A nossa situação é esta: estamos
aptos a ter um dos operariados mais católicos ou mais bolchevistas do mundo,
dependendo tudo de quem tomar a dianteira, se os propagandistas de Deus e de
sua Santa Igreja, se os de Satanás e da III Internacional.
No último artigo de fundo, protestamos contra os
boatos recentemente espalhados, e que continuam a circular embora com
insistência menor, sobre um imediato perigo de insurreição comunista. Esta
tática errada produziu o fruto que tinha de produzir. Mostrando o exagero que
havia nos boatos alarmistas de origem anticomunista, certos políticos das
nossas tristemente famosas “esquerdas”
aproveitam a oportunidade para dar a entender que não existe perigo comunista
no Brasil. É evidente que esta manobra, incalculavelmente mais nociva do que a
primeira, merece ser denunciada e combatida “à
outrance” pelos católicos.
Dissemos em nosso último editorial que os
católicos, neste assunto, não deveriam ser otimistas nem pessimistas, mas
realistas. Para não ficarmos no vago - uma vez que todos os disseminadores
de boatos otimistas ou pessimistas também se inculcam como realistas - vamos
falar claro a respeito do que pensamos sobre o perigo comunista.
Será o único meio para dissiparmos, entre nossos
leitores, o ambiente de tenebrosa confusão com que se procura turvar nossa
política muito habilmente, “et pour cause”.
* * *
Vamos, em primeiro lugar, examinar a situação entre
os operários e ver no que consiste o perigo comunista nesta classe.
Podemos afirmar categoricamente que não há, no
nosso operariado, uma corrente comunista numerosa e organizada. Não quer isto
dizer apenas que a maioria dos operários paulistas não é comunista. Quer dizer
mais: que não há, entre os operários, uma corrente comunista de proporções
avultadas. De sorte que, a nosso ver, não é de se recear que, hoje ou amanhã, o
operariado faça causa comum com os agitadores de Moscou.
Com isto destruímos uma impressão que,
intencionalmente ou não, os boatos pessimistas provocaram: de que qualquer
trabalho social junto às massas operárias já era tardio, e que só a força era
um anteparo contra as investidas comunistas. Esta impressão está errada. Ainda
é tempo para se procurar pelo operário, evangelizando-o, formando-o,
defendendo-lhe os direitos legítimos e conquistando sua simpatia. Neste como
nos demais campos, a Ação Católica é o único antídoto contra as atividades
comunistas e, sem ela, fracassará qualquer
repressão policial, por mais necessária e hábil que seja.
Não importa
isto, entretanto, em dizer que não existe um
perigo comunista entre os operários. A classe operária, tanto ou mais do
que qualquer outra, está profundamente contaminada pelos erros modernos. O
cinema, a imprensa que vive do noticiário de crimes e dos folhetins
pornográficos, e mais do que tudo ignorância religiosa, destruíram na
mentalidade operária quase todos os liames que a prendiam ao espírito de nossa
civilização católica. De sorte que, com as exceções existentes em cada classe,
a mentalidade de qualquer operário está entulhada de pontos de vista contrário
à doutrina da Igreja. E isto implica em afirmar que ela está entulhada de
pontos de infecção aptos a servir de ambiente para o
desenvolvimento dos micróbios comunistas.
Acresce a isto - convêm dizê-lo embora desagrade a
certa gente - com muita freqüência as condições de vida do operário são
verdadeiramente desumanas. A famosa afirmação de que no Brasil não se morre de
fome, só a fazem os que não conhecem os operários devorados pela tuberculose
que a má nutrição ocasionou. É inútil dizer que esta circunstância torna
particularmente apto o terreno, para a semeadura de idéias comunistas.
Ao lado de todas estas predisposições para o
comunismo, existe, porém, muito freqüentemente, uma barreira: a Fé. O
sentimento católico é, no coração de muitos operários, como aquelas graciosas
plantas que se obstinam em crescer nas anfracturas
dos mais áridos rochedos. A despeito das condições morais e sociais
desfavoráveis à vida católica, os operários têm muito freqüentemente um
sentimento religioso cândido e sincero que, graças à ignorância religiosa tão
generalizada em todas as classes sociais, coexiste neles com idéias
absolutamente incompatíveis com a doutrina da Igreja.
Por mais comprimido que seja este sentimento à
sombra da civilização pagã do século XX, é absolutamente incontestável que ele
pode ser desenvolvido por uma ação católica vigorosa.
Como conseqüência, afirmamos peremptoriamente que
os operários têm, no seu atual estado de espírito, ótimas e péssimas
tendências, que coexistem muitas vezes sem se chocar. É paradoxal, mas a
realidade é esta.
Se a Ação Católica chegar ao
operariado quanto antes - insistimos mais uma vez “quanto antes”, e não daqui a pouco ou muito tempo -, poderá
desenvolver nele a Fé e extinguir as plantas daninhas. Se ela tardar, a ação
comunista a precederá, extinguindo a Fé e desenvolvendo os maus germens. E a
Ação Católica terá o lugar tomado.
A nossa situação é esta: estamos aptos a ter um dos
operariados mais católicos ou mais bolchevistas do mundo, dependendo tudo de
quem tomar a dianteira, se os propagandistas de Deus e de sua Santa Igreja, se
os de Satanás e da III Internacional.
Perigo comunista imediato nas classes operárias,
não o vemos.
Mas, se os católicos brasileiros não souberem
trabalhar atualmente entre os operários, o Brasil terá o destino da Rússia e, o
que é pior, ele o merecerá.
* * *
Vamos, agora, aos otimistas.
A maior prova de que os otimistas estão profundamente
errados ou mentem com malícia verdadeiramente satânica, é que as greves começam
a estourar agora por toda a parte. Além da greve dos padeiros - dos quais
alguns timbram tolamente em se chamar “manipuladores de pão”, como se houvesse vergonha em ser
padeiro - houve outra na Fábrica Klabim, outra ainda
nas Fábricas Votorantim de Sorocaba, e mais
algumas certamente arrebentarão.
O que significam estas greves? Não é preciso ser
muito arguto para percebê-lo. De acordo com a tática comunista, os dirigentes
dos sindicatos operários - que são muito freqüentemente comunistas aí colocados
com a aquiescência, note-se bem, do Ministério do Trabalho - formulam
reivindicações justas e outras inexeqüíveis, e promovem a greve. Ou o patrão
cede e a indústria se anarquiza, ou o patrão não cede e o operário se irrita.
Em uma como em outra hipótese, fica o campo preparado para a propaganda
comunista.
Se bem que os chefes de sindicatos comunistas não
se atrevam a fazer propaganda comunista declarada, preparam a fogueira. E, no
dia do incêndio, já encontrarão material seco e apto a queimar depressa.
As greves denunciam a existência de uma trama
comunista. Esta trama não é tão poderosa que justifique o desânimo, nem tão
frágil que justifique a inércia. O que é preciso é desenvolver a ação católica
junto aos operários.
* * *
Não é sem certo constrangimento que fazemos estas
observações. Mostrar aos católicos que eles devem trabalhar entre os operários
para combater o comunismo é apenas argumentar com um lado da questão. Os
católicos não devem fazer ação católica só para combater o comunismo. O fim da
ação católica não é apenas o de destruir o mal, mas sobretudo o de fazer o bem.
Mas há hoje corações tão endurecidos que só à vista
de um perigo os abre, tornando-os generosos de seu tempo ou de seu dinheiro.
É este perigo que mostramos honesta e claramente,
sem exageros otimistas nem pessimistas.
No nosso próximo artigo trataremos de outro assunto: o perigo comunista entre
os militares.