Continuando nossos esforços no sentido de divulgar
a Encíclica Mediator Dei, iniciamos hoje a
publicação de comentários e notas sobre o texto pontifício.
Além de procurarmos pôr ao alcance dos leitores o
pensamento do soberano Pontífice, vazado em elevada linguagem teológica,
focalizaremos o nexo existente entre as Encíclicas Mediator Dei e Mystici Corporis Christi que constituem uma só e importante obra de
doutrinação.
1. Texto da Encíclica:
A Igreja, portanto, fiel ao
mandato recebido do seu Fundador, continua o ofício sacerdotal de Jesus Cristo
sobretudo com a Sagrada Liturgia.
Comentário da redação:
O ofício sacerdotal de Jesus Cristo é continuado
sobretudo, portanto não só, pela Sagrada Liturgia.
2. Texto da Encíclica:
Isto, ela o faz em primeiro lugar
no altar, onde o Sacrifício da Cruz é perpetuamente representado (5) renovado e
com a única diferença no modo de oferecer; depois com os Sacramentos que são
instrumentos particulares por meio dos quais os homens participam da vida
sobrenatural; enfim com o quotidiano tributo de louvor oferecido a Deus Otimo Maximo.
Comentário da Redação:
Na Liturgia não é só na Missa que a Igreja continua
o ofício sacerdotal de Jesus Cristo mas também nos Sacramentos e no Ofício
Divino.
3. Texto da Encíclica:
Certamente é de vosso conhecimento
Veneráveis irmãos que, nos fins do século passado e no início do presente houve
um fervor singular de estudo litúrgico, seja por
louvável iniciativa de alguns particulares, seja especialmente pela zelosa e
assídua diligência de vários mosteiros da ínclita Ordem Beneditina, de maneira
que não somente em muitas regiões da Europa, mas também nas terras do outro
lado do oceano, se desenvolveu neste propósito uma elogiável
e útil emulação, cujas benéficas conseqüências foram visíveis, seja no campo
das disciplinas sagradas, onde os ritos litúrgicos da
Igreja Oriental e Ocidental foram mais ampla e profundamente estudados e
conhecidos, seja na vida espiritual e privada de muitos cristãos.
As augustas cerimonias do
Sacrifício do altar tornaram-se mais conhecidas, compreendidas e estimadas: a
participação aos Sacramentos, mais ampla e freqüente, as orações litúrgicas mais suavemente saboreadas e o culto eucarístico
considerado - como é verdadeiramente - o centro e a fonte da verdadeira piedade
cristã. Foi, ainda, colocado mais claramente em evidência o fato que todos os
fiéis constituem um só e muito compacto corpo do qual Cristo é a cabeça, sendo
disto conseqüência o dever para o povo cristão de participar segundo as
próprias condições nos ritos litúrgicos.
Comentário da Redação:
O Papa mostra que a doutrina do Corpo Místico, que
tem um nexo natural com a Sagrada Liturgia, foi estudada pela mesma corrente
que promoveu o Movimento Litúrgico. Este vasto e rico
conjunto de doutrinas, posto em relevo por esta forma foi sadio de início, e
mais tarde começou a ser tratado de modo heterodoxo. Daí o nexo entre a
encíclica Mistici Corporis Cristi e a encíclica Mediator Dei, a primeira destinada a combater os erros sobre o Corpo
Místico, e a segunda os erros sobre o Liturgismo. Uns
e outros erros se fundem assim em uma raiz de heterodoxia comun
o que faz deles um sistema heterodoxo homogêneo.
4. Texto da Encíclica:
Vós sem dúvida, sabeis muito bem
que esta Sé Apostólica cuidou sempre que o povo a ela confiado fosse educado
num verdadeiro e operoso sentido litúrgico e que, com
não menos zelo, se tem preocupado com que os sagrados ritos tivessem um
esplendor também externo, de uma conveniente dignidade. Nesta mesma ordem de
idéias, Nós, falando segundo o costume aos pregadores quaresmais desta nossa
nobre Cidade em 1943, os exortamos calorosamente a orientar os seus ouvintes no
sentido de participar sempre com maior empenho no Sacrifício Eucarístico; e
recentemente fizemos traduzir de novo para o latim, do texto original, os
livros dos Salmos a fim de que as orações litúrgicas,
das quais constitui ela uma parte tão grande na Igreja Católica, fossem mais
exatamente entendidas e sua verdade e suavidade mais facilmente percebidas.
Comentário da Redação:
A razão da tradução, segundo o
Papa, é que eles fossem melhor entendidos e compreendidos. Daí se conclui que o
principal proveito dos fiéis na recitação do ofício não consiste em nebulosos
efeitos trans-psicológicos, mas em um efeito
psicológico. A verdadeira formação litúrgica está em
entender e saborear o sentido dos salmos.
5. Texto da Encíclica:
Todavia, enquanto pelos salutares
frutos que dele derivam, o apostolado litúrgico nos é
de não pequena consolação. Nosso dever Nos impõe acompanhar com atenção esta
"renovação" na maneira pela qual é ela concebida por alguns, e cuidar
diligentemente que as iniciativas não se tornem nem excessivas nem defeituosas.
Comentário da Redação:
Este tópico torna manifesto que os erros nasceram,
não de um outro Movimento Litúrgico, mas daquele
mesmo que se iniciou tão felizmente na Europa sob os auspícios da Ordem de S.
Bento, transpôs os mares, e se estendeu por toda a Igreja do Ocidente.
