Em nossa "Página da Ação Católica"
transcrevemos um discurso de S. Excia. Revma., o Sr. D. Jaime de Barros Câmara, Arcebispo Metropolitano do Rio de Janeiro,
acerca das Congregações Marianas. As diretrizes sábias, claras, firmes, do
sucessor de Dom Sebastião Leme constituem um fecundo tema de meditação para os
católicos, e máxime para os Congregados Marianos do Brasil inteiro.
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O novo Arcebispo do Rio de Janeiro começou sua
oração aos marianos lembrando o extraordinário
carinho que lhes tinha o Cardeal Dom Leme, de inesquecível memória e, especialmente, a piedade
comovedora de que o pranteado Prelado deu provas exigindo, à hora da morte, sua
fita azul de Congregado Mariano, para com ela comparecer ante o Tribunal de
Deus.
Andou com raro acerto o Exmo.
Revmo. Sr. Dom Jaime de Barros
Câmara, rememorando estes fatos. Eles constituem, para os Congregados Marianos, jóias de sumo valor no escrínio de suas nobres
tradições, incentivo sempre fecundo e sempre novo, para uma perfeição interior
e uma fecundidade apostólica cada vez mais intensas.
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Os que têm estado ultimamente no Rio de Janeiro contam a impressão
profunda que tem deixado em todas as Paróquias da Capital do país as visitas
pastorais empreendidas pelo Exmo. Revmo.
Sr. Dom Jaime Câmara. O pastor se mostra nelas com toda a amplitude de seu zelo
vigoroso, claro, ardente. Refratário a palavrório meramente protocolar, a exterioridades vãs, Dom Jaime Câmara é um partidário
resoluto da ação direta, fecunda, despretensiosa mas realmente capaz de atrair
almas a Nosso Senhor Jesus Cristo.
Por isto mesmo, quer ver tudo, analisar tudo, e
entrar em contato direto com os paroquianos. Causou, por exemplo, geral
edificação vê-lo dar pessoalmente aulas de Catecismo às criancinhas das
paróquias, meio muito mais adequado para incutir o respeito e o amor ao Bispo,
e ao mesmo tempo inculcar a urgência, sublimidade e nobreza do ensino catequético, do que um longo discurso de horas inteiras.
Esse anseio de resultados bem tangíveis e úteis
inspirou o primeiro princípio enunciado em seu discurso: as Congregações
Marianas não devem ser um movimento de elite social.
Com efeito, quem imaginasse que o apostolado
católico deve penetrar em uma só das classes sociais, faria prova de uma visão
singularmente desfigurada dos verdadeiros problemas de nossos dias e de todos
os tempos. Nosso Senhor veio para salvar todos os homens, e não apenas alguns.
Como, pois, explicar que a preferência do apostolado vá exclusivamente para
alguns, e não se estenda a todos?
Neste sentido, cumpre confessar que não faltam
pessoas que perdem todo senso de equilíbrio. Ou focalizam de tal maneira a
necessidade de um apostolado nas altas classes sociais, que se tem a impressão
de que para elas o resto do mundo não existe. Outras, pelo contrário, de tal
maneira se engolfam no trabalho pela conversão do operariado, que parecem por
vezes considerar desperdiçado qualquer tempo gasto em evangelizar os
intelectuais. Não deve ser assim o verdadeiro apostolado, que guarda em tudo o
senso das proporções. Nas fileiras católicas, o aristocrata, o burguês, o
operário, têm cada qual seu lugar. A Igreja não fecha os olhos nem os braços a qualquer
classe; deseja cristianizar a todas elas fazendo com que, cada qual na esfera
própria, trabalhe pela glória de Deus e pelo Reino de Cristo, Nosso Senhor.
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Em íntima conexão com este sentido de
universalidade do apostolado católico, se encontra outro princípio fecundíssimo, que o Exmo. Revmo. Sr. Dom Jaime Câmara anuncia em seu discurso: nas
Congregações Marianas há lugar para as pessoas de todos os estados ou idades.
Entretanto, neste como em qualquer outro assunto, a
Santa Igreja não deseja confusão. Há lugar para todos os estados e idades, é
certo. Mas nem para todas as idades, nem para todos os estados compete o mesmo
lugar. Assim, uns são os problemas, as preocupações, as lutas do adolescente,
outros os do homem adulto, outros os dos meninos. Como poderá ser possível
ministrar utilmente uma formação a elementos tão heterogêneos, em uma mesma
reunião?
Para falar a povos de idiomas diferentes, os
Apóstolos precisaram do milagre de Pentecostes. Para falar com eficácia a
pessoas de idades e problemas tão diversos, não seria preciso um milagre muito
menor. Com efeito, se se tratasse de uma simples
reunião, a evocação dos temas capazes de trazer proveito às almas católicas de
qualquer idade ou situação poderiam ser tratados utilmente diante de todos. Mas
formar é coisa muito mais alta e complexa do que fazer uma ou outra reunião.
Formar é unir a alma à Igreja Católica,
retificando, sanando, elevando tudo quanto nela possa haver de desviado,
enfermiço, baixo. Para isto, é preciso que os problemas peculiares a cada alma
sejam considerados de modo concreto e minucioso. Em uma reunião de almas afins
pelos problemas, deveres e preocupações que têm, esta tarefa é possível, se
completada pela direção espiritual. Mas, como pretender realizá-la em um ambiente
heterogêneo, em que inevitavelmente uma parte bocejará sempre que o assunto se
ajustar de modo estrito, particular, direto, aos problemas peculiares à outra
parte?
