Os comentários
contrários ao fechamento do Partido Comunista têm obedecido a dois moldes principais. Uns, manifestamente inspirados por
sentimentos esquerdistas, reeditam as velhas tiradas em favor da liberdade de
pensamento absoluta e incondicional: não impressionam à opinião católica, e por
isto não merecem ser comentados nesta folha. Outros, porém são mais sutis,
aparentam zelos pela civilização cristã,
e dão a impressão de objetivar apenas o esmagamento do comunismo: estes
podem seduzir os católicos menos avisados, e por isto merecem ser analisados
pela imprensa especificamente católica. Em
nosso artigo de hoje, queremos refutar duas alegações deste ultimo tipo,
que nos parecem particularmente
capciosas.
* * *
Diz-se - e até na imprensa
norte-americana estes comentários repercutiram - que o fechamento do PCB não
extinguirá o partido, mas o atirará ao terreno da clandestinidade. Assim, a
polícia perderá o controle das atividades comunistas, e ficará na
impossibilidade de prevenir com eficácia um possível golpe vermelho. Melhor
fora, pois, que as atividades comunistas se desenvolvessem à luz do sol.
Nada conheço de mais ingênuo.
Resolvamos o problema preliminar: se o PC não fosse
fechado, os comunistas pensariam em desfechar um golpe, ou não?
A resposta não pode deixar de ser afirmativa. Não
houve um só país em que os comunistas tivessem a paciência de aguardar um
resultado eleitoral favorável para subir ao poder, sempre que puderam, saltaram
espontaneamente do terreno da legalidade, tentando à mão armada, a escalada dos
postos de mando. Não há o menor motivo para imaginar que no Brasil eles se
mostrariam menos sôfregos de vencer, e menos violentos na escolha de seus
métodos.
Assim, existe a máxima probabilidade de que também
no Brasil o PC tenda para desfechar um golpe, mais cedo ou mais tarde.
Se esta é sua intenção, seremos de uma ingenuidade
sem par, imaginando que o comunismo iria tramar seu golpe sem as necessárias
precauções pela simples razão de que tem autorização legal para funcionar à luz
do sol. Só porque a lei lhe dá o direito
de viver às claras, o PC iria planejar às claras o seu golpe, ou tomar menos
cautela do que se fosse clandestino? Para quem conhece o sumo cuidado, a
suma maestria, a técnica apuradíssima com que os
comunistas conspiram, tal idéia é inadmissível.
O simples fato de possuir um movimento legal não
levaria os comunistas a se embaraçarem na conspirata,
ou a cometer erros de técnica.
Pelo contrário, salta aos olhos que sua organização
legal seria - e tem sido - um meio comodissimo [meio]
de despistar a polícia, dando aspecto normal a atividades muito perigosas.
Assim, a ida e vinda de mensageiros confidenciais,
a permuta de correspondência postal e telegráfica cifrada, etc., etc., são
atividades normais de todo o partido político, atividades estas que a polícia
não pode impedir. Quanta ocasião, para os comunistas, para conspirar
comodamente!
E ainda há ingênuos que pensam que, cumulando os líderes
do PC de imunidades e garantias, e dando a seus asseclas plena liberdade e
garantias, e dando plena liberdade de movimentos, se prejudicam as conspirações
comunistas!
A outra alegação é de que a repressão policial, em
lugar de fazer mal às ideologias ou partidos por ela visados, só os beneficia.
E argumenta-se com o exemplo da Igreja, que se desenvolveu celeremente
sob o látego das perseguições.
A seguir
este raciocínio, Stalin e seus adeptos já
estariam a caminho da ruína. Com efeito, se uma perseguição tanto mais prejudica o
perseguidor, quanto mais ela é longa e dura, tão longe tem sido, e tão dura a
perseguição, que os perseguidores russos já deveriam estar no chão e os
perseguidos no poder.
Argumentar
com o exemplo da Igreja é ridículo. A Igreja não se sente bem sob as perseguições e,
se ela floresceu durante a tempestade, não é porque na ordem natural das coisas
a perseguição lhe seja um clima propício.
Pelo contrário, os apologistas consideram a
perseguição tão nociva que atribuem a um milagre a Igreja ter florescido, não
obstante a ela.
Entender que os comunistas também se dariam melhor
quando perseguidos é, pois, admitir que Deus faria por eles um milagre que fez
pela Santa Igreja.
Há algo de mais absurdo?
* * *
Aliás, isto tudo é simplesmente ridículo! Só em
nossa época se pode sustentar descaradamente que a liberdade faz mal ao
adversário, e a coerção lhe faz bem.
Seria o caso de pleitear liberdade para associações
de gatunos ou assassinos, sob pretexto de facilitar a repressão da polícia.
Se na
Rússia um jornal sugerisse a Stalin que desse
liberdade ao adversário do regime, no interesse deste, e em detrimento da
oposição, para que fundo da Sibéria iria?
Mas isto
que na Rússia pareceria estapafúrdio e subversivo, no Brasil parece normal e
lógico, não só aos comunistas, mas a muitos inimigos ingênuos do PC.