Manifesta outrossim que o Papa julga necessária uma
vigilância sobre esse movimento, exercida por toda a parte, de modo a tolher os
gravíssimos erros que nele se declararam, ou os prevenir.
6. Texto da Encíclica:
Ora, se de um lado constatamos com
pesar que em algumas regiões o senso, o conhecimento e o estudo da Liturgia são
por vezes escassos ou quase nulos, por outra parte notamos com muita apreensão
que alguns são por demais ávidos de novidades e se afastam do caminho da
doutrina sã e da prudência.
Comentário da Redação:
Ao contrário de um boato que insidiosamente se
espalhou, o Papa não censura as pessoas que, antes da encíclica, atacaram os
erros do Movimento Litúrgico. Ele censura apenas o
descaso de alguns povos, ("em certas regiões") a respeito da Sagrada
Liturgia. O Papa aponta a razão psicológica desses erros: avidez de novidades,
e seus dois efeitos, que são a ruptura com a Doutrina sã e a imprudência no
procedimento.
7. Texto da Encíclica:
A razão disto está em que, com a
intenção e o desejo de promover uma renovação litúrgica
eles sobrepõem muitas vezes princípios que, ou na teoria ou na prática
comprometem esta causa santíssima, e muitas vezes também a contaminam com erros
que dizem respeito a Fé católica e a doutrina ascética.
Comentário da Redação:
O Papa denuncia a existência de um sistema
("princípios") a que se ligam os erros do Movimento Litúrgico. Cabe aos estudiosos analisar diligentemente a Mystici Corporis Christi e a Mediator Dei para,
com os elementos por ela fornecidos definir estes princípios.
O Papa mostra a gravidade destas
atitudes que "muitas vezes afetam a Fé Católica e a doutrina
ascética". - Os piores inimigos do Movimento Litúrgico
são os que o contaminam com esses erros contra a Fé e a Moral. Por outro lado,
seus melhores amigos são os que atacam energicamente esses erros, para difundir
um bom Movimento Litúrgico.
8. Texto da Encíclica:
A pureza da Fé e da Moral deve ser
a norma característica desta disciplina
sagrada, que deve absolutamente se conformar com o sapientíssimo ensinamento da
Igreja. É portanto Nosso dever louvar e aprovar tudo o que é bem feito, e
conter ou reprovar tudo aquilo que se desvia do verdadeiro e justo caminho.
Comentário da Redação:
Houve, entre nós, quem achasse que atacar os erros
do Movimento Litúrgico era pôr em risco o próprio
Movimento Litúrgico no que tinha de são. Prudência
humana e carnal que os levava a preferir que o Movimento Litúrgico
se expandisse contaminado de erros, a que fosse prudentemente refreado. – O Papa não podia deixar de ver que,
divulgando esta encíclica, tornaria pública a existência de erros gravíssimos
entre os próprios católicos. Ele julgou que este perigo era menor do que
permitir que o Movimento Litúrgico prosseguisse em
seus erros. Entre nós, houve quem achasse que era desedificante
atacar os erros do Liturgicismo, o que revelava a
existência de uma divisão entre os católicos. Suspeita e estranha terapêutica
que consistia em deixar livre curso ao erro para que não se percebesse que ele
existe. Depois da Mediator Dei não é mais lícito preconizar esta
praxe.
9. Texto da Encíclica:
Não julguem, porém, os inertes e
os tíbios que têm Nossa aprovação por repreendermos os que erram e pormos
freios aos temerários: nem os imprudentes se julguem louvados quando corrigimos
os negligentes e os preguiçosos.
Comentário da Redação:
Como no tópico no. 6 o Papa fala em duas
posições erradas. A dos inertes e tíbios, que se desinteressam do assunto, e a
dos temerários e inovadores. Não há a menor referência àqueles que
interessando-se pelo assunto, atacaram os erros do liturgicismo.
Importante de se notar, para desfazer insidiosos rumores.
10. Texto da Encíclica:
Embora nesta Nossa Carta Encíclica
tratemos especialmente da Liturgia latina não é isto devido a uma menor estima
pelas venerandas Liturgias da Igreja Oriental, cujos ritos transmitidos por
nobre e antigos documentos Nos são igualmente caríssimos mas é antes
conseqüência das condições particulares da Igreja Ocidental, que são tais que
reclamam a intervenção de Nossa autoridade.
Comentário da Redação:
Estas palavras do Papa mostram a extrema premência
da situação a que chegamos: as condições particulares da Igreja Ocidental
RECLAMAM A INTERVENÇÃO DE NOSSA AUTORIDADE. Poderoso incitamento a todos fiéis
zelosos a que lutem em favor de um são movimento litúrgico,
por meio de um expurgo radical e imediato dos erros que o infestam.
11. Texto da Encíclica:
Ouçam, portanto, todos os cristãos
com docilidade, a voz do Pai comum, o qual deseja ardentemente que todos, que
Lhe estão intimamente unidos, se aproximem do altar de Deus, professando a
mesma Fé, obedecendo às mesmas leis, participando no mesmo sacrifício com um só
modo de ver e uma só vontade.
Comentário da Redação:
Confirma-se a anotação acima. Ouvir a palavra do
Papa traz para todos, inclusive os leigos, máxime no
século da Ação Católica, a absoluta obrigação de a difundir. Lutemos
energicamente contra aquilo que o Papa detesta e condena.
