Cambodge ou Honolulu?

“O Legionário”, N.º 185, 24 de novembro de 1935

 

Elogiamos francamente a atitude da bancada constitucionalista federal ao recusar sua aprovação ao absurdo requerimento que recentemente se formulou na Câmara dos Deputados relativo à aplicação da lei de segurança aos integralistas.

E, para fazer tal elogio, sentimo-nos perfeitamente à vontade, uma vez que tanto a respeito da atuação de certos elementos da bancada peceistas, quanto no que se refere a algumas bravatas anticlericais de alguns expoentes integralistas, temos tido palavras da mais rigorosa e imparcial condenação.

Mais de uma vez, temos sido forçados, em nossas colunas, a censurar as quixotadas anticlericais de certos expoentes integralistas, os “despistamentos” parlamentares de certos representantes peceistas (...). Ninguém, portanto, nos acusará de parcialidade quando souber que aprovamos francamente a atitude dos deputados federais peceistas que negaram seu assentimento ao requerimento formulado pelo bloco parlamentar “pró liberdades públicas”.

Nesse requerimento, pretendiam os deputados simpatizantes com a Aliança Libertadora impor ao Governo um dilema:

1) ou aplicar contra o Integralismo a lei de segurança;

2) ou, “por eqüidade”, deixar de aplicá-la à Aliança Nacional Libertadora. E o luminoso argumento que apoiava tamanha enormidade era o seguinte: que o governo não tinha o direito de punir apenas uma forma de extremismo, isto é a Aliança. Punindo a esta, deveria punir também o Integralismo, ou, para fazer ampla justiça, não deveria punir nem a um nem a outro.

Como já temos dito mil vezes, a equiparação peca pela base. Concedido que o Integralismo pretenda, à mão armada, derrubar as instituições, não se poderia fazer paralelo entre a Aliança Libertadora e a Ação Integralista. Esta é uma corrente política composta de gente limpa, que ostenta no seu lema ideais elevados.

A Aliança Libertadora, pelo contrário, é uma sociedade de malfeitores públicos. E nenhuma igualdade legal pode ser estabelecida, entre cidadãos dignos, e indivíduos que, negando serem comunistas, se põem a soldo de Moscou para alastrar em todo o Brasil os incêndios, os saques, as pilhagens, que são o séquito necessário de toda a revolução social.

Mas, firmado este princípio, perguntamos: está provado que a Ação Integralista procura destruir pela força as instituições vigentes? Para prová-lo seria necessário um rigoroso inquérito, seriam necessários longos interrogatórios, demoradas providências judiciárias, depois das quais poderia surgir, finalmente, uma verdade segura a este respeito.

No entanto, nada disto se levou a efeito. Os leaders do grupo parlamentar “pró liberdades” não aduziram uma única prova, não procuraram citar um só documento, uma única testemunha. Seu requerimento tinha, pois, como base um fato que não provaram. E, ainda que tal fato se provasse, a conclusão a que eles chegaram seria absurda.

Realmente, admitamos que a Ação Integralista estivesse conspirando à mão armada contra as instituições. Evidentemente, as autoridades estariam no dever de aplicar contra ela as leis vigentes no país. Mas a inexecução das leis quanto ao Integralismo seria suficiente para justificar o pedido de que se restituísse a liberdade de ação ao Comunismo? Quem seria capaz de requerer ao Governo que, porque as autoridades não puniram um crime qualquer, o furto por exemplo, praticado por um cidadão amigo do Governo, se fossem, “por eqüidade”, esvaziar todas as cadeias do país, dando a todos os vagabundos, a todos os ladrões, a todos os assassinos, a liberdade de roubar e de matar, simplesmente porque a autoridade está cochilando na repressão de uma infração qualquer ao Código Penal?

Requerimentos como este só servem para degradar o Brasil, provando que seus filhos não têm sempre o patriotismo que deles se deve exigir e que a falta de patriotismo se alia a uma falta de verniz cultural e parlamentar que faria vexar qualquer parlamento de Cambodge ou de Honolulu.