É precisamente por isso que o Sr. Arcebispo do Rio
de Janeiro dá a seus marianos uma palavra de ordem
formal: instituir Congregações para os vários estados ou idades, ou, pelo
menos, em cada Congregação fundar seções especializadas para estas diferentes
categorias.
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O Exmo. Revmo. Sr. Dom Jaime de Barros
Câmara também definiu em sua alocução outro princípio verdadeiramente de ouro:
"um critério seguro e rígido na escolha dos elementos que aspiram a fita
de Nossa Senhora".
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Em nossa última edição, tivemos ocasião de
mencionar com satisfação que São Paulo começa a aproveitar
da presença de um homem verdadeiramente providencial entre nós, que é o Revmo. Sr. Pe. Walter Mariaux, diretor do Secretariado Geral das Congregações Marianas
em Roma. Formador emérito, que tem realizado no campo mais restrito do Colégio
São Luís verdadeiras
maravilhas, seu aproveitamento em escala mais larga para a formação dos
congregados marianos em geral produzirá resultados
que serão para São Paulo um benção de Nossa Senhora.
As palavras do ilustre Arcebispo do Rio de Janeiro
constituem indiretamente um verdadeiro estímulo para que os Congregados de São
Paulo se sirvam dessa ocasião única, que o Revmo. Sr.
Pe. Agostinho Mendicute em muito boa hora
acaba de lhes franquear. Com efeito, sempre que se fala em seleção de membros
para a A.C. ou para as associações auxiliares, como por exemplo as Congregações
Marianas, tem-se a impressão de que com tanta seleção nada vai por
diante. Com efeito, selecionando-se, ninguém entra. Não entrando, o movimento
se estiola. Estiolando-se, morre.
É óbvio que toda seleção, por rigorosa que seja,
precisa ser entendida em termos de bom senso. Mas é mister que a seleção
exista, e que seja autêntica, isto é, que produza uma verdadeira depuração de
elementos imprestáveis.
E com isto a associação não morre: dá prova de
vitalidade. Com efeito, a seleção depauperaria se a organização não soubesse
formar seus membros. Mas, toda organização apostólica que queira ter títulos
para vencer no apostolado deve, antes de tudo e acima de tudo, saber formar.
Como poderá pretender reformar o mundo inteiro uma organização que não sabe
reformar seus próprios membros? É muitíssimo desejável que os Congregados ou
membros da A.C. sejam numerosos. O que não é desejável é que a organização
forme tão pouco, ou tão mal, que para que sejam numerosos seus membros, ela os
deva aceitar dignos ou indignos, suficientes ou insuficientes. Que se diria de
um organismo em que os rins deixassem de filtrar, sob pretexto de que com isto
se depaupera o sangue?
Seleção razoável, mas séria, eficaz, pressupondo
formação metódica, profunda, forte, que mais pode desejar uma organização?
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Vale para os Congregados e em geral para os
católicos do Brasil inteiro o apelo ardente do Arcebispo do Rio de Janeiro para
que combatam os abusos das modas, dos cassinos, das praias. Ainda está vivo o
eco das palavras eloqüentes do Episcopado Paulista, levantando-se especialmente contra a desordem dos
cassinos. São palavras que não prescrevem, e às quais as declarações do Sr.
Arcebispo do Rio de Janeiro vêm dar nova e mais palpitante atualidade. O
apostolado não é um pacto do católico com o mal que há no mundo. É um repúdio
de todo mal. E repúdio de viseira erguida. Na luta caridosa mas desassombrada
contra estes desmandos, há para todo católico um grave dever.
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Mas o Sr. Arcebispo do Rio de Janeiro lembra muito
bem que essa reforma do mundo começa por ser uma reforma de nós mesmos. É por
aí que se deve começar todo apostolado. Somos antes de tudo apóstolos de nós
mesmos. Sem vida interior, sem piedade sólida e profunda, sem verdadeira
instrução religiosa, não há apostolado fecundo. É aí que se encontra, como bem
escreveu D. Chautard, em seu livro "Alma de todo o Apostolado", a raiz verdadeira de todos os triunfos
apostólicos. E foram neste sentido as palavras finais da alocução do atual
Arcebispo do Rio.
Compreende-se, depois de tudo isto, que eqüivale em
uma vigorosa afirmação do muito que a Autoridade Eclesiástica espera e deseja
dos Congregados Marianos, que S. Excia.
Revma. afirme que "é com imenso prazer que vê em
suas visitas pastorais pelos subúrbios, pelas paróquias pobres da metrópole,
sempre o Congregado Mariano solícito, ativo, dinâmico, realmente empenhado em
ajudar em tudo ao Vigário nas cerimônias da Paróquia. S. Excia
aplaude e mais que isto sugere que se fundem novas Congregações naquelas
paróquias que ainda não as têm.
São esses os votos expressos pelo Sumo Pontífice
Pio XII na Carta "Com Particular Complacência", dirigida ao
Cardeal Dom Sebastião Leme sobre o assunto.
Esses devem ser, pois, também os votos do todos os leitores do LEGIONÁRIO, que
devem rezar ardentemente neste sentido.
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E uma observação final. O estilo é o homem, diz-se.
Procurem nossos leitores esse discurso, que hoje publicamos; tantos princípios
de ouro estão contidos em uma alocução rápida, pequena, sem um só floreio
inútil de vã oratória. É bem uma imagem da alma do novo Arcebispo do Rio,
desejoso antes de tudo e acima de tudo de resultados práticos, de enunciar
verdades substanciosas, de dar diretrizes precisas, porque é nisso que se pode,
essencialmente, conseguir em matéria de apostolado a maior glória de Deus.