Aproximando-se
as festas de Natal, a Junta Arquidiocesana da Ação Católica, prepara uma grande
campanha a fim de, quanto possível, substituir pelas comemorações de caráter
estritamente religioso e familiar as reuniões mundanas e pagãs que cada vez
mais se multiplicam nestes dias augustos estabelecidos pela Igreja para o culto
especial do Menino Deus. Não é este o lugar para se fazer a discriminação das
muitas providências e iniciativas que a Junta Arquidiocesana tomará a fim de
que sua campanha de 1941 implique em real progresso sobre a de 1940, que já foi
tão rica e tão fecunda. Também não é nosso propósito insistir hoje sobre o que
ninguém ignora, isto é, sobre a miséria moral dos cotillons, reveillons, bailes e outras
festas em que, sob pretexto de celebrar o nascimento de Jesus Cristo em Belém, matam-No em tantas e tantas almas. Tudo isto é muito
conhecido e já tem sido fartamente lamentado. O que sobretudo nos parece
necessário é mostrar as causas profundas deste mal, causas complexas e poderosas, se bem que remotas, causas que
por isto mesmo não podem ser extirpadas em uma simples campanha de Natal, mas
exigem anos inteiros de atividade inteligente e metódica.
É óbvio que a
principal causa da paganização do Natal consiste na
atração sempre maior,que as diversões sensuais e
pagãs exercem sobre a índole lasciva e desregrada do homem contemporâneo. A
massa das pessoas que assim profanam o Natal não ignora, a respeito dessa data litúrgica, o essencial. Com efeito, quem ignorará que no
dia 25 de Dezembro se festeja o nascimento do Salvador, do Homem-Deus
que veio remir a humanidade? Se há tanta profanação do Natal, não se suponha
pois que isto acontece porque uma série de pessoas muito boas, mas ignorantes,
se esquecem das lições do Catecismo sobre o Natal, mais ou menos como um menino
esqueceria uma lição de Geografia. A paganização do
Natal não é um “equívoco”: é um pecado.
Entretanto, não
deixa de ser verdadeiro que se se insistisse devidamente
sobre o exato significado do Natal, quer do ponto de vista estritamente
teológico, quer do ponto de vista histórico e social, muito menos campo para
suas devastações encontraria no ânimo dos fiéis a paganização
contemporânea.
Antes de tudo,
é, pois, indispensável que todos tenham bem em mente o que significa
precisamente a Encarnação, o papel que ela tem na economia de nossa salvação, a
inapreciável honra que conferiu ao gênero humano, e a infinita bondade que Deus
manifestou por meio dela. Muita literatura se tem procurado fazer sobre este
assunto em certos jornais e revistas católicos. É muito louvável que se procure
comover por esta forma a sensibilidade dos fiéis. Mas é sobretudo importante
não esquecer que as emoções duráveis e eficazes resultam muito mais de
conhecimentos precisos e claros, de convicções sólidas e substanciosas, do que
dos artifícios da literatura ou da retórica.
Fala-se muito
hoje em dia de civilização cristã, e esta augusta expressão, de que se tem
usado e abusado nos discursos dos chefes de Estado contemporâneos, passou a ser para muitas pessoas uma fórmula
absolutamente oca. A imensa diferença, e, mais do que isso, o radical e
insanável antagonismo que existe entre a Cidade de Deus, isto é a civilização
católica, e a cidade do demônio, isto é toda e qualquer civilização acatólica, quem a compreende hoje em dia, na massa geral?
Quem compreende que a festa de Natal é, em larga parte, a festa desta
civilização que nasce em Belém, na própria gruta em que nasceu o Menino Deus? Noções
esquecidas, noções ignoradas, ou às vezes noções vistas com miopia, que bem
confirmam a exclamação da Escritura: “Diminutae sunt veritates a fillis hominum”.
É toda a restauração de uma longa
série de conceitos fundamentais que a despaganização
das festas de Natal supõe, e é para este trabalho que convocamos o zelo de
nossos leitores.