12. Texto da Encíclica:
Pede-o a honra devida a Deus;
exigem-no as necessidades dos tempos presentes, os fatos depois que uma longa e
cruel guerra dividiu os povos com as rivalidades e as desgraças, os homens de
boa vontade se esforçam no melhor possível por reconduzir todos à concórdia.
Comentário da Redação:
Mostra o Papa a grande necessidade de unidade entre
os fiéis. Esta, porém, só é possível pela unidade na Fé, como diz o Papa. Para
conseguir esta unidade o Papa, em vez de fazer silêncio sobre o problema litúrgico, pelo contrário, pôs o dedo na chaga. Dedo de Pai
e de Médico, que sabe que não se combatem erupções ignorando-as mas
medicando-as. Inestimável consolação para os que combatemos sempre o liturgicismo, e que, nesta atitude, não fomos fautores de
discórdia, mas obreiros da unidade.
13. Texto da Encíclica:
Com efeito, o Verbo, feito carne
(13), manifesta-se, logo, ao mundo no seu ofício sacerdotal fazendo ao Eterno
Pai um ato de submissão que durará durante todo o tempo de sua vida; “entrando
no mundo disse: ... Eis, eu venho... para fazer, ó Deus, a tua vontade...” (14)
um ato que será levado a termo de maneira admirável no sacrifício cruento da
Cruz: “Em virtude desta vontade nós fomos santificados por meio da oblação do
Corpo de Jesus Cristo, feita uma vez só para sempre”(15).
Comentário da Redação:
O ofício sacerdotal de Jesus Cristo não consistiu
somente na ceia e no Calvário, mas na submissão com que se portou em relação ao
Pai em cada um dos atos de sua vida. Como veremos, esta observação servirá de
base para que o Sumo Pontífice determine a natureza do sacrifício oferecido
pelos fiéis, as qualidades que este sacrifício deve ter, e portanto o próprio
modo de participação do fiel na Santa Missa. Note-se desde já a relação entre
os sacrifícios da vida cristã e o Sacrifício, ato do culto público.
14. Texto da Encíclica:
Toda a sua atividade entre os
homens não tem outro escopo. Criança, é apresentado no Templo do Senhor,
adolescente, a ele retorna outra vez; em seguida a ele volta muitas vezes para
instruir o povo, e para rezar. Antes de iniciar o ministério público jejua
durante quarenta dias, e com o seu conselho e com o seu exemplo exorta a todos
a que rezem, seja de dia, seja de noite. Como mestre de verdade “ilumina a todo
homem” (16) para que os mortais reconheçam convenientemente o Deus imortal, e
não “se subtraiam a este jugo para se perderem mas sejam fiéis para a salvação
da alma” (17). Depois como Pastor, Ele governa a sua grei, a conduz às
pastagens de vida, e dá uma lei que deve ser observada para que nenhum se
afaste dEle, e do reto caminho que Ele traçou, mas
todos vivam santamente sobre o seu influxo e ação. Na última Ceia, com rito e
aparato solene, celebra a nova Páscoa e providencia a continuação da mesma
mediante a instituição divina da Eucaristia.
Comentário da Redação:
O Papa distingue em Jesus Cristo atos como
indivíduo e os atos propriamente sacerdotais. Esta distinção não envolve
separação, muito ao contrário, há entre eles estreita união. Na piedade do Sumo
Sacerdote considerada em seu conjunto, e também na piedade da Igreja, podemos
distinguir dois elementos: um é constituído pelos atos propriamente
sacerdotais, que continuam a ação de Cristo enquanto Mestre Pastor e
Sacrificador; outro é constituído pela piedade dos indivíduos, piedade esta que
é estritamente privada e individual. O Papa desenvolverá mais amiúde este
conceito, para distinguir entre o sacerdócio propriamente dito e ativo da
Hierarquia, e o sacerdócio por analogia e passivo dos leigos, entre a piedade litúrgica propriamente dita dos primeiros, e a piedade dos
fiéis que será privada ainda que eles estejam praticando atos da Liturgia.
15. Texto da Encíclica:
No dia seguinte, suspenso entre o
céu e a terra, oferece o salutar sacrifício da sua vida, e do seu peito
lanceado faz em certo modo brotar os sacramentos que distribuem às almas os
tesouros da Redenção. Fazendo isto, Ele tem como único fim a glória do Pai e a
sempre maior santificação do homem.
Comentário da Redação:
A santificação do homem se obtém pela união de
todas as potências de sua alma a Deus. União da inteligência, da vontade que
quer firmemente a Deus e da sensibilidade. Esta união pode ser realizada dentro
da ordem puramente natural. Assim, as almas dos que estão no limbo, estão
unidas inteiramente a Deus, embora não possuam vida sobrenatural. Para promover
esta união moral de modo mais fácil e mais íntimo, Nosso Senhor deu ao homem,
com a Redenção, a vida sobrenatural. Mas, diz o Papa, a outorga deste Dom
esplêndido, não é um fim em si mesmo. O fim último, para o qual a própria
outorga da vida sobrenatural é um meio, vem a ser a união moral com Deus: que o
homem ame a Deus de todo o coração, e acima disto mesmo a própria glória de
Deus.
16. Texto da Encíclica:
Por isso, a sociedade fundada pelo
Divino Redentor não tem outro fim, seja com sua doutrina, e seu governo, seja
com o sacrifício e os Sacramentos por Ele instituídos, seja enfim como o
ministério, que por ele lhe foi confiado com as suas orações e seu sangue,
senão crescer e dilatar-se sempre mais; o que acontece quando Cristo é
edificado e dilatado nas almas dos mortais, e quando reciprocamente as almas
dos mortais são edificadas e dilatadas em Cristo.
