Legionário, N.º 248, 13 de junho de 1937

7 DIAS EM REVISTA

O Sr. José Carlos de Macedo Soares acaba de assumir, para com o Brasil e a Igreja, uma tremenda responsabilidade.

S. Ex.a soltou, de uma só vez, 308 prisioneiros comunistas detidos no Rio. Desde 1935 para cá, o governo julgou imprescindível o encarceramento de toda essa gente. E pediu o estado de guerra exatamente para poder conservar sob custódia os inúmeros brasileiros acusados de conivência com os emissários de Moscou. Pareceu a nossas autoridades que a soltura de todos esses indivíduos suspeitos seria nociva à ordem pública.

E vem o Sr. Macedo Soares e coloca-os, todos, na rua.

S. Ex.a tornou-se responsável pelo mau uso que fizerem da liberdade que restituiu a 308 pessoas acusadas de atentar contra a Igreja e a Pátria. Francamente, não quereríamos ter, perante Deus, o peso tremendo dessa responsabilidade que, muito provavelmente, reverterá em condenação de seu gesto.

*  *  *

Dirá alguém: contra os presos que o Sr. Macedo Soares soltou, nada se apurou de positivo. Seria, pois, uma crueldade mantê-los sob custódia.

Francamente, não podemos admiti-lo. Se nada se tivesse apurado contra eles, o Governo do Sr. Getúlio Vargas os deveria ter restituído a liberdade há muito tempo. Se não restituiu, deve-se admitir pelo menos que graves indícios se tinham obtido contra eles. E, nesta hipótese, o Sr. Macedo Soares foi de uma terrível imprudência, restituindo-lhes a liberdade.

Mas se realmente eram inocentes e estavam presos, o Sr. Getúlio Vargas é um tirano execrável. E o Sr. Macedo Soares não deveria consentir em lhe servir de ministro.

Não vemos como se possa sair desse dilema.

*  *  *

Aliás, convém acrescentar que alguns dos presos deveriam ter evidentemente qualquer “culpa no cartório.”

Basta mencionar a Srta. Justo de Morais, filha de um dos mais eminentes advogados do Rio, que dispõe de um nome tradicional e de uma grande fortuna. Pode-se crer que o Governo tenha aprisionado a Srta. Justo de Morais, sem que contra ela se tivesse apurado algo de muito grave?

O Sr. Justo de Morais é deputado e pertencia à maioria governamental quando sua filha foi presa. Não obstante isto, S. Ex.a continuou a dispensar todo o seu apoio ao governo federal, até há pouco tempo. E retirou seu apoio com razões que nada tem com a prisão de sua filha.

Não é esta a prova mais esmagadora da culpabilidade da Srta. Morais?

Não viu isto o Sr. Macedo Soares?

*  *  *

De mais a mais, ninguém pode negar que os tribunais estão acelerando seu trabalho e que, dentro de certo tempo, todos os criminosos estarão julgados. Por que não aguarda, por mais algum tempo, a ação da justiça? Por que soltar, sem processo, pessoas contra as quais pairavam na opinião pública graves suspeitas?

E, em última análise, se alguém deveria ser prejudicado, a ordem pública ou os acusados que o Sr. Macedo Soares soltou, não seria preferível que o prejuízo recaísse sobre estes últimos?

Não estão a Igreja e a Pátria acima de tudo? Não deve pensar assim o Sr. Macedo Soares, que se tem afirmado católico e patriota?

O fim de tudo isto se resume no seguinte: mais uma desilusão.

*  *  *

Saiu com incorreções o trecho do discurso do Sr. Theotônio Monteiro de Barros Filho, que publicamos em nosso último número. Vamos pois, reproduzí-lo mais uma vez, transcrito do “Estado de São Paulo”:

“O Sr. Demétrio Xavier - V. Ex.a acha que o perigo comunista já passou no Brasil?

“O Sr. Theotonio Monteiro de Barros - Está reduzido a proporções ínfimas. Afirmo a vossa Ex.a que, ainda quando esse perigo persistisse, seria menor e menos mal faria ao País do que a violação de nossos princípios fundamentais de organização”.   

Como se vê, o texto do discurso justifica amplamente nossos comentários feitos no último número.

*  *  *

Para muitos católicos que supõem que a Igreja deve confiar irrestritamente em certas ditaduras, temos outra desilusão a apresentar.

O Sr. Oliveira Salazar, que muitas pessoas se compraziam em representar como um cordeiro sem mácula, concedeu, há dias, uma entrevista aos jornais de sua terra, que o “Diário Popular” transcreveu. Nessa entrevista, o jovem ditador português se manifestava contrário à união da Igreja e do Estado, não apenas - o que seria legítimo - por razões ocasionais e acidentais, mas por motivos doutrinários inadmissíveis.

Não negamos que o Sr. Oliveira Salazar tenha feito muito bem a Portugal. Mas supor que ele represente 100% de garantia para os católicos é um erro.

Dirá alguém que em todo o caso é melhor isto do que o comunismo. Está certo. Mas por que não optar pela orientação do grande Dollfuss?

*  *  *

A respeito dos desastres que costumam ocorrer nas disputas automobilísticas como a que recentemente se verificou na Gávea, o “Estado de São Paulo” teve este trecho:

“É provável que haja desastres, outra vez, como nas provas anteriores. Que fazer? Não será isto mesmo, esse sacrifício de vida, o que a massa pede que seja mais alta e mais sangrenta a glória dos vencedores? Creio que sim; já que estão fora de moda e proibidos os combates entre homens e feras, as lutas de gladiadores, as inquisições, os enforcamentos e “outros divertimentos que tais” que deliciaram outrora nossos maiores, deixemo-los deliciar-se agora com o espetáculo do esmagamento de um outro automobilista mais afoito, divertimento que é bastante bem mais suave, convenhamos, que os trucidamentos a machado e os fuzilamentos em massa com que os ditadores do dia acalmam as massas oprimidas. Deixemos tudo como está e não se lembre algum gênio legiferante de baixar alguma lei que proíba, sob pena de multa e de cadeia, a realização de outro pequeno desastre... para variar”.

O trecho é longo, mas vale a pena transcrevê-lo na íntegra. Tanto mais quanto dispensa comentários.

*  *  *

O “Estado de São Paulo” é um jornal que sempre caracterizou pela seriedade de seu noticiário sobre crimes e outras coisas imorais deste estilo. Ao menos no cenário doloroso de nossa imprensa nacional, constituía ele uma exceção relativamente honrosa.

Entretanto, seu último número de retogravura apresentava quadros de tal maneira imorais, que poderiam ser incluídos em qualquer coleção de postais obscenos, desses que se vendem às escondidas nos engraxates e nas vendas.

Mas é que os quadros eram artísticos... e há muitos leitores católicos que, por isto, contribuem com seu dinheiro para adquirir o jornal.

*  *  *

Do Sr. Crimilde Leite de Aguiar, brilhante redator na seção religiosa do “Correio da Noite” do Rio de Janeiro, recebemos atenciosa missiva em que discorda da afirmação que publicamos de que a imprensa, em reportagem assinada que fez um colaborador desta folha, do Rio não noticiou convenientemente. 

*  *  *

Um telegrama da agência de Havas informa que a sala em que se realizou a cerimônia do enlace do Duque de Windsor com a Sra. Simpson estava toda ornamentada com lírios.

Cruel ironia!