Legionário, N.º 340, 19 de março de 1939

 

7 DIAS EM REVISTA

Julgamos extremamente melindroso o assunto sobre o qual tratam de legislar no momento nossas altas autoridades educacionais: o ensino particular.

Certamente há, nessa matéria, abusos numerosos e deploráveis a registrar, e ninguém, mais que os católicos, desejaria a cessação de tais erros.

Isto não obstante, é preciso a todo o custo evitar que, para reprimir abusos do ensino particular, se chegue ao monopólio educativo do Estado. Porque esse monopólio é, em matéria educacional, o maior e o mais insuportável dos abusos.

Esperamos, pois, que nada tenham as escolas católicas, quase todas elas de propriedade particular e não do Estado, a sofrer com essa projetada legislação.

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Que nossas apreensões são legítimas, di-lo eloqüentemente a realidade.

Desde o 10 de novembro, há alguns elementos que não cessam de intrigar o governo com 99% dos brasileiros, que são católicos, propondo a aprovação de leis condenadas pela Igreja: divórcio, exame pré-nupcial obrigatório, combate ao celibato etc. Agora, como se tudo isso não bastasse, há quem deseje que a lei qualifique como crime o fato de uma pessoa não trabalhar.

Pela doutrina católica, toda e qualquer pessoa deve exercer uma atividade justa, e não tem o direito de viver no ócio. Mas essa atividade pode não ser uma profissão, isto é, pode não ser remunerada. É o caso de uma mãe de família, de uma parente solteira que se dedica a educar a prole numerosa de alguma prima, embora sem remuneração, é o artista rico que não vive de sua arte, e contudo vive para ela etc. Evidentemente, toda essa gente não merece a menor punição.

Aliás, o próprio ócio, nos ricos, por mais condenável que seja, não deve ser reprimido por lei, pois essa repressão produziria inconvenientes maiores do que os que visa corrigir.

É o que se dá com inúmeros deveres morais que não devem ser convertidos em obrigação jurídica.

Todo o mundo deve, por exemplo, dar esmolas. Ai do país, entretanto, em que a lei fixe o quanto de esmola cada indivíduo deve dar! Dentro em breve, ele seria teatro dos mais deploráveis abusos.

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A questão tcheca, que teve na semana passada uma tão drástica e inesperada solução, preocupa o “Legionário” sob dois pontos de vista. O primeiro se refere aos interesses espirituais das regiões conquistadas, e o segundo à moral internacional. Como se vê, ambos esses aspectos têm íntima conexão com a doutrina católica. E é preciso, e exclusivamente por isso que o “Legionário” deles se ocupa.

Não nos pronunciamos sobre o lado meramente temporal. O Sr. Hitler afirmou ter sido levado a conquistar as províncias tchecas, por ser essa a melhor solução possível para o problema do equilíbrio étnico e político da bacia danubiana centro-européia. Terá razão? É possível, conquanto pareça absolutamente improvável. Em todo o caso, essa questão, em si mesma, nada tem a ver com a Igreja, e, por isso, não nos pronunciamos sobre ela.

Não somos contrários, em tese, à dilatação da influência alemã na Europa central, porque, como católicos, não podemos ser contrários ao aumento da influência ou de poder de nenhum povo da terra.

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Entretanto, se, tomada em si mesma, essa dilatação de poder não pode contrariar a um jornal católico, esse não deve dar sua aprovação às injustiças, às custas das quais ela se faz.

Ora, ainda que as mais graves razões tornassem moralmente admissível para o Reich a conquista da Tchecoslováquia (e ninguém ignora quão raras e difíceis de se darem na prática tais razões são), ainda assim o Sr. Hitler estava ligado pelo soleníssimo Tratado de Munich, que ele não poderia violar sem maior desonra.

Essa violação, feita com uma indiferença e uma displicência para cuja classificação o vocabulário não tem termos suficientemente fortes, não pode deixar de encontrar na consciência católica a mais absoluta e formal repulsa.

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Além dessa questão de honra, há outra. E a gravidade dessa outra é inexcedível.

Ninguém ignora o regime de violência, de opressão brutal, da propaganda cínica e metódica da apostasia em que a Alemanha se encontra.

Qual o católico digno desse nome que possa não lamentar que centenas de milhares de seus irmãos na Fé, residentes nos territórios ora conquistados, vão sofrer idêntica perseguição?

Quem ama acima de todas as coisas Deus, e sua Santa Igreja, poderá encontrar consolação para tal catástrofe na satisfação de alguma vaidade nacionalista? Descerá a tanto algum católico? Queira Deus que não!

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Não comentaremos a atitude de Daladier e Chamberlain.

Todo o mundo se lembra ainda da famosa sessão da Câmara dos Comuns, em que o Sr. Chamberlain chorou de comoção porque recebera naquele instante uma missiva do Sr. Hitler, aceitando novas negociações. Tinha-se a impressão de que a guerra iria estourar, caso a mensagem não chegasse, anunciando algumas concessões. Porque, sem estas, o Sr. Chamberlain preferiria uma conflagração mundial.

Hoje, quando se vê que o Sr. Chamberlain não opôs resistência a nada, e que não há nenhum progresso alemão na Europa capaz de o levar à guerra, quem será bastante tolo para acreditar que, em 1938, Chamberlain pensou em declarar guerra, caso o acordo de Munich não fosse aceito?

Despistamento, despistamento e só despistamento!

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No meio de tudo isso, não podemos deixar de nos lembrar da recente Pastoral de S. Ema o Cardeal Kaspar, Arcebispo de Praga, afirmando que Pio XI, para salvar a Tchecoslováquia, fez inauditos esforços, que um dia a História conhecerá.

O depoimento daquele Príncipe da Igreja, cuja púrpura traz consigo as mais sagradas garantias de veracidade e sinceridade, é uma prova eloqüente de que está certa a orientação do “Legionário”.

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No meio de tudo isto, há uma nota cômica.

Em 1935, falava-se muito no poderio do comunismo russo, e na eficiência maravilhosa dos exércitos soviéticos.

Onde está agora essa eficiência? Onde esse poderio?

É saborosamente hilariante a impotência militar dos sovietes, em tão vivo contraste com seu apregoado poderio!

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Finalmente, uma pergunta: que fazem os membros do governo húngaro, que fizeram tão belos discursos no Congresso Eucarístico de Budapeste? Que medidas tomam para evitar a invasão neopagã na Europa central? As palavras foram belas. E os atos? Onde estão?

Por isso é que o “Legionário” sempre foi muito céptico em relação a discursos muito chibantemente católicos da Europa... e de outros lugares.