Legionário, N.º 255, 1º de agosto de 1937

Que candidatos podem os católicos apoiar?

Embora com desprazer, não podemos deixar de insistir sobre algumas lições que os católicos devem ter retido da amaríssima experiência de Outubro de 1934. Ficou provado pela experiência, com uma exuberância que só os cegos e os preguiçosos não vêem, que uma legislação católica, para não ser ineficiente ou até contraproducente, precisa ser favorável à Igreja nas suas menores minúcias e nos seus mais leves detalhes. A bem dizer, não seria necessária a experiência, para que os católicos se inteirassem dessa verdade. Mesmo “a priori”, com um pouco de perspicácia, poderiam eles ter percebido isto. O próprio autor dessas linhas esgotou seus esforços em demonstrá-lo. Mas foi em vão.

Quem ler a lei aprovada a respeito dos efeitos civis do casamento religioso não custará a se persuadir do que afirmamos. Os maiores inconvenientes da lei não está nos seus pontos fundamentais, mas nas penalidades estabelecidas para os que infringirem uma disposição meramente burocrática e de segunda ordem, como seja a notificação do casamento efetuado pelo Sacerdote às autoridades civis. É um detalhe. É até um detalhe mínimo. Mas exatamente neste pequeno ponto de detalhe os adversários da Igreja arranjaram meios de inutilizar toda a lei. A tal ponto é isto verdade que a lei existe há um ano ou mais e não entrou em vigor, porque não houve, que saibamos, um único Prelado brasileiro que julgasse oportuno servir-se dela em sua Diocese.

Com o ensino religioso, a coisa é a mesma. O ensino religioso, que os católicos devem desejar, não se deve limitar a dourar por fora, com uma vaga tintura de catecismo, os alunos das escolas públicas. O ensino religioso deve ser feito de tal maneira que proporcione às gerações que se sucedem nos bancos escolares, uma formação religiosa sólida e profunda. O ensino religioso existe para salvar almas. E, principalmente nos dias que correm, as almas não se salvam sem uma instrução religiosa muito e muito sólida. O ensino religioso só produzirá seus efeitos sendo sólido e indo ao fundo da mentalidade do aluno. Se isso não existir, será nulo, ou quase nulo.

 

Contentar-se-ão os católicos com promessas vagas?

 

Isto posto, ficará patente aos olhos de nossos leitores que a minguadíssima meia hora de ensino religioso que existe em nossas escolas públicas é totalmente insuficiente. O aluno recebe influências deletérias a todos os momentos, durante o dia inteiro. No cinema, pelo rádio, pelos suplementos juvenis, pelos cartazes afixados nas ruas, etc., etc., é uma verdadeira onda de corrupção que penetra na alma infantil de um aluno de escola primária ou secundária. Qual o antídoto para este formidável envenenamento? Os nossos legisladores acham que só uma exiguíssima meia hora de ensino religioso por semana basta. Quem não percebe que isto é ridículo?

Na Constituinte de 1934, ficou assente, de forma correta e satisfatória, que o ensino religioso seria facultativo e realizado dentro do horário escolar sem ônus para os cofres públicos. Com isto, as linhas mestras ficaram assentadas. E nem poderia a Constituição descer a detalhes mais minuciosos, pois que seria injurídico incluir nela detalhes próprios a um simples regulamento de Secretaria de Estado. Mas se as linhas gerais estavam assentes, faltavam os detalhes. E, nesses detalhes, se encaixaram as arapucas que inutilizaram ou ao menos prejudicaram seriamente a conquista obtida na Constituinte.

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Insistimos sobre este assunto, que já havíamos abordado em parte nos editoriais anteriores, para chegar finalmente à conclusão prática que anunciamos e preparamos a série de artigos que vimos escrevendo.

Se os católicos querem vencer em 1938, não devem agir com a imprevidência de que foram vítimas em 1934. Por isto, não se devem impressionar com as numerosas declarações com que os candidatos à sucessão presidencial se afirmam espiritualistas, cristãos e até católicos.

 

De que valem afirmações religiosas sem alcance prático?

 

Andam muito na moda tais declarações. Para os ingênuos, elas são decisivas. Mas para quem conhece um pouco - um pouco que seja - de nossa política, elas são de interesse muito diminuto. Em sã lógica, se tomarmos os homens como eles deveriam ser, e não como são, seria suficiente um ato de Fé claro e explícito, para nos contentar. Se alguém se declara católico, é evidente que deve agir no Governo como um católico. E que, portanto, deve fazer do pensamento católico o eixo de suas atividades de estadista.

Mas a realidade é muito outra. A palavra “católico” é insofismável. Mas... a política tem razões que a razão não conhece. E não é por outra razão que a maior parte das leis desfavoráveis à Igreja, no Brasil, foram propostas, defendidas, aprovadas e postas em prática por gente que de católico, só tinha o rótulo... usado sem direito. Mas que, em todo o caso, timbrava em usar o rótulo católico.

Se não basta que alguém se afirme católico, o que dizer-se dos que se afirmam simplesmente cristãos? Cristão é qualquer protestante, ou qualquer cismático. É certo que o único cristianismo autêntico é o da Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana. Mas ninguém ignora que os protestantes ou cismáticos também são cristãos. Quereria o Brasil um governante que fosse simplesmente “cristão”, sem ser “cristão católico”? Seria, nesse caso, dirigido por um protestante, isto é por indivíduo que, armado com o livre exame, poderia deduzir da Escritura as doutrinas mais funestas e perigosas que o engenho humano possa arquitetar.

Não nos interessam, pois, as declarações que por aí andam sobre as convicções religiosas dos diversos candidatos.

Longe de nós a idéia de pôr em dúvida a honorabilidade dos candidatos à Presidência da República, nas suas afirmações religiosas. Seja-nos, porém, lícito garantir a consciência católica do País contra desvios de senso religioso, que nossa História registra até em alguns de seus expoentes. É só o que queremos.

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Algum leitor agastado perguntará, então, o que queremos.

É muito simples.

Os candidatos à Presidência da República deveriam responder a um questionário que lhes fosse dirigido por escrito - e que deveria ser pessoalmente respondido por escrito - no qual figurariam, com todas as suas minúcias, o projetos de lei que os católicos desejam ver aprovados e postos em prática. Se o candidato se manifestasse favorável a esses projetos, na sua íntegra - convém notar essa última particularidade -  mereceria o voto dos católicos. Em caso contrário, os católicos não deveriam dar-lhes seu apoio.

Se os católicos agirem assim, poderão estar certos de que darão um voto conforme às exigências imperiosas e iniludíveis de sua consciência religiosa. Caso procedam de modo diverso, porém, eles darão um salto no escuro, muito parecido com um suicídio.

Diria alguém que o processo que indicamos constitui uma imposição irritante dos eleitores católicos ao candidato por eles preferido.

Responderemos no próximo artigo a essa objeção.