Legionário,  n.° 772, 25 de maio de 1947

AINDA  O  FECHAMENTO  DO  PCB

Os comentários contrários ao fechamento do Partido Comunista têm obedecido a dois moldes principais. Uns, manifestamente inspirados por sentimentos esquerdistas, reeditam as velhas tiradas em favor da liberdade de pensamento absoluta e incondicional: não impressionam à opinião católica, e por isto não merecem ser comentados nesta folha. Outros, porém são mais sutis, aparentam zelos pela civilização cristã, e dão a impressão de objetivar apenas o esmagamento do comunismo: estes podem seduzir os católicos menos avisados, e por isto merecem ser analisados pela imprensa especificamente católica. Em nosso artigo de hoje, queremos refutar duas alegações deste ultimo tipo, que nos parecem particularmente capciosas.

*   *   *

Diz-se - e até na imprensa norte-americana estes comentários repercutiram - que o fechamento do PCB não extinguirá o partido, mas o atirará ao terreno da clandestinidade. Assim, a polícia perderá o controle das atividades comunistas, e ficará na impossibilidade de prevenir com eficácia um possível golpe vermelho. Melhor fora, pois, que as atividades comunistas se desenvolvessem à luz do sol.

Nada conheço de mais ingênuo.

Resolvamos o problema preliminar: se o PC não fosse fechado, os comunistas pensariam em desfechar um golpe, ou não?

A resposta não pode deixar de ser afirmativa. Não houve um só país em que os comunistas tivessem a paciência de aguardar um resultado eleitoral favorável para subir ao poder, sempre que puderam, saltaram espontaneamente do terreno da legalidade, tentando à mão armada, a escalada dos postos de mando. Não há o menor motivo para imaginar que no Brasil eles se mostrariam menos sôfregos de vencer, e menos violentos na escolha de seus métodos.

Assim, existe a máxima probabilidade de que também no Brasil o PC tenda para desfechar um golpe, mais cedo ou mais tarde.

Se esta é sua intenção, seremos de uma ingenuidade sem par, imaginando que o comunismo iria tramar seu golpe sem as necessárias precauções pela simples razão de que tem autorização legal para funcionar à luz do sol. Só porque a lei lhe dá o direito de viver às claras, o PC iria planejar às claras o seu golpe, ou tomar menos cautela do que se fosse clandestino? Para quem conhece o sumo cuidado, a suma maestria, a técnica apuradíssima com que os comunistas conspiram, tal idéia é inadmissível.

O simples fato de possuir um movimento legal não levaria os comunistas a se embaraçarem na conspirata, ou a cometer erros de técnica.

Pelo contrário, salta aos olhos que sua organização legal seria - e tem sido - um meio comodissimo [meio] de despistar a polícia, dando aspecto normal a atividades muito perigosas.

Assim, a ida e vinda de mensageiros confidenciais, a permuta de correspondência postal e telegráfica cifrada, etc., etc., são atividades normais de todo o partido político, atividades estas que a polícia não pode impedir. Quanta ocasião, para os comunistas, para conspirar comodamente!

E ainda há ingênuos que pensam que, cumulando os líderes do PC de imunidades e garantias, e dando a seus asseclas plena liberdade e garantias, e dando plena liberdade de movimentos, se prejudicam as conspirações comunistas!

A outra alegação é de que a repressão policial, em lugar de fazer mal às ideologias ou partidos por ela visados, só os beneficia. E argumenta-se com o exemplo da Igreja, que se desenvolveu celeremente sob o látego das perseguições.

A seguir este raciocínio, Stalin e seus adeptos já estariam a caminho da ruína. Com efeito, se uma perseguição tanto mais prejudica o perseguidor, quanto mais ela é longa e dura, tão longe tem sido, e tão dura a perseguição, que os perseguidores russos já deveriam estar no chão e os perseguidos no poder.

Argumentar com o exemplo da Igreja é ridículo. A Igreja não se sente bem sob as perseguições e, se ela floresceu durante a tempestade, não é porque na ordem natural das coisas a perseguição lhe seja um clima propício.

Pelo contrário, os apologistas consideram a perseguição tão nociva que atribuem a um milagre a Igreja ter florescido, não obstante a ela.

Entender que os comunistas também se dariam melhor quando perseguidos é, pois, admitir que Deus faria por eles um milagre que fez pela Santa Igreja.

Há algo de mais absurdo?

*   *   *

Aliás, isto tudo é simplesmente ridículo! Só em nossa época se pode sustentar descaradamente que a liberdade faz mal ao adversário, e a coerção lhe faz bem.

Seria o caso de pleitear liberdade para associações de gatunos ou assassinos, sob pretexto de facilitar a repressão da polícia.

Se na Rússia um jornal sugerisse a Stalin que desse liberdade ao adversário do regime, no interesse deste, e em detrimento da oposição, para que fundo da Sibéria iria?

Mas isto que na Rússia pareceria estapafúrdio e subversivo, no Brasil parece normal e lógico, não só aos comunistas, mas a muitos inimigos ingênuos do PC.