Penso que as classes armadas não tem, no Brasil,
amigo mais devotado e sincero do que o autor destas linhas. A meu ver, o grande
erro da 1ª República consistiu em não dar à Igreja e às forças armadas o papel
de relevo a que tem direito na vida
nacional. E desse erro imperdoável decorrem todas as conseqüências
funestas que hoje em dia são tão evidentes que não precisam de quem os aponte.
A II República incumbiu-se de tornar tão aguda a questão militar, que vemos
nela o problema que mais deve preocupar nossos estadistas nos dias que passam.
Os políticos que tem governado o Brasil, na sua maioria, tem praticado em
relação aos militares, uma política de alternativas, que tem prejudicado profundamente
o Exército e a Pátria. Nos momentos de apuro, não há lisonjas
que cheguem. O Exército e seus Chefes são elevados à categoria de figuras
nacionais. Os soldos são indefinidamente ampliados. As garantias para os
militares se multiplicam nos regulamentos do Ministério da Guerra ou da
Marinha. Parece que os políticos não tem sorrisos que bastem, nem o Tesouro
verbas que cheguem para atender as necessidades da classe militar. Desde que,
no entanto, se entra em um período de bonança, os dirigentes do Brasil, em
geral bacharéis, se deixam dominar pelo anti-militarismo
que neles instila a formação jurídica defeituosa de nossas Faculdades de
Direito, e mandam os generais e tenentes às urtigas. De aumentos de verba,
nada. Os antigos sorrisos se fanam nos lábios dos políticos. E as deferências com que era tratado o militar desaparecem, para
permitir que todas as honras confluam para o bacharel que esteja na direção dos
negócios públicos.
Com a lealdade que nos caracteriza, devemos dizer
que ambos estes excessos são nocivos. O militar fica sabendo que, para valer
qualquer coisa no Brasil, é preciso “meter
medo” nos políticos, e que, como a farda não tem, de per si, prestígio nos
nossos altos círculos políticos e sociais, é preciso que o Exército crie para
si outra fonte de “cotação”: a
espada.
O que, porém, este estado de coisas tem de pior é
que ficou, cronicamente, radicado um mal-estar entre
o Exército e a Armada de um lado, e o Poder Civil do outro. Ainda quando eles
se apertam a mão e se dizem amabilidades, um não entende o outro...
O mal-estar é a nota mais aguda das relações ente a
espada e o diploma do bacharel. Parece um absurdo. Não deveria ser assim. Mas
é.
* * *
É inútil dizer que este mal-estar cria um campo
extraordinariamente propício para a semeadura das idéias comunistas. O militar
vê com desconfiança essa alta burguesia que não compreende a grandeza de sua
vocação, e que recusa ao Exército e à Marinha - particularmente ao primeiro -
os seus filhos, como também os recusa ao
Sacerdócio.
Aproveitando este bom terreno, a propaganda
comunista ainda encontra outra facilidade na circunstância de campearem ainda
no Exército, não raramente, os preconceitos positivistas, liberais e laicos que
grassaram em todo o Brasil, e causaram sua infelicidade. Ainda quando esses
preconceitos não se manifestam sob forma de opiniões nítidas e categóricas,
traduzem-se numa vaga antipatia que resulta de uma absoluta despreocupação por
quaisquer assuntos religiosos.
Finalmente, se é verdade que muito se tem feito
pelos militares no Brasil, não é verdade que muito resta a fazer, e que há
inúmeras famílias de soldados que sofrem as privações a que, em geral, está
sujeito atualmente qualquer homem sem recursos próprios.
Se não se instaurem quanto antes as capelanias militares, como
poderemos estar tranqüilos sobre os destinos do Brasil?
O sorteio militar é feito de modo desastroso. Em
lugar de se fazer servir o homem, tanto quanto possível junto à sua própria
família, arrancam-no para pontos distantes do território, onde, separado dos
seus, se deixa muito freqüentemente absorver pelo ambiente pestilencial dos
botequins baratos, nada menos nocivos da classe militar do que os luxuosos “dancings”
etc., que infelicitam a classe universitária.
Ora, nestes ambientes é que se faz a verdadeira
propaganda comunista, porque é aí que se arranca às almas os anteparos que as
impermeabilizariam contra a propaganda vermelha: a Fé, o amor à família, as
tradições domésticas do próprio torrão natal.
E, assim, uma imensa série de fatores conspira para
desfibrar no militar brasileiro a linha de patriotismo, de disciplina, de
abnegação, de amor à civilização brasileira que é essencialmente católica, e a
tudo que poderia preservar o Exército e a Marinha da infiltração comunista.
Não freqüentamos, infelizmente, círculos militares,
e por esta razão confessamos claramente ignorarmos em que pé está a situação
nas classes armadas no tocante à propaganda comunista. Mas é uma honra para o
soldado brasileiro que, a despeito de tantos fatores, a Revolução de 35 tenha
encontrado nas classes armadas a repulsa enérgica e patriótica que encontrou.
Neste triste cenário que pintamos, há
incontestavelmente rasgos de luz. Um João Ribeiro, um Newton Cavalcanti, um Severino Sombra, são afirmações claras de que no Exército as tradições
brasileiras pulsam e reagem.
Mas quanto durará a reação? O que conseguirá ela?
Nós que, infelizmente, vivemos longe e fora do Exército, não podemos deixar de
formular com angústia esta terrível interrogação.
* * *
Foram por demais extensas nossas considerações.
Teremos de ser breves para apontar o remédio.
Diz a Escritura que, “enquanto o Senhor não defender a cidade, trabalharão em vão os que a
defendem”. Do que adiantam tantos fuzis, tantas metralhadoras, tantos
canhões, tantos destroies, se o Senhor Deus dos
Exércitos não estiver presente através de sua Santa Igreja na classe militar?
Que garantia representarão para nós tantas armas, se é possível que a loucura
comunista venha a paralisar as mãos valentes que as manejam? Se
não se instaurarem quanto antes as capelanias nas forças armadas, como
poderíamos estar tranqüilos sobre os destinos do Brasil? Ainda que, como
Aquiles, ele estivesse preservado contra todas as flechas, o Exército seria a
parte vulnerável, situada não no calcanhar mas no coração e nessa parte poderia
a qualquer momento fixar-se uma flecha
envenenada, das que Moscou tem na sua aljava.
Uma coisa é positiva, e o caráter militar da
revolução de 35 o demonstrou: as forças armadas são o campo predileto para a
propaganda comunista.
Não bastaria isto, para que elas também fossem o
campo predileto da propaganda católica?
Se um levante militar de caráter comunista
transformar o Brasil, mais cedo ou mais tarde, em uma nova Rússia, do que vale
como veio de resistência o que atualmente fazemos?
Praza a Deus que os
católicos compreendam finalmente que este campo deve ser imediatamente,
deveríamos dizer, fecundado com a palavra da Igreja, para que não crave nele
suas raízes a semente satânica da III internacional.