Legionário, Nš 709, 10 de março de 1946

O discurso do Sr. Winston Churchill

Parece-nos que nem todos os comentaristas estão dando o devido significado ao discurso do Sr. Winston Churchill. Sem dúvida, a franqueza das palavras do grande estadista clarearam os horizontes, mostrando de modo evidente e sensível, a gravidade de uma situação que de todos os lados se procurava velar. Neste sentido, o discurso realmente representou algo de novo e de sensacional. Digamos, mesmo, que tenha sido combativo, se for "combativa" a atitude de quem faz um longo inventário de todos os riscos que corre, e prejuízos que sofre. Como se fosse combativo o cordeiro que se queixasse das injúrias e ameaças que sofre do lobo.

Excetuado este aspecto, entretanto, o discurso do Sr. Churchill nada teve de combativo.

Muito pelo contrário, ele constitui antes de tudo um apelo para um entendimento entre a URSS e as potências ocidentais.

Com efeito, o Sr. Churchill mostrou toda a extensão do perigo, mas apontou, como remédio de primeira plana, uma reunião em que, claramente, as potências do "big-tree" digam o que querem. Esta reunião, de duas uma: ou traria como conseqüência um entendimento, ou o mundo inteiro ficaria sabendo que esse entendimento não é possível, e porque não é ele possível.

Clareando assim o horizonte, é bem evidente que as democracias ocidentais saberiam como agir.

É muito duvidoso que, aliada a Grã-Bretanha aos EUA, e estando o segredo da bomba atômica de posse das duas nações anglo-saxônicas, ainda persistisse qualquer veleidade da URSS em enfrentar o imenso bloco do mundo inteiro coligado.

Diplomacia em primeira linha, firmeza em segundo lugar, eis a receita que Winston Churchill preconiza.

Se esta receita tivesse sido utilizada pelo Sr. Chamberlain não teríamos tido esta guerra. Se agora, em vez do "tratamento" à Churchill, tivermos um novo Munique, será inevitável que descambemos para uma nova guerra.

É muito provável que se os avestruzes pensassem não estariam de acordo com a política preconizada pelo Sr. Churchill, eles que escondem a cabeça nas asas, para "eliminar" o perigo que têm diante dos olhos. A nosso ver, o Sr. Churchill se portou como verdadeiro pacifista. Pacifista do pacifismo viril, inteligente, forte, que é o pacifismo dos que querem viver. E não pacifismo covarde, mole, tateante, dos que querem apenas vegetar.

* * *

Mas o discurso do Sr. Churchill não tem apenas este aspecto estritamente diplomático e internacional. Ele tem um reflexo direto na política de todos os países, no que concerne a sua situação interior.

Com sua larga experiência de estadista, o Sr. Churchill denuncia francamente os comunistas de todos os países, como constituindo uma quinta coluna, a serviço dos desígnios do imperialismo da URSS no mundo inteiro.

Infelizmente, se confirma assim o que reiteradamente tem sustentado o LEGIONÁRIO. Mas a nós não basta o reconhecimento de que tínhamos razão. É preciso caminhar para a frente. Posto o fato de que é esta a natureza dos vários Partidos Comunistas, como agir?

O problema é muito grave, envolvendo desde logo aspectos jurídicos e políticos verdadeiramente espinhosos. Em tese, a questão nem sequer se poria, dentro do quadro doutrinário em que se move esta folha. O comunismo não tem o direito de existir à face do sol. Mas a questão é que qualquer golpe de momento contra o comunismo poderia trazer reflexos delicadíssimos na situação nacional. Assim, por exemplo, o que se faria da bancada comunista na Constituinte? Quem não percebe que a própria existência do poder legislativo está envolvida, de um ou de outro modo, nesta pergunta?

Abstemo-nos de qualquer conselho ou vaticínio. Uma coisa, porém, é verdadeira. A luta contra o comunismo deve ser mais rija, mais clara, mais irredutível do que nunca. Só assim evitaremos que se acentue no Brasil um perigo sobre cuja verdadeira natureza e gravidade as palavras de Churchill não permitem mais dúvidas de nenhuma espécie.