Comentário da Redação:
O Papa confirma a tese acima. De tal maneira é
verdade que a glória de Deus e a união moral do homem com Deus são a finalidade
de todos os atos de Jesus Cristo e da própria Redenção, que a Igreja, continuadora de Cristo nem sequer tem outro fim que não
este. Note-se que para o Papa a fórmula clássica de construir Cristo no fiel,
ou o fiel em Cristo, exprime essencialmente a idéia de estabelecer a mais firme
e funda união moral entre o fiel e Cristo. Não cabe aqui nada de trans-psicológico, como se diria na terminologia suspeita
ou errada de certas filosofias modernas.
17. Texto da Encíclica:
Em toda a ação litúrgica,
pois, conjuntamente com a Igreja está presente o seu
Divino Fundador: Cristo está presente no augusto Sacrifício do Altar [...] na
pessoa do seu ministro, seja principalmente sob as espécies eucarísticas; está
presente nos Sacramentos com a virtude que neles transfunde para que sejam
instrumentos eficazes de santidade; está presente enfim nos louvores e nas
súplicas endereçadas a Deus, como está escrito: “onde se encontram dois ou três
em meu nome, aí eu estou no meio desses”.
Comentário da Redação:
Note-se que a presença de Cristo na ação litúrgica se faz “conjuntamente”
com a Igreja. Esta expressão encontra seu comentário na Mystici Corporis Christi,
na qual o Santo Padre insiste na impossibilidade de pertencer a uma suposta
Igreja de Cristo invisível e afirma que é impossível estar unido a Cristo, sem
estar com a Igreja visível, que tem o Santo Padre o Papa como chefe supremo.
18. Texto da Encíclica:
A Sagrada Liturgia é portanto o
culto público que nosso Redentor presta ao Pai como Cabeça da Igreja, e é o
culto que a sociedade dos fiéis presta à sua Cabeça, e, por meio dela, ao Pai
Eterno; e para dizer brevemente, o culto integral do Corpo místico de Jesus
Cristo, isto é, da Cabeça e dos seus membros.
Comentário da Redação:
Encontramos aqui uma definição oficial de Liturgia
que servirá de base daqui por diante para tudo que se escrever sobre o assunto.
Confirma-se nesta definição a doutrina tradicional segundo a qual somente as
pessoas públicas na Igreja, aquelas especialmente deputadas para tanto, é que
podem exercer funções litúrgicas propriamente ditas.
Os simples fiéis estão por isso mesmo excluídos de qualquer ação oficialmente litúrgica, ou formalmente litúrgica.
Esta doutrina será mais adiante afirmada de maneira incisiva e peremptória.
19. Texto da Encíclica
O culto se organiza e se
desenvolve segundo as circunstâncias e as necessidades dos cristãos, se
enriquece com novos ritos, cerimônias e formas, sempre com a mesma intenção:
“Isto é para que por meio destes sinais sejamos estimulados... se nos torne
conhecido o progresso realizado e nos sintamos solicitados a torná-lo maior com
maior vigor: o efeito, de fato, é mais digno quanto mais ardente o afeto que o
precede”.
Comentário da Redação:
O Papa mostra mais uma vez que a união moral dos
fiéis (e não trans-psicológica ou ontológica, como
querem alguns) com Deus conjuntamente com a glória do
mesmo Deus é o fim essencial da Liturgia.
O Papa desde já fulmina o arcaísmo litúrgico, declarando que os novos ritos não são escórias
ou impurezas de uma Igreja decadente, mas verdadeiras riquezas que intensificam
o patrimônio espiritual da Igreja.
20. Texto da Encíclica:
Assim a alma mais e melhor se
eleva para Deus; assim o sacerdócio de Jesus Cristo está sempre em ato na
sucessão dos tempos, não sendo a Liturgia nada mais do que o exercício deste
sacerdócio.
Comentário da Redação:
Todo este tópico mostra como o sacerdócio de Jesus
Cristo exercido pela Igreja é o sacerdócio hierárquico, que só pode ser
exercido pelos ministros sagrados e não pelos simples fiéis.
21. Texto da Encíclica:
Ele a regenera para a vida celeste
os nascidos para a vida terrena, os corrobora com o Espirito Santo para a luta
contra o inimigo implacável; chama os cristãos em torno dos altares e, com
insistentes convites, os exorta a celebrar e tomar parte no Sacrifício
Eucarístico, e os nutre com o pão dos Anjos, para que se tornem sempre mais
firmes, purifica e consola aqueles que o pecado feriu e manchou.
Comentário da Redação:
A expressão "celebrar" por parte dos
fiéis deve entender-se no sentido de comemorar, pois o Papa......[erro de
impressão no original] ele a censurável e tão usada expressão concelebrar
precisamente.... porque os fiéis estão excluídos do ato essencial do Santo Sacrifício da Missa que é
a consagração.
22. Texto da Encíclica:
Mas o elemento essencial do culto
deve ser o interno: é necessário, com efeito, viver sempre em Cristo,
dedicar-se a Ele inteiramente, para que nEle e com
Ele e por Ele se dê glória ao Pai. A sagrada Liturgia requer que estes dois elementos
estejam intimamente ligados; o que ela não se cansa nunca de repetir toda vez
que prescreve um ato. Assim, por exemplo, a respeito do jejum nos exorta:
"Para que aquilo que a nossa observância professa exteriormente, opere-se
de fato no nosso interior". De outra maneira, a religião torna-se um
formalismo sem fundamento e sem conteúdo. Vós sabeis, Veneráveis Irmãos, que o
Divino Mestre tem como indignos do Templo sagrado e expulsa aqueles que crêem
honrar a Deus apenas com o som de bem arquitetadas palavras e com poses
teatrais, e estão persuadidos de poderem muito bem prover à sua salvação
extrema sem desarraigar da alma os vícios inveterados.
