Por maior que tenha sido a surpresa e o
descontentamento geral, estamos certos que jamais se lamentará suficientemente
a extensão catastrófica das cláusulas que os armistícios teuto-francês
e franco-italiano contém.
Segundo as alegações oficiais do governo de Bordeaux, a cessação das hostilidades foi solicitada a fim
de evitar uma rendição incondicional. Na realidade, porém, a rendição
incondicional foi o único fruto tangível do armistício, pois que ele colocou a
França em condições tais que quando, afinal, a
conferência da paz se reunir, ela não terá um único recurso para se esquivar à
imposição unilateral da vontade de um vencedor onipotente.
Do ponto de vista militar, o desarmamento francês é
completo. Todas as indústrias de guerra, todo o material bélico, tudo enfim que
poderia servir aos franceses como meio de resistência contra condições de paz
excessivamente duras, tudo isto ficará sob mais rigoroso “controle” teuto-italiano, de sorte que a França ficará na
impossibilidade de pensar em outra coisa senão a aceitação pura e simples de
qualquer tratado.
Ao lado disto, o depauperamento será
extraordinário. Com dois terços do solo ocupados, os franceses terão de manter à
suas próprias expensas as forças estrangeiras ali estabelecidas. Para uma
população que se encontra em ruínas, e que por isto mesmo terá de fazer pesados
gastos de reparação de guerra, mais essa sobrecarga econômica será colossal.
Mas o que sobretudo alarma é que não se fala na
data em que a conferência de paz deve ser reunida. Se ao menos essa conferência
se reunisse logo, poder-se-ia esperar para dentro em breve a desocupação da
parte do solo francês que o inimigo não arrebatasse. Mas a conferência parece
ter sido relegada para as calendas grega, de sorte que este estado de coisas,
tão vexatório e humilhante, não terminará provavelmente senão dentro de muito
tempo.
O que a realidade nos mostra é, pois, uma França
vencida, prostrada ao solo e humilhada duramente.
Humilhada? A desgraça não humilha ninguém. Não há
razões, pois, para que os franceses se sintam vexados.
Realmente, a derrota não é uma humilhação. Mas o
que é uma autêntica humilhação é que esse país glorioso tenha sido insultado em
seu brio nacional exatamente por aquele em cuja senectude venerável, em cujas
dragonas gloriosas e a cujo patriotismo
até ontem insuspeito ela havia confiado suas melhores possibilidades de
vitória, depois de a entregar indefesa ao inimigo, ainda venha tripudiar sobre
a memória dos que tombaram em guerra dizendo que não lutaram com o suficiente
fervor e que à França falta o espírito de sacrifício.
Manda a realidade que se diga que, efetivamente, a
França está sofrendo uma dura e prolongada hora de merecida expiação. Sem falar
em outras razões que tornavam esta expiação uma necessidade, a limitação da
natalidade era, em França, um dos maiores escândalos que a História registre.
Mas uma coisa que não se pode dizer do francês: que
lhe falte coragem. Para o comprovar de modo insuspeito, basta ler o testemunho
do Sr. Adolf Hitler. Em várias de suas recentes
declarações não se fartou ele de elogiar o heroísmo dos franceses. De sorte que
quando o mundo inteiro ia dando crédito à palavra de Pétain,
foi o próprio chanceler alemão que se incumbiu de lhe dar solene desmentido.
Para a França insultada a Providência reservou esta
reparação: o elogio de um adversário entretanto muito pouco cavalheiresco.
Aliás, quem ousaria dizer que a França não tem
espírito de sacrifício! Se o Sr. Pétain duvidava
disto, sua mesa repleta de telegramas do mundo inteiro, enviados pelas colônias
francesas, provaria o contrário. De Londres, o rugido trágico e eloqüente do
brio militar malferido do General De Gaulle prova bem o que
pensam os franceses. E todo o mundo sente que, no interior da França, o
descontentamento é forte. Por que, então, não se bate à França? Porque Pétain não o quis. Mas é aos franceses que falta o espírito
de sacrifício!
Na realidade, há um lado mais doloroso nisto tudo.
É que, em rigorosa conformidade com o que havíamos previsto, o litoral francês
vai ser agora ocupado como ponto de vista de partida para uma ofensiva contra a
Inglaterra, e a esquadra francesa só não vai ser empregada contra a antiga
aliada porque há disto uma palavra formal do Sr. Hitler...
Assim, pois, vê-se que o armistício não se limitou
a entregar a França à Alemanha. Fez mais: voltou a França contra a Inglaterra.
Dentro de alguns meses veremos um arremedo de
França totalitária, ao lado dos seus antigos inimigos, repudiar todas as
glórias da França católica e continuar, sob outra roupagem, as piores tradições
da França revolucionária.
Mas Deus governa o mundo com sua Providência e
saberá qual o instante propício para livrar franceses, ingleses, bem como
alemães ou italianos, de tantos perigos atrás dos quais se embosca o neo-paganismo totalitário.