De há muito que
toda a opinião católica se vem indignando com os "casamentos" no
México, no Uruguai, e em outros lugares que se tornam cada vez mais freqüentes
em nossa sociedade.
Há algum tempo
atrás, a embaixada do Uruguai no Rio de Janeiro baixou um comunicado em que
explica que as autoridades uruguaias não se prestam a fraudes neste sentido,
pelo que provavelmente os brasileiros desquitados que se "casam" no
Uruguai na realidade não realizaram sequer a formalidade do contrato civil no
Uruguai. A legislação socialista do México não autoriza, infelizmente, a esperança de que
o mesmo se dê naquele país. De qualquer maneira, estamos absolutamente certos
de que muitas pessoas que se "casam no México" também não foram ter
lá. Dão um passeio qualquer e, de volta, anunciam as suas relações, em geral
muito pouco exigentes, que se "casaram" neste ou naquele país.
No entanto, os
anúncios publicados a este respeito em jornais brasileiros fazem supor que são
muitas as pessoas que se servem efetivamente deste processo para
"anular" seus casamentos e realizar outros, ou ao menos que, sob
pretexto de "casamento" no México, obtenham papéis falsificados, atestando
que eles estão casados.
Tais anúncios
constituem verdadeiro ultraje à moralidade pública, e de há muito vem exigindo
uma repressão. Julgamos, pois, interessantíssimo transcrever aqui trechos de
uma decisão da Ordem dos Advogados, de que foi relator o Dr. Rui de Azevedo Sodré,
e que constitui verdadeiro desagravo à dignidade pública.
Transcrevemos
os tópicos essenciais:
"1 -
Vistos, relatados e discutidos estes autos de processo disciplinar n. 601,
desta Capital, em que se acha envolvido o Dr. Gaston Guilband,
advogado em Buenos Aires, por denúncia, apresentada pelo advogado José Nabantino,
acordam os membros da Ordem dos Advogados do Brasil, na Secção de São Paulo, por
unanimidade de votos, aprovar as providências sugeridas nos itens 1 (um), 3
(três) e 5 (cinco) do relatório de fls. 12 usque 15,
da Comissão de Disciplina que deste fica fazendo parte integrante, providências
essas que adiante se indicarão pormenorizadamente.
2 - Trata-se na
espécie do seguinte: o Dr. Guilband, que mantém, em
Buenos Aires, uma das maiores organizações sul-americanas especializada em
obter divórcios absolutos no México, de longa data vem enviando aos advogados
de São Paulo circulares, acompanhadas de três impressos, propondo ao colega
daqui, que lhe enviar casos de divórcio que "no preço de duzentos e
quarenta dólares norte-americanos, está incluída para V.S. uma comissão
confidencial de setenta e cinco dólares norte-americanos".
Os impressos
contêm informações acerca do divórcio absoluto no México, referências bancárias
sobre a honestidade do querelado e, por último, um longo questionário que o
interessado no divórcio deverá preencher, e no qual deverá declarar qual a
causa que quer alegar para o divórcio: "incompatibilidade de gênios",
injúrias graves, maus tratamentos, adultério, abandono do lar por mais de 6
meses e outras causas.
3 - Provou a
Comissão de Disciplina, nos autos, que a circular e os impressos redigidos em
português eram enviados aos advogados desta Capital, em envelope comum, com
selo nacional e com carimbo dos Correios desta Capital.
4 - Não
satisfeito com essa insidiosa propaganda, o querelado passou a anunciar,
abertamente, na imprensa diária desta Capital. Anuncia o divórcio e o novo
casamento, sem o interessado afastar-se do lugar da sua residência (fls. 18). E
o negócio se tornou de tal forma rendoso que outros advogados, também
argentinos, passaram a anunciar a mesma especialidade criminosa como se infere
do recorte do Jornal "A Gazeta" a fls. 17.