Comentário da Redação:
Se a sagrada liturgia, e de modo geral a vida
cristã, tivesse por efeito produzir como alguns querem, uma união transpsicológica e ontológica com Deus seria certo que os
sentimentos internos da alma, por isto mesmo que se passam no domínio
psicológico, seriam secundários. Retamente executando o rito, e operado assim
seu efeito ontológico ou transpsicológico, o fim da
Liturgia estaria alcançado, ainda que a união moral e psicológica não se
realizasse.
O Papa parte de princípio oposto, e por isto dá
importância capital, não à execução do rito, mas à disposição interna.
É contra o formalismo puramente mecânico da
Liturgia, contra a idéia de que esta atua exclusivamente "ex opere operatur"
e não "ex opere operantis",
que o Papa se indigna santamente. A Encíclica "Mediator Dei" é o azorrague que deve expulsar da Igreja esta nova
forma de vendilhões e fariseus.
23. Texto da Encíclica:
A Igreja, portanto, quer que todos
os fiéis se prostrem aos pés do Redentor para professar-Lhe
seu amor e sua veneração; quer que as turbas, como as crianças que foram ao
encontro de Cristo quando entrava em Jerusalém com aclamações jubilosas, entoem
hinos e acompanhem ao Rei dos Reis e ao Autor Supremo de todos os benefícios
com o canto de glória e de agradecimento; quer que sobre os seus lábios se
encontrem orações ora súplices, ora alegres e gratas, com as quais, como os
Apóstolos junto ao lago de Tiberíades, consigam obter
o auxílio da sua misericórdia e do seu poder; ou como Pedro no monte Tabor, entreguem a Deus a si mesmos e a todas as suas
cousas nos transportes místicos da contemplação.
Comentário da Redação:
De tal maneira as disposições internas são
fundamentais para que os fiéis vivam uma vida litúrgica
sadia e ortodoxa que, neste tópico em que manifestamente o Papa fala de piedade
litúrgica, ele emprega palavras e conceitos
inteiramente cabíveis à piedade meramente privada.
24. Texto da Encíclica:
Não têm, pois, uma exata noção da
Liturgia sagrada aqueles que a consideram apenas como uma parte exterior e
sensível do culto divino ou como um cerimonial decorativo; nem erram menos
aqueles que a consideram como uma mera soma de leis e preceitos com os quais a
Hierarquia Eclesiástica ordena o cumprimento dos ritos.
Deve, pois, ser bem conhecido de
todos que não se pode honrar dignamente a Deus se a alma não se orienta no
sentido de conseguir a perfeição da vida e que o culto prestado a Deus pela
Igreja, em união com a sua divina Cabeça, tem a máxima eficácia santificadora.
Comentário da Redação:
A linguagem do Papa mostra que estes erros na são
apenas hipotéticos e possíveis. mas que concretamente
nasceram do aliás providencial Movimento Litúrgico.
Neste tópico o Papa enuncia o erro refutado nas
considerações anteriores e o condena. O erro é duplo: 1) que a Liturgia possa
dar condigna glória a Deus, pelo simples fato de seu rito ser efetuado de modo
excelente, embora não haja esforço de santificação dos ministros e dos fiéis;
2) que a santificação não seja um máximo efeito da Liturgia.
25. Texto da Encíclica:
Esta eficácia, se se trata do Sacrifício Eucarístico e dos Sacramentos,
provém antes de tudo do valor do ato em si mesmo (ex opere operato); se depois considerarmos
também a atividade própria da Esposa Imaculada de Jesus Cristo, com a qual Ela
orna de orações e cerimonias sagradas o Sacrifício Eucarístico e os
Sacramentos, ou, se se trata dos Sacramentos e de outros
ritos instituídos pela Hierarquia Eclesiástica, então a eficácia deriva mais da
ação da Igreja (ex opere operantis Ecclesiae) enquanto Ela é santa e obra sempre em íntima
união com a sua Cabeça.
Comentário da Redação:
O Papa confirma aqui a doutrina tradicional da
Teologia Católica que em toda ação santificadora
distingue várias maneiras de eficácia: 1) a eficácia intrínseca (ex opere operato)
que é a eficácia dos Sacramentos e do Sacrifício da Missa, independente da santidade
de quem os administra; 2) a eficácia extrínseca à obra em si, mas também
independente da santidade do ministro que a exerce. É o "opus operantis Ecclesiae", cuja eficácia santificadora
depende da santidade da Igreja, em cujo nome é exercido o rito sagrado pelo seu
ministro; 3) a eficácia que provém do mérito da pessoa que exerce a ação santificadora, e depende da santidade de quem realiza o
ato.
Não se pense que a eficácia "ex opere operato"
não envolva de modo nenhum qualquer elemento de culto interno, ou seja os
sentimentos da alma que se endereça a Deus para cultuá-lo. É verdade que o
Sacrifício da Missa e os Sacramentos são válidos e eficazes ainda quando
celebrados por pessoas indignas. Sua eficácia porém não procede da sua ação litúrgica, como se fosse uma ação mágica; sua eficácia
procede dos merecimentos de Jesus Cristo, em cuja pessoa são eles exercidos, e
os merecimentos de Jesus Cristo envolvem todo o infinito valor de seu culto
interno.
