Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Anima Christi, sanctifica-nos

 

 

 

 

 

Legionário, N.º 635, 8 de outubro de 1944

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Talvez não haja entre todas as orações compostas por mente de homem, uma que supere o “Anima Christi”. Em deliciosa intimidade, em confiante e terníssimo respeito, em clareza de sentido e esplêndida riqueza de substância, só conheço, que se lhe iguale, a Salve Rainha e “Memorare (Lembrai-Vos).

Compõe-se o “Anima Christi” de doze súplicas que podemos dividir em duas partes bem distintas. Nas sete primeiras, o fiel cristão considera o Corpo e Alma de Nosso Senhor Jesus Cristo, aproxima-se dEle tão e tão de perto, que se tem a impressão de sentir o próprio calor do Corpo Divino, de tocar real e verdadeiramente nossos lábios penitentes, nas dulcíssimas chagas do Redentor. Quando imagino São Francisco de Assis, na famosa visão em que o Crucificado o abraçou, imagino-o balbuciando em êxtase, uma a uma, as sete primeiras súplicas do Anima Christi, e não se fartando de as repetir durante todo o tempo que durou a glória e a doçura do divino amplexo. Na segunda parte da prece, a alma já não está de pé, abraçada ao Redentor. Cessou o êxtase, e o fiel está ao pé da Cruz, exprimindo seus últimos e mais ardentes anelos numa humildade divina, como Maria, depois de se ter apartado a angélica visitação.

Ora, é muito de se notar que, o programa de nosso novo Arcebispo se compõe precisamente de sete “itens”, como são sete as súplicas mais ardentes e mais íntimas do “Anima Christi”. E, entre cada item e cada súplica, pode-se facilmente estabelecer uma esplêndida analogia.

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O primeiro item do programa é “a propaganda e defesa da Fé e da moral do Evangelho, mediante a catequese”.  A primeira súplica é “Anima Christi sanctifica”.

A Alma de Cristo! Onde melhor a podemos conhecer senão no Santo Evangelho? Cada palavra, cada cena, cada gesto dos livros sagrados contém para nós uma revelação da santíssima alma de Nosso Senhor Jesus Cristo. Daquela Alma que, sendo a própria perfeição da alma humana e estando em ligação hipostática com a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, é um abismo infinito de sabedoria e santidade, é o exemplar perfeito e supremo do ideal de nossa santificação. A Alma de Cristo! Aquela Alma infinitamente nobre e grande, que abarcava o Céu e a Terra em um anelo incessante de santificar os homens para a glória de Deus. Aquela Alma bendita, de um amor nobre, casto e delicado, de um amor ardente e discreto, meigo até os maiores extremos de ternura, e forte como o bronze, aquela Alma que é o sol divino de nossas almas, a própria alma de nossas almas, aquela Alma não consentiria em nos abandonar depois da Ascensão. Ele não trairia sua promessa de continuar a viver entre nós. E, por isto, ela está sempre entre nós presente, realmente presente no Mistério Eucarístico em que recebemos a Cristo com seu Corpo e Sangue, alma e Divindade. E presente ainda pela Santa Igreja Católica, cuja doutrina contém o sentido verdadeiro dos Santos Evangelhos e é, pois, o espelho divinamente fiel da própria Alma de Cristo.

Se queremos adorar a Alma de Cristo, amemos a doutrina católica. crendo no que a Igreja crê, pensando como Ela pensa, sentindo como Ela sente, é em certo sentido a própria Alma de Cristo que baixa em nossa alma e a santifica, como é o próprio sol que baixa na água, quando a toca com seus raios e a ilumina.

Mas como podemos crer no que ignoramos? Como é possível enriquecer nossa alma com todos os tesouros contidos em dogmas que não conhecemos? Como é possível que pratiquemos uma moral cujos preceitos não sabemos?

É pela instrução religiosa, adquirida no estudo catequético e desenvolvida durante toda a sua existência, que o fiel pode realmente conformar sua alma com a de Cristo, rezar em toda a verdade de seu coração a jaculatória admirável: “Anima Christi, sanctificame”.

E, quando Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota inscreveu a instrução catequética como o primeiro item de seu programa, seu ato equivalia a uma verdadeira prece: “Anima Christi, sanctifica populum meum”.

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Não há santificação possível para o fiel que ignore a verdade de sua Fé. Mas este conhecimento da verdade por si só não basta. Sem a vida sacramental os fiéis não se salvam. No mais íntimo de nosso ser estão os frutos amargos do pecado original. Sombras intelectuais de toda ordem, vícios, defeitos de toda espécie lançaram raiz em nós. E, cada vez que consideramos honestamente nossos deveres, sem mutilações nem diminuições, há alguma coisa que tenderia a clamar em nós: “durus est hic sermo”, são duras estas palavras.

Quanta e quanta vez, a pobre criatura humana desfalece sob o peso do dever, e tende a se subtrair ao jugo da moral? Não há homem algum que sem o auxílio sobrenatural da graça consiga praticar de modo durável todos os mandamentos. É preciso, pois, que a instrução se complete pela vida, que as verdades conhecidas se transformem em ato. E, para isto, só há um caminho verdadeiro, que é a vida interior.

A vida interior, sim, e isto quer dizer o cultivo esmerado de todas as virtudes, a guerra declarada, metódica, sem tréguas a todos os defeitos. Este ideal não se consegue sem vida sacramental. É por meio das orações e dos sacramentos, que o homem obtém as forças necessárias para praticar a virtude. Receber os sacramentos, recebê-los “condignamente” – esta palavra está muito marcada no texto arquiepiscopal – é o meio de alcançar a Vida. E, insensivelmente, nosso pensamento se volta para as palavras do Evangelho: “quem não comer deste Pão, quem não beber deste Vinho, não terá a vida eterna.”

Assim, pois, o segundo item do programa de nosso Arcebispo contém um pensamento eucarístico importantíssimo. Unidos em espírito com ele imploramos desde já do Santíssimo Sacramento a realização de seus desejos. E com que palavras? Que palavras melhores do que estas: “Corpus Christi, salva nos”?


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