Aos
brasileiros, que nunca saíram do Brasil, através de uma série de artifícios,
conseguem os manipuladores de divórcios atribuir um
domicílio no estrangeiro, que nunca tiveram, aos que apenas turisticamente
visitaram aquele país, por certo não se pode deixar de reconhecer que agiram
visando fraudar a sua lei nacional, que não admite o divórcio. Em ambos os
casos, portanto, há manifesta fraude à lei e, por via de conseqüência, a
sentença estrangeira não poderia ser homologada, nem para fins patrimoniais.
8 - As
sentenças estrangeiras de divórcio homologadas pelo Supremo Tribunal Federal
apenas para efeitos patrimoniais visavam hipóteses em que a lei nacional de um
dos cônjuges permitia o divórcio. Admitindo-o a lei nacional de ambos os
cônjuges, a tendência da jurisprudência do Supremo é no sentido de ser a
sentença estrangeira homologada para todos os efeitos (Vide Jurisprudência,
Diário da Justiça, apenso ao n.161, de 11-11-1941).
No caso de cônjuges
de nacionalidade brasileira seria um contra-senso falar-se em sentença de
direito, não só diante da indissolubilidade do vínculo matrimonial estabelecida
pelo Código Civil e proclamada pela Carta Constitucional de 10 de novembro de
1937, como pela inexistência de semelhante instituto em nosso sistema jurídico.
Nulos, pois,
como são de pleno direito os divórcios decretados pela justiça mexicana com
relação a cidadãos brasileiros, visto como são realizados com fraude à lei, a
propaganda que os mesmos se vem fazendo em nosso país, assume a característica
de um verdadeiro ato ilícito que cumpre ser reprimido.
11 - Trata-se,
na verdade, de propaganda insidiosa, feita por um estrangeiro, de atos
contrários não só aos bons costumes, como também e principalmente contra a
ordem social.
A família,
preceitua o art. 121 da Constituição de 1937, constituída pelo casamento
indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado.
Protegendo-a,
não pode o Poder Público tolerar a propaganda de atos contrários à sua constituição
e tais atos, sendo classificados como criminosos - art.- 22 e parágrafo 2º da
Lei n.º 36 de 8 de abril de 1935; art. 21 da Lei n.º 136, de 14-12-1935; art.
1º do Decreto-lei n. 431, de 13-5-1938, - exigem pronta e imediata punição.
A lei pune a
propaganda de processos para subverter a ordem social, relativamente aos direitos
e garantias da família, assegurados pela Constituição.
No caso, essa
punição se torna difícil, dado tratar-se de um estrangeiro. A lei, porém,
prevendo essa hipótese, preceitua, no citado art. 21 da lei 136, a proibição da
entrada livre no país ao estrangeiro incurso nas suas penalidades.
12 - Por outro
lado, os autos fornecem elementos para que a ação da Ordem se torne eficaz,
coibindo esse inominável atentado às nossas leis fundamentais, além do aspecto
ignominioso da gorgeta que, disfarçadamente
denominada "comissão confidencial", é oferecida aos advogados
paulistas que arranjarem e encaminharem a ele, querelado, os papéis dos
candidatos a divórcios.
13 - Ponderadas
todas estas circunstâncias, os membros do Conselho da Ordem dos Advogados do
Brasil, na Secção de São Paulo, por unanimidade de
votos, acordam aprovar as seguintes providências sugeridas pela Comissão de
Disciplina:
a) Oficiar ao
Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda solicitando as necessárias
providências para que não mais sejam publicados na imprensa deste Estado
anúncios sobre divórcio e novo casamento, por atentarem contra as nossas leis,
aos nossos bons costumes, à moral de nosso povo;
b) remeter
estes autos, em original, à Procuradoria Geral do Estado para que um Promotor
Público por ela designado, em colaboração com o Diretor dos Correios e
Telégrafos e a Polícia do Estado, apure a procedência das incriminadas
circulares e impressos e se possível proceda criminalmente
contra os colaboradores, agentes, cúmplices, enfim;
c) ficam a
Comissão de Disciplina autorizada a fornecer novos elementos, caso os obtenha,
ao órgão do Ministério Público a quem este processo for distribuído a fim de
auxiliar, por todos os meios, a sua atuação no caso".