A Igreja e o progresso
“O
Legionário”, N.º 103, 4 de setembro de 1932, pag. 1
Os historiadores anticatólicos
empreenderam a ingrata tarefa de alterar a verdade histórica, para submetê-la
aos interesses de seus ódios religiosos. Assim é que, freqüentemente, penas
autorizadas não têm hesitado em sustentar que a Igreja é uma adversária
sistemática de todo o progresso humano.
No entanto, a História em geral, e a da Idade Média em
particular, desmentem categoricamente tal asserção.
A Idade Média foi um período fecundo de trabalho
intelectual e material incessante, que preparou todos os frutos que a
Renascença pagã veio colher.
No descobrimento da América, ainda não foi
suficientemente divulgada toda a importância da contribuição valiosa que os
elementos do Clero trouxeram a Cristóvão Colombo.
De um modo geral, pode-se afirmar que este, embora
constituindo um dos vultos mais eminentes da História, não fez outra coisa
senão coordenar genialmente os conhecimentos geográficos de sua época,
dando-lhes, graças a sua coragem, a seu arrojo, uma aplicação a cujos
resultados felizes deve toda a sua glória.
Colombo, segundo o depoimento de Rocha Pombo, na sua
História do Brasil (Vol. I, Parte I, Cap. II, p. 45), foi movido, no seu
grandioso empreendimento, pelo ardente desejo que tinha de propagar a Fé
católica entre os povos das terras distantes, cuja existência lhe parecia
incontestável.
Um de seus grandes inspiradores foi o Cardeal Pedro d'Ailly, o famoso Petrus de Alíaco.
O Instituto Histórico e Geográfico, que possui um
documento a esse respeito, assim se exprime, na sua “Revista” (Revista do
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Tomo 85, Vol. 139, Ano 1919, p. 9):
“Alíaco, Petrus
de - Tratactus de imagine mundi
et varia ejusd. auct., et Joannis
Gersonis opuscula -
S.l.u.d.
“Incunábulo de fins do
século XV, apenas citado por Hain, in Repertorium bibliographicum.
“Em uma página em branco, por letra de D. Pedro II, a
cuja biblioteca particular pertenceu o exemplar do Instituto Histórico, a
seguinte inscrição: `avant-coureur de Colomb' (precursor de Colombo).
“Petrus de Alíaco é o célebre teólogo Cardeal Pierre d'Ailly, águia dos doutores da França, martelo dos
heréticos, como lhe chamaram seus contemporâneos. Nasceu em Compiègne
em 1350: foi Bispo de Cambrai em 1393 e recebeu o
chapéu cardinalício em 6 de junho de 1411; faleceu em Avignon,
entre 1420 e 1425.
“Representou papel importante nos negócios
eclesiásticos de sua época. Suas obras cosmográficas
resumem tudo o que se sabia e ensinava em fins do século XIV e princípios do
século XV.
“O Dr. L. Salembier, em
monografia recente - Pierre d'Ailly et la
découverte d'Amérique
(Paris, 1912), refundindo pesquisas anteriores, fixa definitivamente a
influência exercida sobre Cristóvão Colombo pelos escritos de Pierre d'Ailly. Corroborando esse fato, cita os documentos
existentes na biblioteca do Capítulo de Sevilha, cujos livros mais curiosos são
os que pertenceram ao almirante, cheios de notas suas. Entre os autores
favoritos, aquele que ocupa o primeiro lugar. No volume que contém a principal
obra cosmográfica do Cardeal, a Imago mundi e outros tratados, contam-se
898 notas, escritas por Cristóvão Colombo e por seu irmão Bartolomeu, a quem
pertencia o exemplar”.
Vemos aí uma influência curiosa e decisiva do elemento
clerical, dos mais representativos, sobre a obra de Colombo.
Como sustentar, ainda, a incompatibilidade da Igreja
com o progresso humano?