O Rev.mo. Cônego Antônio Alves de Siqueira acaba de publicar um
livro que corresponde plenamente à expectativa que seus amigos, e os católicos
de S. Paulo de modo geral, alimentávamos, quanto à fecundidade de seu talento.
Com efeito, acaba ele de dar a lume uma obra sobre “Filosofia da Educação” que,
por seu alto valor e pela extraordinária atualidade do assunto de que trata,
ocupa lugar de grande realce em toda a produção intelectual dos católicos
brasileiros em nosso século.
Tudo quanto diz respeito à Pedagogia tem uma
atualidade perene. No entanto, o extraordinário desenvolvimento que a matéria
tem tido ultimamente, a complexidade a bem dizer inexaurível dos problemas que
tem suscitado, a necessidade cada vez mais patente de encontrar nas fontes de
uma Pedagogia sã os remédios de que o mundo contemporâneo carece, tudo isto
concorre para dar aos estudos pedagógicos, em nossos dias, uma nota não apenas
de atualidade, mas de verdadeira e angustiosa premência.
Melhor do que ninguém, pode um católico compreender
isto. A Igreja é por excelência a grande educadora do gênero humano. E, por
isto, a solicitude de seus Pontífices, de seus Doutores, de seus apóstolos se
voltou sempre para as lides da educação, nelas vendo o terreno em que com maior
fecundidade, com maior segurança, com maior durabilidade se poderiam colher os
frutos do apostolado. Por isto, quando a ação dos homens não era suficiente, a
própria Providência intervinha diretamente para estimular as atividades
católicas no terreno do apostolado pedagógico. Daí o fato de encontrarmos, na
Hagiografia, tantos Santos visivelmente suscitados por Deus para criar Ordens
ou Congregações docentes, e confirmados em sua missão por meio de comunicações
ou revelações divinas das mais insistentes e formais. Esta é a tradição
multissecular da Igreja. Infelizmente, porém, no século passado, as emanações
do sentimento romântico se infiltraram em certos círculos intelectuais
católicos, e se generalizou neles a idéia de que
a educação, como as demais obras de caridade, deveria ser essencial, ou antes
exclusivamente uma obra do coração, onde a inteligência pouco ou nada tivesse
que ver. Este pensamento, formalmente oposto à doutrina católica, é responsável
por muitos insucessos ocorridos no terreno pedagógico. Na pedagogia, como em
quaisquer obras de caridade espiritual ou corporal, tem certamente o sentimento
um papel indiscutível. Mas seria ridículo imaginar que isto implica em subtrair
à razão iluminada pela Fé as funções de verdadeira rectrix que de direito lhe toca.
A pedagogia é uma ciência, e não apenas uma atividade mais ou menos nobilitada
pelas digressões que sobre ela fizeram a poesia e o romance. Nos estudos
educacionais, devem os católicos ocupar um lugar de vanguarda. Não se trata aí
de um direito apenas, mas de um verdadeiro e gravíssimo dever. No mundo
inteiro, tem os católicos desenvolvido neste sentido relevantíssimos
esforços, e também no Brasil tem este campo de apostolado encontrado paladinos
devotadíssimos, aos quais a causa da Igreja deve serviços inestimáveis. Mas
ainda havia um coisa por fazer. Como orientar o pensamento de tantos e tantos
pedagogos católicos, absortos pelas atividades profissionais quotidianas,
através do dédalo inextricável da literatura pedagógica nacional e estrangeira?
Como proporcionar aos pedagogos católicos brasileiros uma visão sólida, clara, substanciosa, dos princípios da
pedagogia católica, e da posição em que perante estes princípios se colocam as
mais recentes correntes do pensamento pedagógico mundial? Neste labirinto da
pedagogia moderna,
faltava-nos um guia seguro, de visão larga e profunda, de perspicácia
penetrante e segura, que ao mesmo tempo nos ensinasse a evitar os escolhos e
encontrar a rota da doutrina verdadeiramente ortodoxa. Ao mesmo tempo
faltava-nos uma obra clara e segura para informar sobre nosso pensamento os que
estão fora de nossos arraiais, provando-lhes o valor científico do pensamento
educacional católico e atraindo-os assim para nosso grêmio.
Foi esta obra, que se propôs o Rev.mo. Cônego
Antônio Alves de Siqueira.
* * *
Quer na concepção geral do trabalho, quer no modo
de o desenvolver, mostrou o autor de “Filosofia da Educação” uma indiscutível
competência para a realização de tão vasto empreendimento. O próprio título da
obra é, neste sentido, absolutamente significativo. O que nos faltava era precisamente
uma “Filosofia da Educação”. Sem negar a relevante utilidade dos trabalhos de
escolarização, é indiscutível que, sobretudo, o que nos faz falta são os
princípios, princípios sólidos, seguros, substanciosos, que não transviam o
estudioso nos meandros das questões de pormenor, mas lhe proporcionam uma visão
de conjunto dentro da qual pode caber, sem desordem, sem perturbação, toda a
riqueza dos problemas secundários. No trabalho que comentamos, os princípios
estão expostos com notável profundeza, muito método, e uma grande clareza,
poderosamente auxiliada pelo magnífico sumário que se encontra nas primeiras
páginas do trabalho.
Em outros termos, o autor comunicou a seu trabalho
toda a superioridade de um espírito profundamente formado na filosofia de S.
Tomás de Aquino, da qual se mostra discípulo inteligente, erudito e
fidelíssimo, quer na doutrina, quer no método. “Filosofia da Educação” é um
livro que só pode ter brotado de profundas reflexões, um livro que foi todo ele
solidamente pensado e estruturado antes de escrito, e que se reveste assim de
um valor cada vez mais premente nos dias que correm.
Por outro lado, impressiona no livro a vastidão dos
recursos de informação cultural do autor. Não é uma obra escrita sobre o
joelho, mas produto de longas e meticulosas leituras, em que todos os
horizontes da pedagogia contemporânea foram cuidadosamente esquadrinhados, com
uma paixão pela objetividade das informações que só se explica por uma
honestidade intelectual à toda a prova, e uma grande dedicação à obra.
Merece especial destaque o grande critério com que
o Autor soube afirmar as relações entre a Filosofia e a Teologia no campo
pedagógico, evitando certo unilateralismo que, em
última análise, deixa transparecer claramente a influência naturalista de
certas escolas ou correntes européias e norte-americanas. Em todas as páginas
como aliás se podia ter a antecipada certeza dado os títulos do autor, respira
o trabalho um perfume de doutrina sã e desassombrada, que infelizmente não se
encontra em certos autores sedentos de conciliações imprudentes, de concessões
precipitadas, e de uma paz que, em última análise, visa conciliar princípios
inconciliáveis.
* * *
Assim, prestou o Rev.mo. Cônego Antônio Alves de
Siqueira um relevante serviço à Igreja e ao Brasil, com sua bela obra, e o
LEGIONÁRIO se sente feliz em concorrer - modestamente embora - para a sua maior
difusão.