Não se julgue que a Igreja dispensa no ministro que
oferece ou administra os Sacramentos os elementos do culto interno, e a própria
santificação. É bem verdade que suas ações litúrgicas
nestes casos, são válidas, ainda que sejam eles pessoas indignas. Mas a Igreja
as declara ilícitas, e os culpa gravemente, quando delas se aproximam indignamente, em estado de pecado mortal, ou sem as
condições requeridas pela ação sagrada. Paralelamente se raciocine quanto aos
Sacramentais, nos quais a eficácia depende não do Ministro, mas da Igreja.
Aliás, na própria ação sacramental, não se dispensa
inteiramente o elemento interno psicológico. Em outras palavras, não basta a
ação mecanicamente realizada exteriormente. Pois, a Igreja exige para o valor
dos Sacramentos, a intenção por parte do ministro "de fazer o que faz a
Igreja".
26. Texto da Encíclica:
A este propósito, Veneráveis
Irmãos desejamos que dirijais vossa atenção às novas teorias sobre a
"piedade objetiva", as quais esforçando-se em evidenciar o Mistério
do Corpo Místico, a realidade efetiva da graça santificante
e a ação divina dos Sacramentos e do Sacrifício Eucarístico, desejariam
descurar ou atenuar a "piedade subjetiva" ou pessoal.
Comentário da Redação:
Até aqui o Papa falou de dois elementos que
constituem a piedade da Igreja, ou seja do Corpo Místico, ambos elementos
essenciais:
a) os atos de Jesus Cristo, Cabeça da Igreja,
continuados pelos ministros da Liturgia;
b) os atos dos fiéis, e do próprio ministro não
enquanto representante de Jesus Cristo mas enquanto indivíduo particular.
O primeiro elemento poderia ser chamado objetivo, e
o segundo subjetivo. O erro que o Papa condena consiste em exagerar o elemento
objetivo e em menosprezar, ou até deixar de cuidar do elemento subjetivo.
Como o elemento subjetivo é o pessoal, e portanto,
o objetivo é o coletivo, este erro consiste em:
1) tornar a piedade preponderantemente coletiva ou litúrgica, com prejuízo da piedade privada ou pessoal;
2) na própria piedade coletiva, menosprezar o
elemento da piedade pessoal, que lhe é intrínseco e inseparável.
Trata-se, pois, de uma despersonalização e socialização da piedade, que realizaria
na ordem espiritual o que o comunismo realiza na ordem política, econômica e
social. Seria a bolchevização da piedade cristã.
Se chegarmos às últimas
conseqüências lógicas e mais extremas destes erros, e concebermos a piedade
como coisa inteiramente impessoal, teremos chegado ao pan-psiquismo
e ao panteísmo.
Daí, como conseqüência, e mera conseqüência, o
quietismo na piedade. Se na piedade o indivíduo nada tem que ver, seu papel
consiste em se conservar quieto e inativo, enquanto se desenvolvem numa esfera
coletiva e impessoal os efeitos "ex opere operato" da Liturgia.
Este tópico, que é dos mais densos, ricos e
profundos desta encíclica, denuncia o parentesco entre os erros do Liturgicismo, e as tendências panteístas e socialistas das
principais correntes filosóficas de nossos tempos. Este tópico ganhará muito em
clareza, se feito um estudo conjunto da Encíclica "Mediator Dei" com a encíclica "Mystici Corporis Christi".
Esta última com efeito, quando condena os que sustentam a existência de uma
união física entre os fiéis e Jesus Cristo, denuncia a existência de um neo-panteísmo, com véus cristãos, brotado no âmago de
estudos feitos sobre a alegoria paulina do Corpo
Místico.
27. Texto da Encíclica:
Nas celebrações litúrgicas, e particularmente no augusto Sacrifício do
Altar, continua-se sem dúvida a obra de nossa Redenção e dela se aplicam os
frutos. Cristo opera a nossa salvação cada dia nos sacramentos e no seu
Sacrifício, e, por meio deles continuamente purifica e consagra a Deus o gênero
humano. Eles, pois, têm uma virtude objetiva com a qual, de fato, tornam
participantes as nossas almas da vida divina de Jesus Cristo. Eles, pois, têm
não por nossa, mas por divina virtude a eficácia de unir a piedade dos membros
à piedade da Cabeça, e de torná-la, de um certo modo, uma ação de toda a
comunidade.
Comentário da Redação:
Mostra o Papa neste tópico no que consiste a
verdadeira piedade objetiva, e que, tanto quanto a piedade subjetiva, também
ela tem por fim santificar os fiéis. Nesta declaração de piedade objetiva não
há nenhum lugar para considerações de caráter transpsicológicas.
Aliás esta piedade exige a colaboração da vontade humana ou seja da piedade
subjetiva, como o Papa dirá mais adiante.
28. Texto da Encíclica:
Destes argumentos profundos,
alguns concluem que toda a piedade cristã deve centralizar-se no mistério do
Corpo Místico de Cristo, sem nenhum cuidado pessoal e subjetivo, e por isto
consideram que se devam descurar as outras práticas religiosas não estritamente
litúrgicas, e realizadas fora do culto público.
Todos, porém, podem convencer-se
de que estas conclusões com relação às duas espécies de piedade, bem que os
supra enunciados princípios sejam ótimos, são completamente falsas, insidiosas
e perniciosíssimas.
