Dois grandes acontecimentos políticos dos últimos
dias corroboraram vigorosamente uma tese que, de há muito, o “Legionário” vem
pondo em relevo. Esses dois acontecimentos são o incidente entre a Action Française e o Conde de Paris, a retirada da Itália da Liga das Nações. De ambos estes fatos, a lição que retiramos é que se
iludem cruelmente os que pensam em trabalhar pelos interesses superiores e
legítimos da humanidade, esquecidos ou afastados da Igreja Católica. Tanto na obra da Action Française, quanto na da Sociedade das Nações, ao par de
grandes erros há, incontestavelmente, uma grande parcela de ideais louváveis.
Mas estes ideais, em lugar de procurarem “cum Christo, per ipso
et in ipso”, a sua
realização, afastaram-se do Salvador. E o resultado inevitável foi o total
fracasso de seus esforços.
Recapitulemos um pouco a História dos últimos 10 ou
20 anos.
* * *
Se há um movimento que um católico poderia receber
com indisfarçável simpatia inicial, esse movimento
era a Action Française.
Corroída pelos princípios falsos do liberalismo,
agitada por uma grande propaganda comunista que ameaçava assenhorear-se do
País, a França dos primeiros decênios de nosso século estava
sendo arrastada, pela torrente impetuosa e impura da Revolução, a abismos que
devorariam as suas tradições, a sua riqueza, a sua hegemonia espiritual sobre
todo o ocidente latino e, mais do que tudo isto, as convicções religiosas da
grande massa de seus habitantes.
A Action Française quis servir ao Rei guerreando o Papa. E é
hoje a própria Casa real que a condena como nociva à causa da monarquia.
Foi em situação tão calamitosa quanto esta, que a “Action Française”
começou a aliciar elementos para lutar pela restauração do trono da gloriosa
raça dos Capetos, varrendo do poder a politicalha vil que dirigia a política francesa.
Impulsionada por dois intelectuais de grande valor,
Leon Daudet e Charles Maurras, a Action Française
conseguiu recrutar nas suas fileiras o escol da França. Aristocratas
pertencentes às antiquíssimas linhagens que haviam feito a grandeza da Pátria,
militares cheios do tradicional heroísmo gaulês, diplomatas escolados nas
altíssimas tradições da política francesa, juristas habituados às mais
profundas cogitações da filosofia e às mais minuciosas investigações sociais e,
principalmente, moços, moços e muitos moços das universidades constituíram a
milícia magnífica da nova corrente monárquica. A república tremeu. (...) E os católicos olharam com simpatia para essa falange que
prometia libertar a França dos politiqueiros sem escrúpulos que a aviltavam,
para lhe restituir o lustre dos melhores dias do “Ancien Régime”.
Infelizmente, porém, no meio de tanta luz, havia
sombras. Maurras e Daudet
não eram católicos. Mais do que isto, eram materialistas e procuravam intoxicar
com sua filosofia venenosa a flor da mocidade católica arregimentada sob suas
ordens. Quanto à política, a despeito de monarquistas, de anti-maçônicos,
de acérrimos inimigos da esquerda, tinham mais de um ponto de seu programa
contrário ao pensamento católico.
Qual o ponto mais negro nessa desorientação? Qual o
grande erro político cometido pela Action Française? Afirmava ela que os católicos deveriam ser
só monarquistas e que, caso se filiassem a alguma agremiação republicana,
trairiam a sua Fé.
Contra este abuso, a Santa Sé se insurgiu. Maurras e Daudet começaram então
a escrever contra a corte pontifícia e até contra o Papa. Veio a condenação de
Roma. Mas apesar disto os dois leaders da Action Française não desanimaram. Rompendo com a Igreja, afirmavam
fazê-lo para servi-la melhor do que o próprio Papa, e que serviriam melhor a
monarquia fora da Igreja do que dentro dela.
Passam-se alguns anos, e o herdeiro do trono da
França, o jovem e inteligente Conde de Paris, se vê na obrigação de condenar
também ele a Action Française,
porque ela já não estava servindo convenientemente a causa da monarquia.
Em resumo, rompendo com a Igreja para servir à
causa da França e da monarquia, a Action Française implicitamente se inutilizou para qualquer serviço
em prol dos ideais aos quais queria sacrificar o Catolicismo. E foi o próprio
herdeiro do trono que comprovou o fato, declarando oficialmente que a Action Française não
merece sua inteira confiança.
Eloquência dos fatos...
* * *
A Liga das Nações quis servir a paz longe de
Cristo, e hoje os povos se guerreiam sob os seus escombros.
Em última análise, não foi muito diverso o que se
deu com a Liga das Nações. Fundada pelo presidente Wilson depois da guerra Européia, ela tinha um
programa de pacificação universal e de fraternidade humana que, ao menos à
primeira vista, mereceria a inteira aprovação dos católicos. Ao par de suas
atividades políticas internacionais, a Liga das Nações se entregou a um extenso
trabalho social, lutando pelo melhoramento das condições de vida das classes
pobres. Essa atividade social era tão conforme, em muitos de seus aspectos, ao
pensamento católico, que se diria ter sido inspirada pela famosa “Rerum Novarum” de Leão XIII.
No entanto, a Liga das Nações timbrou em se
conservar inteiramente leiga, recusando-se a aceitar o Santo Padre no seu
grêmio, e silenciando absolutamente quanto a qualquer fundamento religioso para
as atividades muitas vezes meritórias que empreendia.
E o resultado aí está. Transformada em corrilho
político das mais mesquinhas maquinações, feita joguete de um pequeno número de
magnatas internacionais que cobiçam o domínio do mundo, a Liga das Nações, com
a retirada da Itália, acaba de sofrer o golpe de misericórdia. Hoje é uma
ruína, atrás da qual está de emboscada um grupo de combatentes que procura
lutar com outro grupo que está de fora.
Por que? Querendo realizar uma obra de inspiração
fundamentalmente católica, a Liga das Nações se esqueceu intencionalmente de
Nosso Senhor Jesus Cristo e de sua Santa Igreja. Vistosa a princípio, a obra
foi no entanto traindo sintomas de um envelhecimento prematuro que se
transformou rapidamente em agonia mortal. É que havia sido esquecida a pedra de
ângulo de todo e qualquer edifício que queira durar.
E, enquanto rui a Action Française e cai aos pedaços a Liga das
Nações, a Igreja continua altaneira o seu curso por entre as tempestades
modernas. Porque só Ela pode realizar estável e duradouramente a obra de
Cristo.