Um lacônico telegrama do “Estado de São Paulo”, na
última quinta feira, noticiava um fato que, à maioria dos leitores, deve ter
parecido absolutamente banal: a bênção das espadas dos novos guardas-marinha
pelo Cardeal Arcebispo do Rio de Janeiro, na Igreja da Candelária. Quando muito, um ou outro
leitor romântico se terá interessado pelo cunho medieval da cerimônia, que
lembram ligeiramente as tradições da cavalaria andante, a vigília de armas, o rito litúrgico em que os
cavalheiros eram incorporados à cavalaria da cristandade, etc. Mas, para quase
a totalidade dos leitores, o fato não teve a menor significação.
Entretanto, muito mais que simples reminiscência
convencional essa cerimônia deve ser, para os católicos, um ensinamento fecundo
em conclusões da maior atualidade.
Por que razão a Igreja
abençoa a espada dos militares que, recebendo as dragonas do oficialato, se incorporam à alta direção das forças armadas? Por que
timbra ela em dar às espadas, que são instrumentos de morte, uma bênção
que é o penhor da proteção do Deus vivo? Porque a Igreja não vê na espada dos
militares senão o baluarte da justiça. A espada do militar é, para a Igreja,
não o instrumento com que se mata em guerra de conquista, mas o meio de defesa
do direito lesado, da civilização agredida, da moral conspurcada. E se o
próprio Salvador não relutou em empunhar o açoite com que flagelou vigorosamente
os vendilhões do templo que conspurcavam os direitos de Deus, a Igreja não
poderia deixar de abençoar as espadas com que o Estado arma seus paladinos,
para a defesa dos direitos da Igreja, da Civilização e da Pátria.
Em outros termos, significa isto que a Igreja, a
despeito das entranhas maternais que A movem em relação a todos os seus filhos,
não reluta em abençoar a violência, desde que ela seja a santa violência da
ordem contra a desordem, do bem agredido contra o mal agressor, da vítima
prejudicada contra o causador do dano injusto.
É necessário, evidentemente, que a violência só
seja empregada quando todos os outros meios se esgotaram para restabelecer o
direito lesado. É necessário, além disto, que ela não exceda em virulência ao
limite do estritamente indispensável para a defesa da Justiça. Estas duas
ressalvas feitas, entretanto, o exercício da violência não constitui apenas um
direito, mas deve, às vezes, constituir um imperioso dever.
Realmente, quando a espada da Justiça se deixa
paralisar pela inércia, embora a civilização periclite, a Pátria corra risco e
os direitos da Igreja sejam calcados aos pés, ela colabora por omissão com o
mal contra o bem, com a anarquia contra a civilização, com o demônio contra
Deus. Deserta de seu dever sagrado. Perde o direito ao respeito que merecia. E
se transforma, de sublime instrumento de defesa, em inútil fonte de gastos
inúteis, ou odioso meio de opressões.
Toda essa dissertação doutrinária não foi feita sem
um objetivo prático. A Justiça e o Exército, que representam respectivamente o
braço e o escudo do Estado, tem, no momento que passa, uma grave
responsabilidade perante a Nação.
Como estão eles cumprindo o seu dever? E dentro de
que medida os católicos cooperam para lhes facilitar o cumprimento desse dever?
Porque esse dever é extremamente pesado e a nós nos compete facilitar tanto
quanto possível seu cumprimento.
O dever da Justiça, na situação que atravessamos, é
extremamente grave e delicado. De sua atitude em relação aos inculpados de
atentado contra o Estado em Novembro de 1935 resultará provavelmente o futuro
do Brasil nos próximos 10 ou 20 anos. Se esses inculpados sofrerem uma punição
vigorosa, a propaganda comunista sofrerá um grave embaraço. Mas se for demais
benigna a ação da Justiça, ela comprometerá os interesses fundamentais do
Brasil em benefício de uma meia dúzia de celerados que, movidos de ódio
satânico contra a Igreja e a Civilização, não recuaram em 1935 diante da
revolta e do assassinato, para conseguir a realização de seu programa
criminoso.
Ainda é cedo para que nos manifestemos sobre a ação
da Justiça. Algumas de suas sentenças ainda estão em grau de recurso.
Esperaremos que o assunto seja definitivamente liquidado, para dar, sobre ele,
nossa opinião aos leitores.
Entretanto, ninguém ignora que o dever da Justiça é
extremamente pesado de se cumprir. Ameaças de toda a ordem, pressões de todo o
gênero, hostilidades de todo o feitio assediam certamente nossos juizes, para
arrastá-los a uma conduta benigna para com os partidários do inimigo n.º 1 do
Brasil, que é o comunismo.
Enquanto isto se dá, o que fazem as correntes
interessadas no combate ao comunismo? Que “meetings” promovem para prestigiar a ação da Justiça?
Que abaixo-assinados enviam aos nossos magistrados, para lhes expressar os
verdadeiros sentimentos do povo brasileiro? Que manifestações de solidariedade
trazem os homens que, com grave risco, exercem a nobre tarefa de defender o
Brasil contra a Rússia (...)?
Ameaças, pressões e, mais do que isto, infiltrações
perigosas sofrem nossas classes armadas para arrastá-las na senda do comunismo.
Um pugilo de oficiais e de soldados heróis se apega,
entretanto, com pés e mãos - e o que mais é, com inteligência e o coração - ao
conceito católico da disciplina. Querem
que a disciplina reine em nossas Forças Armadas. Querem que elas sejam
mantenedoras da Ordem e da Constituição, e não fautores da desordem e de
aventurosas reformas políticas. Dos esforços desta gente heróica que, ao que
sabemos, não está organizada, mas que age como fermento nas guarnições do
sertão, como nas do litoral, nas do norte como nas do centro ou do sul, depende
em grande parte a resistência do Brasil contra o comunismo.
O que fazem os católicos para facilitar, auxiliar e
estimular essas resistências? O que fazem eles para evangelizar as classes
armadas? Os parlamentares com assento em nossas Casas legislativas o que fazem
no sentido de ser introduzida a assistência religiosa nas classes armadas, para
que o Capelão possa contrariar eficientemente a célula vermelha, e possa
conquistar para o Cristo, com a arma invencível da suavidade e do amor, os
próprios asseclas de Moscou?
O que fazem os católicos leigos, repetimos, o que
fazem eles enquanto os inimigos de Moscou procuram aproximar-se mais uma vez “da retranca da metralhadora” para
voltá-la contra o Brasil?