas de política interna.

Enquanto isto, o México comunista rompe carinhosamente o cerco econômico em que está a Alemanha, para lhe mandar petróleo e outros artigos de primeira necessidade.

Por outro lado, Hitler se recusa formalmente a apoiar um movimento ucraniano de caráter anticomunista que esteve a pique de explodir. E assim por diante, os indícios se somam uns aos outros, constituindo um conjunto impressionante.

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Nesta semana, é da Rússia que vieram as principais indicações sobre o assunto.

Segundo tudo indica, a Rússia, conservando embora seu caráter comunista, está assumindo ares nacionalistas que lhe dão muita analogia com o nazismo.

Nesta ordem de idéias, um fato expressivo é que a fórmula de juramento do exército russo foi recentemente modificada. Antigamente, o juramento era de defender a causa do proletariado. Há pouco, passou a ser de defender a Rússia. (...)

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Que deduzir de toda essa história?

(...) A Alemanha é nacional-socialista. A Rússia está ficando nacionalista sem deixar de ser comunista.

Pesem-se bem as palavras: entre um “nacionalismo socialista” e um “nacionalismo comunista”, que diferença há?