Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

"Dominus conservet eum"

 

 

 

 

 

Legionário,  n.° 768, 27 de abril de 1947

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No primeiro dia do mês dedicado a Nossa Senhora, em uma Igreja consagrada a Nossa Senhora, o grande apóstolo, que é o Monsenhor Geraldo Proença Sigaud, receberá a plenitude do Sacerdócio das mãos veneradas do embaixador do Santo Padre.

Falar do Sacerdócio é falar da Eucaristia. A Sagrada Eucaristia, Nossa Senhora, o Papa são as três grandes devoções do Monsenhor Sigaud. Na essência e nas circunstâncias do ato augusto que no dia 1o se realizará, reuni-se tudo aquilo por que arde e que vive aquele coração sacerdotal. Podemos, pois, imaginar os sentimentos que o fazem vibrar, nestes dias de vigília e preparação que Monsenhor Sigaud está passando no Seminário do Espírito Santo.

Ascender ao Principado espiritual da Igreja de Jesus Cristo, receber a dignidade de sucessor dos Apóstolos, responder perante Deus pela salvação de dezenas de milhares de almas, cada qual tão preciosa que Nosso Senhor teria vindo ao mundo e teria padecido tudo quanto padeceu ainda que se tratasse de salvar uma só delas: não é isto subir as alturas vertiginosas, mais próprias a Anjos do que a homens?

Vista com os olhos da Fé, a missão do bispo empolga por sua sublimidade, mas desnorteia por sua grandeza. É bem compreensível que muitos santos dela tenham fugido espavoridos, e que outros a tenham exercido com temor e tremor. Contou-nos Monsenhor Sigaud que só decidiu a aceitar o munus do Episcopado depois de haver solicitado o auxílio divino celebrando o Santo Sacrifício da Missa. Com efeito, é necessária uma confiança sem limites na ação da graça, para que se resolva uma alma a responder com um fiat ao convite honroso do Santo Padre.

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Para grandes cargos, os homens de escol. É bem compreensível que para funções de tão suprema importância na Cristandade, a Igreja escolha a mais fina flor de seus filhos.

Os jornais, com seu contínuo e estéril revolver de questões políticas e econômicas, com seu triste hábito de considerar todas as coisas do ponto de vista meramente material, de tal maneira desvirtuam e deformam as verdadeiras perspectivas da vida que, se é fácil fazer compreender que a alguém que dirija finanças ou política, precisa de grandes qualidades, muito difícil é fazer compreender que alguém que diri...[erro tipográfico] supremo a dignidade episcopal. Entretanto assim é.

O bispo deve ter vista longa. Deve ser atilado, e ver continuamente em torno de si: é mesmo isto, que significa etimológicamente a palavra episcopus. Ler nas almas, ler nos corações, discernir o curso das idéias através das escolas literárias, artísticas e científicas que continuamente se vão formando, ou transformando, observar com penetração a evolução dos costumes, fiscalizar a educação, proteger os lares, amparar os fracos, prestigiar a autoridade, punir os maus, abrir esperança para os transviados, reconciliar os adversários, intimidar a protervia dos ímpios, consolar os que sofrem, e velar pelos doentes, pregar a palavra de Deus, ministrar os sacramentos, celebrar o Sacrifício, promover o esplendor do culto, tudo isto é tarefa do bispo, e a tarefa do bispo está longe de consistir só nisto. Toda a inteligência, todo o tacto, todo o zelo, toda piedade, toda instrução, todo o denodo, toda a operosidade, toda a abnegação de que seja capaz um homem, deve o bispo empenhá-la no seu ministério. E para a empenhar, é preciso que a possua. Não é difícil compreender, assim, até que ponto a Igreja se esmera em formar seus sacerdotes para que auxiliem dignamente os bispos e escolher os bispos entre os seus melhores sacerdotes.

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Tudo isto dito e pesado, esperamos com júbilo no coração, a sagração episcopal de Monsenhor Sigaud. Porque, por mais alta e terrível que seja a função, há em Monsenhor Sigaud toda a fibra intelectual e moral necessária para tão sublime dignidade. De um homem não se poderia dizer mais nem melhor: nós os dizemos com o coração a transbordar de esperança, e S. Paulo, todo o Brasil católico o proclama juntamente conosco. Se cuidarmos de fazer um paralelo entre os deveres de um bispo e as qualidades de Monsenhor Sigaud, lembramo-nos da frase de Mazarino sobre Luís XIV: "há neste monarca estofo para quatro reis".

Em Monsenhor Sigaud encontra-se tudo quanto o povo brasileiro tem de bom. E não lhe falta, a realçar estas qualidades, a nota distintiva do gênio francês.

  Aumentemos a alegria destes dias de festa, rememorando rapidamente as qualidades de que se alimenta nossa certeza. Inteligência clara, fácil, alada, Monsenhor Sigaud possui ao par de uma aptidão surpreendente para questões meramente doutrinárias, a capacidade sutil de distinguir e subdistinguir, tão característica dos filhos das Alterosas. Do patrimônio espiritual mineiro lhe veio, ainda, um espírito de observação penetrante e discreto, ligeiramente fechado e precavido. Uma forte propensão para os assuntos relacionados com a arte - com todas as artes - lembra nele a ascendência francesa. Se não por hereditariedade ao menos por osmose, à força de viver na terra paulista e de a amar, Monsenhor Sigaud, se fez paulista: na nobreza varonil do porte, na alta e forte estatura, na distinção do gesto e da fisionomia, no gênio resoluto, no amor as atitudes desassombradas e claras, há nele muita coisa que lembra o maior, o mais genuíno dos paulistas de nosso século, que foi D. Duarte Leopoldo e Silva.

Este particular merece atenção. Há comentadores pessimistas que julgam que o brasileiro é necessariamente fraco, inconstante, acomodatício. Nas fileiras de nosso episcopado, encontramos exemplos admiráveis para demonstrar precisamente o contrário. D. Vital Maria Gonçalves de Oliveira, D. Duarte Leopoldo e Silva foram modelos de intrepidez e firmeza, de combatividade e de santa audácia. Monsenhor Sigaud é desta têmpera. Tudo se pode dele esperar em matéria de verdadeira e indomável grandeza de alma.

Quando a graça e a unção do Espírito Santo baixarem sobre Monsenhor Sigaud no momento memorável da sagração, baixarão sobre um filho dos mais primorosos engendrados pelo povo brasileiro para a glória de Deus.

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Como terminar estas considerações? Por uma ação de graças, e por uma súplica. Ação de graças porque Deus fez ao Brasil o dom de um tal filho, e à Igreja o dom de um tal bispo. Súplica, a súplica litúrgica que a Igreja formula pelos seus bispos: Dominus conservet eum et vivificet eum, et beatum faciat eum in terra. Que o Senhor o conserve, o vivifique, e o faça feliz nesta terra, e por toda a eternidade.


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