Legionário, N.º 529, 27 de setembro de 1942

7 Dias em Revista

Tendo a Junta Arquidiocesana da Ação Católica telegrafado ao Eminentíssimo Senhor Cardeal Arcebispo do Rio de Janeiro apresentando-lhe os melhores votos de pronto restabelecimento, recebeu de Sua Eminência a seguinte resposta:

“À querida Ação Católica e seu digno Presidente com muitas bênçãos agradeço votos e preces”. Cardeal Arcebispo.

Supérfluo será que [observemos] a nossos leitores que precioso estímulo constitui para a A.C. de São Paulo esta expressiva manifestação do paternal agrado de nosso grande Cardeal.

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Começam a aparecer na imprensa diária, com crescente insistência, notícias referentes à simpatia ou cumplicidade de Sacerdotes católicos com as potências do “eixo” e a infiltração totalitária no Brasil.

Como este assunto é de capital importância para nós, católicos, é indispensável que o LEGIONÁRIO diga, sobre o assunto, uma palavra de orientação. Fazendo-o, não nos move qualquer intuito de polêmica. Dizemos mais: recusaremos pertinazmente qualquer polêmica sobre o assunto qualquer que seja o aspecto que possa tomar, ou o terreno em que seja situada. A honra do Clero e o decoro da Igreja exigem apenas algumas afirmações sóbrias e serenas quanto a este ponto e não comportará sobre o mesmo nem discussões públicas nem qualquer forma de sensacionalismo jornalístico.

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Mais do que ninguém, lutou o LEGIONÁRIO contra o perigo totalitário. Quando quase todos pareciam dormir, já nossa voz se alteava para proclamar os riscos que a Igreja e a Pátria corriam com a expansão da influência nazi-fascista. A muitos olhos, tão distantes parecia o perigo que não poucos nos acusassem de visionários e monomaníacos. E, a despeito de tudo, seguindo o preceito da Escritura “clamamos sem cessar, erguendo nossa voz em tempo oportuno e importuno”, denunciando sobretudo a infiltração insidiosa da “quinta coluna” nos países ameaçados pelo “eixo”, inclusive no Brasil.

Hoje, que o perigo se torna palpitante e exacerba a legítima sensibilidade patriótica de tantos espíritos bem intencionados, é para o LEGIONÁRIO, durante tanto tempo acusado de intolerante e irratibilidade, uma verdadeira recompensa do Céu o poder, com toda a insuspeição, dizer sobre o assunto uma palavra de orientação serena e ponderada.

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Há um primeiro fato que todos devem reconhecer. Dada a escassez do Clero nacional entre nós, para [cá] atraíram nossas Autoridades Eclesiásticas numerosos Sacerdotes estrangeiros que, renunciando por vezes a vantagens pessoais mais legítimas, vieram cooperar para a manutenção de nosso país na Religião de Nosso Senhor Jesus Cristo, e fecundar com seus suores esta parte da vinha do Senhor.

Destes Sacerdotes, muitos se entregaram à faina árdua das missões com um êxito de que a recente Exposição Missionária foi um atestado evidente, e com isto perpetuaram a tradição desses outros Sacerdotes também “estrangeiros” como Anchieta, por exemplo, que são figuras das mais gloriosas de nossa História. Outros ocupam na direção de nossa vida religiosa situações salientes, com todas as bênçãos da Santa Sé e aprovação do Episcopado Nacional.

Supor que a grande maioria desses Sacerdotes seja a tal ponto composta de pessoas indignas, que constitua perigo para o país, é afirmar de duas uma: ou que a alta direção da Santa Igreja tem os olhos fechados à realidade, ou que pactua com os propósitos censuráveis do Clero Estrangeiro.

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Na realidade, nem uma nem outra coisa se dá. Interpretando o sentimento unânime do laicato católico de S. Paulo, pode o LEGIONÁRIO afirmar que o Clero estrangeiro aqui vive cercado do respeito, da gratidão e do afeto de todos os brasileiros, que nele vêem uma falange de autênticos beneméritos da Igreja e da Pátria.

E, de tal maneira a opinião católica reconhece a importância do papel do Clero estrangeiro entre nós, que considera que qualquer coisa que se empreenda contra ele afetará de modo substancial os interesses e princípios do Catolicismo.

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Evidentemente, não implica isto em afirmar que possamos por a mão no fogo pela unanimidade absoluta dos Sacerdotes estrangeiros - como aliás por qualquer pessoa, desde que ninguém está confirmado em graça, e somos todos pecáveis - pelo que não excluímos a possibilidade de uma vigilância em torno dos elementos que possam despertar suspeitas merecidas.

Entretanto, o respeito devido à Santa Igreja, em geral, e ao Clero de modo particular, exige absolutamente que qualquer trabalho feito neste sentido se cerque de toda a discrição, de toda a reserva necessária para salvaguardar o decoro a que tem direito os Sacerdotes estrangeiros, muitos deles vitimas do próprio nazismo. Com efeito, atirar por meio de notícias de jornal absolutamente inúteis e imprudentes, o descrédito sobre todo o Clero estrangeiro pela possível culpa de alguns, é uma injustiça dolorosa e flagrante, que não pode deixar de magoar a fundo a opinião católica. E, por isto, entendemos que quaisquer medidas tomadas neste sentido devem ser cercadas da máxima discrição.

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Finalmente, há outra observação a fazer. Ninguém, no Brasil, pode exceder em patriotismo e em ardente devotamento aos mais justos interesses do País que o Episcopado Nacional. Por isto mesmo, podemos afirmar de modo peremptório e irretorquível que qualquer providência referente a uma vigilância sobre figuras eventualmente suspeitas no Clero só devem ser tomadas de acordo com nossa Hierarquia, respeitando-se assim a confiança que se deve à Igreja Católica, e pondo em ação recursos muito mais eficazes e menos chocantes de que uma ação puramente policial.

De modo muito particular, não se concebe que o Clero estrangeiro seja sujeito a medidas de exceção que não atinjam outros estrangeiros, não-Sacerdotes. Há nisto um desrespeito e uma injustiça flagrantes.

Estamos certos de que a evidente moderação do procedimento que aqui sugerimos à imprensa em geral, e a todas as pessoas justamente receosas das incursões da “quinta coluna” acalmarão apreensões e temores que, no interesse do próprio Brasil, não podem transformar sua vigilância em um jacobinismo que representa, em última análise, uma negação da catolicidade da Igreja.

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RIVERA, (A.N.) - Abrindo os trabalhos da Conferencia Regional dos Países Limítrofes com o Brasil, que ora se realiza nesta cidade, o Ministro do Interior do Uruguai, Sr. Hector Gerona, disse estar o conclave refletindo o mais puro anseio dos países da América pelo extermínio da “quinta coluna”. Acrescentou esperar que se encontrasse uma fórmula capaz de trazer a mais estreita colaboração entre os países limítrofes do Brasil, a fim de que elementos clandestinos, que se vem infiltrando pelas fronteiras, sejam controlados mediante eficaz fiscalização, de maneira a evitar-se o trânsito de espiões sabotadores, bem como toda a atividade contrária aos governos que neste continente procuram solicitar uma política de solidariedade de Pan-Americanismo. Concluiu fazendo vibrante saudação ao Brasil, sob aplausos da assistência.