Embora com desprazer, não podemos deixar de
insistir sobre algumas lições que os católicos devem ter retido da amaríssima
experiência de Outubro de 1934. Ficou provado pela experiência, com uma
exuberância que só os cegos e os preguiçosos não vêem, que uma legislação
católica, para não ser ineficiente ou até contraproducente, precisa ser
favorável à Igreja nas suas menores minúcias e nos seus mais leves detalhes. A
bem dizer, não seria necessária a experiência, para que os católicos se
inteirassem dessa verdade. Mesmo “a priori”, com um pouco de perspicácia, poderiam eles ter
percebido isto. O próprio autor dessas linhas esgotou seus esforços em
demonstrá-lo. Mas foi em vão.
Quem ler a lei aprovada a respeito dos efeitos
civis do casamento religioso não custará a se persuadir do que afirmamos. Os
maiores inconvenientes da lei não está nos seus pontos fundamentais, mas nas
penalidades estabelecidas para os que infringirem uma disposição meramente
burocrática e de segunda ordem, como seja a notificação do casamento efetuado
pelo Sacerdote às autoridades civis. É um detalhe. É até um detalhe mínimo. Mas
exatamente neste pequeno ponto de detalhe os adversários da Igreja arranjaram meios
de inutilizar toda a lei. A tal ponto é isto verdade que a lei existe há um ano
ou mais e não entrou em vigor, porque não houve, que saibamos, um único Prelado
brasileiro que julgasse oportuno servir-se dela em sua Diocese.
Contentar-se-ão os católicos com promessas vagas?
Isto posto, ficará patente aos olhos de nossos
leitores que a minguadíssima meia hora de ensino
religioso que existe em nossas escolas públicas é totalmente insuficiente. O
aluno recebe influências deletérias a todos os momentos, durante o dia inteiro.
No cinema, pelo rádio, pelos suplementos juvenis, pelos cartazes afixados nas
ruas, etc., etc., é uma verdadeira onda de corrupção que penetra na alma
infantil de um aluno de escola primária ou secundária. Qual o antídoto para
este formidável envenenamento? Os nossos legisladores acham que só uma exiguíssima meia hora de ensino religioso por semana basta.
Quem não percebe que isto é ridículo?
Na Constituinte de 1934, ficou assente, de forma
correta e satisfatória, que o ensino religioso seria facultativo e realizado
dentro do horário escolar sem ônus para os cofres públicos. Com isto, as linhas
mestras ficaram assentadas. E nem poderia a Constituição descer a detalhes mais
minuciosos, pois que seria injurídico incluir nela
detalhes próprios a um simples regulamento de Secretaria de Estado. Mas se as
linhas gerais estavam assentes, faltavam os detalhes. E, nesses detalhes, se
encaixaram as arapucas que inutilizaram ou ao menos prejudicaram seriamente a
conquista obtida na Constituinte.
* * *
Insistimos sobre este assunto, que já havíamos
abordado em parte nos editoriais anteriores, para chegar finalmente à conclusão
prática que anunciamos e preparamos a série de artigos que vimos escrevendo.
Se os católicos querem vencer em 1938, não devem
agir com a imprevidência de que foram vítimas em 1934. Por isto, não se devem
impressionar com as numerosas declarações com que os candidatos à sucessão
presidencial se afirmam espiritualistas, cristãos e até católicos.
De que valem afirmações
religiosas sem alcance prático?
Andam muito na moda tais declarações. Para os
ingênuos, elas são decisivas. Mas para quem conhece um pouco - um pouco que
seja - de nossa política, elas são de interesse muito diminuto. Em sã lógica,
se tomarmos os homens como eles deveriam ser, e não como são, seria suficiente
um ato de Fé claro e explícito, para nos contentar. Se alguém se declara
católico, é evidente que deve agir no Governo como um católico. E que,
portanto, deve fazer do pensamento católico o eixo de suas atividades de
estadista.
Mas a realidade é muito outra. A
palavra “católico” é insofismável. Mas... a política tem razões que a razão não
conhece. E não é por outra razão que a maior parte das leis desfavoráveis à
Igreja, no Brasil, foram propostas, defendidas, aprovadas e postas em prática
por gente que de católico, só tinha o rótulo... usado sem direito. Mas que, em
todo o caso, timbrava em usar o rótulo católico.
Se não basta que alguém se afirme católico, o que
dizer-se dos que se afirmam simplesmente cristãos? Cristão é qualquer
protestante, ou qualquer cismático. É certo que o único cristianismo autêntico
é o da Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana. Mas ninguém ignora que os
protestantes ou cismáticos também são cristãos. Quereria o Brasil um governante
que fosse simplesmente “cristão”, sem
ser “cristão católico”? Seria, nesse
caso, dirigido por um protestante, isto é por indivíduo que, armado com o livre
exame, poderia deduzir da Escritura as doutrinas mais funestas e perigosas que
o engenho humano possa arquitetar.
Não nos interessam, pois, as declarações que por aí
andam sobre as convicções religiosas dos diversos candidatos.
Longe de nós a idéia de pôr em dúvida a
honorabilidade dos candidatos à Presidência da República, nas suas afirmações
religiosas. Seja-nos, porém, lícito garantir a consciência católica do País
contra desvios de senso religioso, que nossa História registra até em alguns de
seus expoentes. É só o que queremos.
* * *
Algum leitor agastado perguntará, então, o que
queremos.
É muito simples.
Os candidatos à Presidência da República deveriam
responder a um questionário que lhes fosse dirigido por escrito - e que deveria
ser pessoalmente respondido por escrito - no qual figurariam, com todas as suas
minúcias, o projetos de lei que os católicos desejam ver aprovados e postos em
prática. Se o candidato se manifestasse favorável a esses projetos, na sua
íntegra - convém notar essa última particularidade - mereceria o voto dos católicos. Em caso
contrário, os católicos não deveriam dar-lhes seu apoio.
Se os católicos agirem assim, poderão estar certos
de que darão um voto conforme às exigências imperiosas e iniludíveis de sua
consciência religiosa. Caso procedam de modo diverso, porém, eles darão um
salto no escuro, muito parecido com um suicídio.
Diria alguém que o processo que indicamos constitui
uma imposição irritante dos eleitores católicos ao candidato por eles
preferido.
Responderemos no próximo artigo a essa objeção.