Comentário da Redação:
Neste tópico o Papa condena a
afirmação de que não se deve ter nenhum cuidado pessoal subjetivo pela própria
santificação, ainda mesmo na Liturgia. Outrossim,
condena a idéia correlata de que as práticas de piedade privadas, que existem
inteiramente para o "cuidado pessoal e subjetivo" não devem ser
adotadas pelos fiéis.
Vê-se aí a que raiz doutrinária verdadeiramente
pestilencial se liga o tão conhecido menosprezo dos liturgicistas
para com a piedade privada, erro este denunciado por um aviso da Câmara
Eclesiástica do Rio de Janeiro e também pela Encíclica "Mystici Corporis Christi". Estes erros são classificados pelo Papa
de "falsos, insidiosos e perniciosíssimos".
29. Texto da Encíclica:
É verdade que os sacramentos e o
Sacrifício do Altar têm uma virtude intrínseca posto que são ações do próprio
Cristo que comunica e difunde a graça da Cabeça divina nos membros do Corpo
Místico; mas para que tenham eficácia devida eles exigem as boas disposições da
nossa alma. Portanto, a propósito da Eucaristia, São Paulo adverte: "Cada
um examine a si mesmo e assim coma daquele pão e beba do cálice" (30). Por
isso a Igreja define breve e claramente todos os exercícios com os quais nossa
alma se purifica, especialmente durante a Quaresma: "os presídios da
milícia cristã" (31); são de fato, as ações dos membros que com o auxílio
da graça, querem aderir à sua Cabeça para que se torne manifesta – para repetir
as palavras de Santo Agostinho – que em nossa Cabeça está a própria fonte da
graça (32).
Comentário da Redação:
Este tópico mostra a união íntima e necessária
entre a piedade objetiva e a piedade subjetiva, na própria piedade litúrgica. Com efeito, as ações de eficácia “ex opere operato”
são do próprio Jesus Cristo, e portanto, só podem ser realizadas pelo sacerdote
que o representa. A participação dos fiéis se faz pela colaboração de seu livre
arbítrio com a graça. Noção importantíssima para se compreender de que maneira
o fiel deve portar-se durante os ofícios litúrgicos.
Absolutamente não é essencial que ele pronuncie as mesmas fórmulas que o
celebrante, mas é absolutamente essencial que ele aceite as operações de
Cristo, o que ele fará mediante a correspondência do livre arbítrio com a
graça. Um fiel que se limitasse a pronunciar as mesmas fórmulas que o sacerdote
e não cuidasse de dispor sua alma para receber docilmente o influxo da graça
que procede da ação santificadora “ex opere operato”
sairia da igreja como saiu o fariseu do templo: sem nada ter aproveitado de seu
ato de piedade.
30. Texto da Encíclica:
Mas deve notar-se que estes
membros são vivos, dotados de razão e vontade próprias, portanto é necessário
que eles, aproximando os lábios à fonte, tomem e assimilem o alimento vital e
removam tudo o que possa impedir-lhes a eficácia. Deve-se pois afirmar que a
obra da Redenção, em si independe da nossa vontade, exige o esforço íntimo de
nossa alma para que possamos conseguir a salvação eterna.
Comentário da Redação:
Confirma-se a tese acima. É interessante notar o
ponto de vista em que o Papa a fundamenta: só se a Igreja não fosse constituída
de membros vivos, dotados de razão e vontade próprias, isto é, só se o
Panteísmo e o Panpsiquismo fossem verdadeiros, é que
se poderia dispensar a colaboração desses membros, no sistema vital do Corpo
Místico.
31. Texto da Encíclica:
Se a piedade privada e interna dos
indivíduos particulares descurasse o augusto Sacrifício do Altar e os
Sacramentos e se subtraísse ao influxo salvífico que
emana da Cabeça aos membros, seria, sem dúvida reprovável e estéril; mas quando
todas as providências e os exercícios de piedade não estritamente litúrgicos fixam o olhar da alma sobre os atos humanos
unicamente para dirigi-los ao Pai que está nos céus, para estimular
salutarmente os homens à penitência e ao temor de Deus e, arrancando-os à
atração do mundo e dos vícios, conduzi-los com êxito através de árduo caminho
ao vértice da santidade, tornam-se então não só sumamente louváveis, mas
necessários, porque descobrem os perigos da vida espiritual, estimulando-nos na
aquisição das virtudes e aumentam o fervor com o qual devemos dedicar-nos todos
ao serviço de Jesus Cristo.
Comentário da Redação:
O Papa mostra que a piedade individual, extra-litúrgica, é absolutamente indispensável para a
salvação. Ela constitui um complemento harmonioso e essencial da piedade litúrgica. Daí decorre que um Movimento feito única e
exclusivamente para intensificar o conhecimento da Liturgia, descurando a
piedade individual na Liturgia e fora dela, seria radicalmente errado. O
Movimento Litúrgico que o Papa quer desenvolver
abrange o estímulo à piedade privada.
32. Texto da Encíclica:
Uma vez que a piedade cristã
devidamente praticada exige sobretudo que a vontade se consagre a Deus e influa
sobre as outras faculdades da alma.
Comentário da Redação:
Note-se este princípio que domina toda a Encíclica.
