À Margem dos Fatos

“O Legionário”, N.º 186, 8 de dezembro de 1935

 

Não há muito tempo, que o General Rabello e o sr. Tristão de Athayde se empenharam em uma polêmica das mais venenosas. É claro. A verdade e o erro, a lucidez e o nevrotismo, são coisas irreconciliáveis.

Mas há dias atrás, pela primeira vez na vida, o grande leader católico e o virulento ex-capitão mor de São Paulo publicam declarações absolutamente concordes.

Diante da gravidade do perigo, lembram ambos que não basta jugular os movimentos armados para restituir ao País sua tranqüilidade. É preciso atacar a crise nas suas causas mais profundas. Não basta combater os sintomas: é preciso atingir o mal.

Ao que parece, a cegueira do General Rabello se dissipou à luz dos incêndios e das granadas. Previdência... quae sera tamem.

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Mas há cegueiras mais teimosas do que a do General Rabello. É que a vaidade e a ambição são mães de todas as obstinações irredutíveis. Assim é que não faltam políticos oposicionistas que, para brilhar na luz mentirosa de uma efêmera popularidade, procuram dificultar a ação repressora do Governo.

O que é o Sr. João Neves? O que é o Sr. Laerte Setúbal? O que são os demais próceres da oposição? Burgueses tão autênticos quanto os que mais o sejam.

Julgam eles, porventura, que aboletados com o aplauso dos comunistas nos postos de mando, que tanto ambicionam, poderão gozar por muito tempo das delícias do poder?

Não. Deus às vezes exerce sua justiça já nesta vida. Eles serão tragados pela tempestade. O fogo que eles ateiam na barba do vizinho também consumirá um dia a sua.

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No meio de tanta cegueira, não podemos senão admirar o gesto dos Srs. Arthur Bernardes, Costa Rego e outros que, vencendo as mais amargas queixas pessoais e políticas contra o Sr. Getúlio Vargas, foram levar a este seu apoio contra o comunismo.

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É claro que este gesto elegante há de ter custado grande sacrifício aos políticos oposicionistas que o fizeram.

Portanto eles não o terão levado a cabo sem pesar longamente a gravidade da situação.

Sua atitude demonstra sua grandeza de alma, mas prova também que o perigo é grande e real.

No entanto, há quem não se impressione com o depoimento insuspeito do Sr. Arthur Bernardes e do Sr. Costa Rego, e continue a afirmar que a revolução não foi comunista.

“Têm olhos e não vêem, tem ouvidos e não ouvem”...

Não falta quem diga que o Governo é culpado pela situação a que chegamos.

As tendências evidentemente esquerdistas do Sr. Pedro Ernesto, do Sr. Anísio Teixeira, do Secretário da Segurança Pública (!) do Estado de Pernambuco, de tantos outros altos funcionários nomeados pela situação dominante servem de argumento para essa tese.

Ainda há pouco, o Sr. Chefe de Polícia do Rio confessou, em entrevista publicada no “Estado”, que o Governo sabia da presença de Luiz Carlos Prestes no Brasil, mas “que não tinha motivos para prendê-lo”.

Realmente, o Governo foi exageradamente imprevidente e liberal. Mas esta crítica, que nós católicos lhe poderíamos fazer, não têm autoridade para fazê-la os demagogos da oposição.

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Os católicos devem reconhecer que o Governo está agindo agora com uma energia modelar, nosso papel não deve ser, pois, de carpideiras incorrigíveis, férteis em estéreis recriminações.

Só temos, na atual emergência, uma atitude: a de defender as instituições.

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É lamentável que o Sr. Professor Afranio Peixoto tenha apoiado com sua grande autoridade o Sr. Anísio Teixeira, acompanhando-o ao ostracismo.

Quando o Governo procura sanear o ambiente é esta a atitude que um de nossos mais ilustres intelectuais se sente no direito de tomar?

Dele esperaria o Brasil uma palavra de ânimo neste transe difícil, uma solidariedade corajosa contra os seus adversários.

No entanto, o que recebe deste filho de escol? A afronta de ver seus legítimos interesses postergados em benefício do comunista Anísio Teixeira.

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O Sr. Anísio Teixeira, aliás, tem as suas prestidigitações políticas bem organizadas.

Apenas o Governo anunciou que iria demiti-lo, os órgãos da oposição e da situação se puseram a defendê-lo. E até o “Estado de São Paulo” publicou com complacência a sua lacrimosa carta de despedidas.

Qual é o segredo do Sr. Anísio? Como conseguiu ele a solidariedade de gregos e troianos? (...).

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No meio de tantas defecções devemos pôr em evidência o gesto corajoso dos cem universitários cariocas que telegrafaram ao governo, pedindo medidas repressivas contra os mestres e colegas comunistas.

Este gesto viril, que rompeu com o preconceito de um coleguismo incondicional e absurdo, merece nosso caloroso aplauso.

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Depois dos aplausos, mais um reparo. Os jornais noticiaram que o pseudo Príncipe comunista (!) Igor Dolguruki deveria ser posto ao lado de Luiz Carlos Prestes no Governo do País.

Não espanta que, a troco de alguns milhares de rublos para fazer a revolução, a ANL (a despeito de seu farisaico nacionalismo) tenha vendido a soberania nacional a um aventureiro russo: Jesus custou só 30 dinheiros, e houve um Judas que achasse o preço razoável!

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Queremos, porém, terminar com um elogio. E este será ao Sr Ministro do Exterior.

Quando S. Ex.a condecorou o Presidente do México, com a ordem do Cruzeiro, protestamos contra essa manifestação de simpatia aos algozes da Igreja Mexicana.

Manda, porém, a justiça, que elogiemos francamente o espírito que presidiu à realização do acordo vaticano-brasileiro sobre malas diplomáticas e o filial devotamento que S. Ex.a quis manifestar, em nome do Brasil, à Santa Sé.