33. Texto da Encíclica:
Mas todo ato de vontade pressupõe
o exercício da inteligência, e antes que se conceba o desejo e propósito de se
dar a Deus por meio do sacrifício, é absolutamente necessário o conhecimento
dos argumentos e dos motivos que impõem a religião, como, por exemplo, o fim
último do homem e a grandeza da majestade divina, o dever de submissão ao
Criador, os tesouros inexauríveis do amor com o qual Ele nos quis enriquecer, a
necessidade da graça para chegar ao fim que nos é proposto de nos dar a Deus
porque a divina Providência nos preparou unindo-nos todos como membros de um
Corpo, a Jesus Cristo, Cabeça.
Comentário da Redação:
Este tópico demonstra a importância da instrução
religiosa com caráter apologético. Condena implicitamente certa tendência anti-apologética que hoje se nota.
34. Texto da Encíclica:
E por isso que nem sempre os
motivos de amor impressionam a alma agitada pelas paixões, é muito oportuno que
nos impressione também a consideração salutar da justiça divina para nos levar
à humildade cristã, à penitência e emenda.
Comentário da Redação:
A “Mystici Corporis Christi” condena
aqueles que se opõem às pregações sobre as penas eternas. Pio XII reafirma nesta encíclica
a mesma condenação.
35. Texto da Encíclica:
Disto deriva o harmonioso
equilíbrio dos membros do Corpo Místico de Jesus Cristo. Com o ensino da fé
católica, com a exortação à observância dos preceitos cristãos, a Igreja
prepara o caminho para a sua ação propriamente sacerdotal e santificadora;
nos dispõe para uma mais íntima contemplação da vida do Divino Redentor e nos
conduz a um conhecimento mais profundo dos mistérios da Fé, para deles tirarmos
elemento sobrenatural e força para um progresso seguro na vida de perfeição,
por meio de Jesus Cristo. Não apenas por obra dos seus ministros, mas também
pela dos fiéis individuais embebidos, por este modo, do Espírito de Jesus
Cristo, a Igreja se esforça por compenetrar com este mesmo espírito a vida e a atividade
privada, conjugal, social e até econômica e política dos homens, a fim de que
todos aqueles que se chamam filhos de Deus possam mais facilmente conseguir o
seu fim.
Comentário da Redação:
É impossível maior clareza no afirmar a
interdependência indestrutível entre a piedade privada e a Sagrada Liturgia.
Desta maneira, a ação privada e o
esforço ascético dirigido para a purificação da alma, estimulam as energias dos
fiéis e os dispõem a participar com melhores disposições do augusto Sacrifício
do Altar, a receber os Sacramentos com maior fruto e a celebrar os ritos
sagrados de maneira a saírem deles mais animados e formados na oração e na
abnegação cristã, dispostos a cooperar ativamente com as inspirações e os
convites da graça e a imitar cada dia mais as virtudes do Redentor, não apenas
para vantagem própria, mas também para a
de todo o corpo da Igreja, no qual todo o bem que se realiza procede da virtude
da Cabeça e redunda em benefício dos membros.
Comentário da Redação:
O Papa descreve esta interdependência entre a
piedade privada e a Sagrada Liturgia como um fluxo e refluxo salvador: a
piedade privada dispõe para a participação mais eficaz nas ações litúrgicas, e estas, graças àquelas disposições, causam mais abundantes frutos para a
edificação da mesma piedade individual.
37. Texto da Encíclica:
Por isso, na vida espiritual, não
pode existir nenhuma oposição ou repugnância entre a ação divina, que infunde a
graça nas almas para continuar a nossa redenção, e a operosa colaboração do
homem, que não deve tornar inútil o dom de Deus (36); entre a eficácia do rito
externo dos Sacramentos que procede do valor intrínseco do mesmo (ex opere operato)
e o merecimento de quem o administra ou o recebe (ex opere operantis); entre as orações
privadas e as preces públicas; entre a ética e a contemplação; entre a vida
ascética e a piedade litúrgica; entre o poder de
jurisdição e de magistério legítimo, e o poder eminentemente sacerdotal que se
exercita no mesmo ministério sagrado.
Comentário da Redação:
O Papa enumera as antíteses falsas
e detestáveis criadas pelo Liturgicismo:
a) entre a piedade privada e a Liturgia;
b) entre a graça e o livre arbítrio;
c) entre o rito e as disposições internas;
d) entre a ação “ex opere operato” e a ação “ex opere operantis”;
e) entre a Moral e a contemplação;
f) entre a ascese e a Liturgia;
g) entre o Poder de Jurisdição e Magistério, e o
Poder de Ordem.
38. Texto da Encíclica:
Por graves motivos a Igreja
prescreve aos ministros do altar e aos religiosos que, em tempos determinados
se ocupem de piedosa meditação, diligente exame e emenda de consciência, e
outros exercícios espirituais, porque eles são, particularmente, destinados a
executar as funções litúrgicas do Sacrifício e do
divino louvor.
Comentário da Redação:
O Papa insiste em que na própria celebração dos
atos litúrgicos a piedade privada do celebrante tenha
um grande papel. Também para os fiéis vale o ensinamento.
39. Texto da Encíclica:
Sem dúvida, a oração litúrgica, sendo uma súplica pública da ínclita Esposa de
Jesus Cristo, tem uma dignidade maior do que as orações privadas; mas essa superioridade não quer dizer que
entre estes dois gêneros de oração haja contraste ou oposição. Ambas se fundem
entre si e se harmonizam porque são amimadas por um único espírito: “tudo e em
todos Cristo” e tendem ao mesmo fim: que Cristo seja formado em nós.
Comentário da Redação:
A tão alegada e tão verdadeira preeminência da
Liturgia não justifica o desprezo para com a piedade privada.